Abertura de mercado

Com o fim da extensão artificial de patentes de medicamentos, o setor de genéricos passou para uma nova etapa desde a criação do programa, com a possibilidade da chegada de novas classes terapêuticas

Em maio de 2021, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5529, o Supremo Tribunal Federal (STF) tornou inconstitucional o parágrafo primeiro do artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial (LPI) que permitia a extensão artificial de patentes de medicamentos no País. A legislação brasileira garante até 20 anos de vigência de patentes, mas uma brecha na LPI permitia que o prazo fosse estendido por 10 anos, gerando incerteza jurídica, inflando preços e diminuindo a oferta de produtos no mercado.

O julgamento da ADI 5529 foi considerado um marco histórico e, com isso, o Brasil passou a estar em linha com o que se pratica no mundo. “Agora, as indústrias de genéricos e de biossimilares têm previsibilidade jurídica e sabem, exatamente, quando uma patente vencerá. A vigência de proteção é de 20 anos, após o primeiro depósito no Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI). A partir daí, genéricos e biossimilares podem ser ofertados ao mercado, beneficiando os consumidores”, conta a presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares (ProGenéricos), Telma Salles.

Segundo ela, tal decisão foi muito importante, porém a executiva alerta para o fato de que desenvolver um produto genérico ou um biossimilar não é simples. Exigem-se investimento e pesquisa e esses procedimentos podem levar dois ou três anos, dependendo da complexidade.

“A imprevisibilidade jurídica, que foi derrubada, inibia estes investimentos e retardava a chegada de genéricos e biossimilares ao mercado, prejudicando consumidores, governo (que é um grande comprador de medicamentos) e as indústrias, num ciclo perverso, que felizmente conseguimos superar”, analisa.

A decisão do STF teve impacto positivo no mercado, na opinião do presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina), Antonio Carlos Bezerra e da consultora da Abifina, Ana Cláudia Dias de Oliveira.

“A decisão abre o mercado para a concorrência e para a produção de medicamentos genéricos e similares, além de pôr um fim à prorrogação indevida de patentes. Essa decisão altera o tempo de proteção de diversos medicamentos que sofriam o chamado evergreening (diversos pedidos de patentes reivindicando proteção a um mesmo produto ou processo por meio de quadros reivindicatórios semelhantes ou mesmo complementares). A decisão traz, ainda, uma previsibilidade da expiração das patentes desses produtos, independentemente da demora do INPI no exame de pedidos de patentes, além de aumentar o acesso a medicamentos, especialmente aos que integram os programas de assistência farmacêutica do Sistema Único de Saúde (SUS)”, destacam.

Antes do julgamento, muitos genéricos já disponíveis no exterior há décadas eram impedidos de serem comercializados no Brasil pela existência de patentes que tinham o prazo de validade estendido com base no parágrafo único. “Portanto, o resultado da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5529, que considerou o parágrafo único inconstitucional, beneficiou as farmacêuticas nacionais, pois possibilitou uma maior previsibilidade na contagem do prazo de vigência das patentes o que representa, no fim, um ganho em termos de acesso aos medicamentos para toda a população”, comenta a diretora-executiva da Divisão de Consumer Health do Aché Laboratórios Farmacêuticos, Elizangela Kioko.

Novas classes terapêuticas

O ano de 2022 deve ser marcado pela chegada de novas classes terapêuticas ao mercado de genéricos. Segundo Telma, algumas moléculas como a rivaroxabana já foram anunciadas.

“As indústrias estão debruçadas sobre o pipeline das moléculas desbloqueadas com a decisão do STF e, em breve, deveremos ver alguns desses produtos chegarem ao mercado. Como cada indústria tem uma estratégia específica, nós, como entidade de classe, não sabemos quais produtos devem ser lançados ainda este ano”, diz.

A rivaroxabana é o quinto produto em faturamento em genéricos, segundo o diretor da Unidade de Negócios Genéricos da Eurofarma, Donino Scherer Neto.

“Outras importantes moléculas tiveram retroação de patentes, as principais nas classes de trombolíticos, oncológicos e diabetes. Em um curto espaço de tempo, teremos genéricos nessas classes. Esse movimento traz benefícios à sociedade, porque permite o lançamento de mais medicamentos por menor custo, já que, por lei, os genéricos são, no mínimo, 35% mais baratos que o produto referência (inovador)”, argumenta Neto.

Ele revela que a farmacêutica irá lançar, ao longo do ano, 18 novas moléculas divididas nas classes de anti-inflamatórios, antialérgicos, corticoides, dermatológicos, digestivos, antibióticos, antidepressivos, anticoncepcionais e anticonvulsivantes. “Em 2021, a Eurofarma lançou 16 novos produtos em 25 novas apresentações”, conta.

De acordo com as fontes das indústrias farmacêuticas, há também expectativa de que novas opções terapêuticas estejam disponíveis no mercado de genéricos brasileiro, como medicamentos para hipertensão, asma, HIV, tratamento de câncer, hepatites virais, disfunção erétil, obesidade, entre outros.

“Para o início de 2022, temos o lançamento da rivaroxabana, representando a entrada do Aché em um mercado que movimentou mais de 6 milhões de unidades e R$912 milhões em Parceria Público-Privada em 2021 (dados IQVIA – ano fechado 2021/Total Mercado Rivaroxabana Gx+Rx)”, revela Elizangela, destacando que, em 2021, o Aché apresentou sete lançamentos em mercados relevantes e com potencial de crescimento (levofloxacino, desonida, donepezila, aripiprazol, desogestrel+etnilestradiol, gestodeno+etnilestradiol).

A Cimed, por sua vez, lançou sete novas moléculas no portfólio de genéricos e iniciou 2022 com o lançamento de três apresentações da valsartana. “Nosso plano é de, até o fim do ano, trazer pelo menos mais 10 novas moléculas para o portfólio de genéricos”, revela a diretora de marketing da Cimed, Sílvia Genaro.

Fonte: Guia da Farmácia
Foto: Guia da Farmácia