A força dos medicamentos no autosserviço

A liberdade na escolha do consumidor, aliada à economia que é capaz de gerar à saúde pública, faz a classe dos MIPs ganhar cada vez mais corpo no Brasil, com novas perspectivas de lançamentos

O mercado de medicamentos que não exige prescrição médica, conhecido no Brasil pela nomenclatura de Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs) ou Over the Counter (OTC) – em português, sobre o balcão – é um grande alvo de crescimento das farmacêuticas pelo País. E muito dos investimentos são reflexo da própria natureza da categoria, que tem se mostrado aliada ao consumidor – quando usada de forma responsável – e também da saúde pública.

“A utilização de MIPs é a primeira linha de defesa do consumidor na busca de uma saúde plena por meio do autocuidado responsável, que é um método conveniente para tratar problemas de saúde menores que causam desconforto na rotina cotidiana”, afirma o vice-presidente executivo da União Química, Luiz Violland.

O executivo lembra, ainda, que para o sistema de saúde, cada real dispendido com MIPs pela sociedade gera uma economia de R$ 7,00 para o governo, conforme o estudo Utilização de medicamentos isentos de prescrição e economia geradas para o sistema de saúde: uma revisão, de Antonio Cesar Rodrigues, realizado por solicitação da Associação Brasileira da Indústria de Medicamentos Isentos de Prescrição (Abimip), e publicado no Jornal Brasileiro de Economia da Saúde (JBES).

Diante da importância e fortalecimento dos MIPs no mercado – categoria que cresceu aproximadamente 55% em valor e 26,9% em volume nos últimos cinco anos, segundo dados da IQVIA –, a busca por se destacar no mercado tem sido cada vez maior entre as indústrias.

Evolução dos MIPs em valor

Evolução dos MIPs em volume

Representatividade dos MIPs no setor de medicamentos em valor

Representatividade dos MIPs no setor de medicamentos em volume

A Natulab, por exemplo, comercializou 70 milhões de unidades no ano passado. Esses produtos, que representam 95% do portfólio da companhia, registraram alta de 30% em 2018, com relação ao ano anterior, enquanto o mercado evoluiu 7% no mesmo período.

Desde março deste ano, a empresa é detentora dos direitos de comercialização da marca Floratil no Brasil. Com investimentos de R$ 30 milhões, a companhia espera que o regulador intestinal, que é líder de mercado, agregue em torno de 25% ao faturamento da empresa já em 2019.

“O desempenho da empresa em MIPs foi um dos fatores fundamentais para que, no período, a farmacêutica saltasse da 15ª para a 11ª posição no ranking do mercado farmacêutico total, aproximando-a da meta de estar entre as dez principais empresas do setor em 2020”, comenta a gerente de marketing Marcas da Natulab, Sylvia Granziera, destacando que entre os lançamentos programados pela empresa, há produtos nas categorias de analgésicos e antitérmicos, vitaminas, para desconforto abdominal, entre outros.

Já a unidade OTC da EMS pretende investir cerca de R$ 100 milhões até o fim de 2019, em ações de marketing para a promoção do portfólio da categoria, com foco em mídia televisiva, em canais de TV aberta, fechada e digital.

Hoje, a companhia detém marcas tradicionais, como Bálsamo Bengué, indicado para alívio de dores reumáticas; Lacday, indicado para auxiliar na digestão da lactose presente nos alimentos; e Energil C, para quadros de deficiência de vitamina C no organismo.

O fortalecimento desse mercado deve continuar nos próximos anos, segundo aponta a vice-presidente executiva da Abimip, Marli Sileci. “Consideramos que um fator significativo de evolução, para os próximos anos no Brasil, consiste na consolidação da lei do switch, com a respectiva ampliação do segmento de MIPs”, conta. O switch é o processo de reclassificação de um medicamento de venda sob prescrição em um MIP.

A nova lei do switch estabeleceu regras claras, alinhadas com as melhores práticas globais, que permitirão ampliar o acesso da população à obtenção de tratamento adequado com novos MIPs. “A lista de medicamentos hoje aptos para o switch possui cerca de 30 substâncias”, revela Marli.

Força segue no varejo farma

As farmácias e drogarias pelo País também investem para o fortalecimento dos MIPs no ponto de venda (PDV). Na rede Pague Menos, por exemplo, além de revitalização das unidades – algo que permitiu explorar melhor a categoria –, as lojas procuram se manter próximas do consumidor por meio do Aplicativo (app), com dicas de saúde e alertas de ofertas.

“Também investimos na informação com uma correta exposição dos produtos para que o consumidor identifique facilmente o que procura. Temos um departamento específico que cuida da gestão de categorias para analisar a procura por cada item e, por meio desse estudo, preparamos o planograma adequado. Isso facilita a navegação e escolha do consumidor”, conta a VP comercial da Pague Menos, Patriciana Rodrigues.

Aliás, as farmácias não estão sozinhas nesta empreitada. As fabricantes também têm buscado uma atuação mais próxima aos PDVs, ajudando tanto na disseminação de conhecimento quanto no gerenciamento da categoria.

“Contamos com uma equipe de consultores que vai até as farmácias/lojas para treinar os atendentes sobre os produtos da EMS, além de orientá-los sobre questões que podem melhorar a experiência do consumidor”, conta o diretor adjunto da Unidade OTC da EMS, Guilherme Souza.

Nos treinamentos da empresa, são abordados pontos como a exposição correta dos medicamentos; a lógica de posicionamento na gôndola, sempre respeitando a árvore de decisão do consumidor na escolha dos produtos; e a importância da precificação.

A Natulab também aposta no treinamento da equipe do varejo farma. A empresa investe no desenvolvimento e manutenção da Unilab – curso de extensão com foco em fitoterapia.

A União Química segue estratégia similar, de aproximação com o PDV. “Atuamos em todo Brasil, ministrando treinamentos e capacitação técnica junto aos principais clientes, que vão além de treinar sobre produto, mas, principalmente, trabalhar o atendimento ao consumidor dentro das lojas”, pontua Violland.

MIPs em outros mercados

Existem muitas diferenças entre o mercado brasileiro de MIPs quando comparado a outros mercados, como o norte-americano e europeu, principalmente por questões regulatórias.

“Nos Estados Unidos, o segmento é bem desenvolvido e mais maduro do que o nacional. Existe uma gama muito maior de produtos que não necessitam de prescrição médica disponíveis no autosserviço e diversas categorias tarjadas no Brasil são vendidas sem prescrição por lá”, comenta Souza.

Assim como acontece no Brasil, as projeções futuras de crescimento desse mercado são positivas no mercado internacional. “Segundo dados da IQVIA, a expectativa é de que o mercado global de MIPs cresça 4,2% até 2022, em decorrência das performances da Europa, do Oriente Médio e da África, Ásia-Pacífico e da América Latina. O aumento da consciência do autocuidado, mudanças nas regulações com vistas a facilitar o lançamento de novos produtos e esforços de marketing dos fabricantes são considerados como pontos potenciais para o estímulo do crescimento global da categoria”, projeta Sylvia.

Segundo a Abimip, nos Estados Unidos e em países europeus, o processo de switch, por exemplo, já é bem estabelecido e observou-se, nas últimas décadas, um aumento periódico das categorias terapêuticas disponíveis como isentas de prescrição.

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