Como nasce um MIP

Medicamentos surgem tarjados e podem se tornar isentos de prescrição após análise da autoridade sanitária

Todo medicamento inovador nasce com venda sob prescrição médica. Após cinco anos no mercado nacional, no momento da renovação de seu registro, o laboratório detentor do produto poderá solicitar a alteração para Medicamento Isento de Prescrição (MIP). O pedido passará por avaliação da área técnica da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que poderá ou não ser deferido. Segundo a Anvisa, o processo de troca de categoria de registro para MIP leva um ano para ser finalizado, podendo acontecer antes ou depois, dependendo do caso. 

No Brasil, não existe uma lista de MIPs, mas, sim, a lista de Grupos e Indicações Terapêuticas Especificadas (Gite), que determina quais categorias de fármacos podem ser isentas de prescrição. Todos os medicamentos cujos grupos e indicações terapêuticas não estejam descritos no Gite são de venda sob prescrição médica. A lista faz parte da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) 138, de 2003, da Anvisa, que determina as regras para que o medicamento se torne um MIP. Na resolução, estão previstas, também, que as associações medicamentosas ou duas ou mais apresentações em uma mesma embalagem para uso concomitante ou sequencial, cujo grupo terapêutico e indicação terapêutica de pelo menos um de seus princípios ativos não estejam especificados no Gite, são de venda sob prescrição médica.

Existe uma alternativa para o medicamento inovador ser registrado e comercializado no Brasil como MIP sem esperar o prazo de cinco anos de renovação do registro. Esse caso prevê que o produto já seja comercializado como MIP há mais de cinco anos nos Estados Unidos ou na Europa, com a respectiva aprovação das entidades reguladoras de medicamentos locais [Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, ou European Medicines Agency  (EMA) , na Europa]. Sendo assim, o laboratório solicitante deverá juntar ao processo de registro na Anvisa dados de farmacovigilância e comprovantes de enquadramento na categoria de venda sem prescrição médica no país onde o produto é comercializado. 

Processo Claro

Além desses procedimentos de registro, para que um medicamento seja aprovado pelas autoridades sanitárias como MIP, deve ter um alto perfil de eficácia e, principalmente, segurança, que envolve características, como baixo potencial de toxicidade e risco (mau uso/abuso/intoxicação), reações adversas com causalidades conhecidas e reversíveis após a sua suspensão, baixo potencial de interações (medicamentosa e alimentar). “Para que seu uso seja seguro e consciente, sempre que o consumidor optar por usar MIPs, deve seguir as orientações da bula e rotulagem e ter em mente que, se os sintomas persistirem, a suspensão do medicamento deve ser imediata e um médico deve ser procurado”, afirma a vice-presidente executiva da Associação Brasileira da Indústria de Medicamentos Isentos de Prescrição (Abimip), Marli Martins Sileci. 

Regras incertas

Apesar da existência de normas específicas para troca de categoria de medicamentos para MIPs, persistem algumas dúvidas sobre o processo, como assinala Marli. “Atualmente, no Brasil, não há diretrizes claras que norteiam a mudança de um medicamento tarjado para MIP. Quando a empresa farmacêutica tem uma substância apta para a reclassificação ou switch ela deve submeter individualmente o pedido à Anvisa, que analisa e dá seu parecer. Não existe ainda um procedimento-padrão”, afirma a vice-presidente da Abimip. Segundo a executiva, a Anvisa está finalizando as discussões sobre a nova resolução dos MIPs e do processo de switch e deverá publicá-la no primeiro semestre deste ano. “A nova norma, alinhada com o cenário mundial, apresentará um modelo de regulação mais funcional que permitirá à agência uma avaliação sobre os pedidos de switch a partir de critérios estabelecidos, baseados em uma documentação mais robusta no que se diz respeito ao perfil de segurança do uso do medicamento”, esclarece.

De acordo com a Anvisa, conta muito também para que o medicamento se enquadre na categoria de MIP seu histórico no País. No momento da renovação de registro e com o pedido para reenquadramento como MIP, são avaliadas as notificações médicas que o produto teve. Medicamento com notificações negativas, principalmente com efeitos adversos, dificilmente consegue a transferência. Efeitos adversos não previstos na bula pioram ainda mais a situação do produto. O Sistema Nacional de Notificações para a Vigilância Sanitária (Notivisa), da Anvisa, é o principal banco de dados utilizado para compilar esses casos. O sistema de informação é a ferramenta para a notificação e o monitoramento de eventos adversos relacionados ao uso de produtos sob vigilância sanitária. Nele, está o registro de problemas relacionados ao uso de medicamentos e produtos para a saúde, incidentes e eventos adversos, com o propósito de fortalecer a vigilância pós-uso das tecnologias em saúde. Profissionais de saúde e cidadãos podem relatar problemas diretamente no site do sistema. Segundo a Anvisa, há também uma rede de monitoramento em hospitais e centros médicos, que enviam à Agência possíveis efeitos adversos e outros problemas relacionados aos medicamentos, que são analisados pelos técnicos e são tomadas as providências necessárias. 

Obrigatoriedade da bula

Uma dúvida comum é se todos os MIPs precisam de bula. Segundo a Abimip, alguns dos MIPs são comercializados em cartelas, o que faz com que muitos consumidores achem que eles não possuem bulas, faltando, portanto, informar sobre finalidade, forma de administração, entre outras. “Mas o que muitos não sabem é que, para esses MIPs vendidos em cartelas, podem exigir a bula, que deverá estar disponível na farmácia, segundo as regras da Anvisa”, diz a Abimip. Se, mesmo assim, o consumidor tiver dúvidas quanto à finalidade e ao modo de utilização de um MIP, ele também pode pedir auxílio ao farmacêutico, sugere a Abimip.

Na avaliação dos especialistas, o uso consciente dos MIPs age sobre a qualidade de vida e o direito assegurado ao usuário de atuar sobre a própria saúde, mas eles precisam seguir preceitos básicos. “Um fator crucial é que os MIPs não podem apresentar possibilidade de dependência”, destaca o presidente do Conselho Regional de Farmácia do Estado do Rio de Janeiro (CRF-RJ), Marcus Athila. “Os MIPs são indicados para doenças ou sintomas de baixa gravidade e autolimitados e são considerados de elevada segurança de uso, eficácia comprovada cientificamente ou de uso tradicional reconhecido, de fácil utilização e baixo risco de abuso”, complementa o assessor da diretoria do Conselho Regional de Farmácia do Estado do Rio Grande do Sul (CRF-RS), Gabriel Freitas. Os critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS) são claros para o uso correto dos MIPs, lembra o presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini. “O uso responsável de MIPs consiste na prática dos indivíduos em tratar seus próprios sintomas e males menores com medicamentos aprovados e disponíveis sem a prescrição médica e que são seguros e efetivos quando usados segundo as instruções.” 

O que é o switch

O termo em inglês “switch” que significa “troca” é usado internacionalmente para os casos de alteração da classificação do enquadramento da categoria de venda do medicamento sob prescrição para isento dela. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Medicamentos Isentos de Prescrição (Abimip), segurança é a principal preocupação das autoridades sanitárias no momento de permitir ou não a reclassificação do enquadramento da categoria de venda sob prescrição para a categoria de venda isenta de prescrição médica. Quando um medicamento novo é lançado, inicialmente, ele é enquadrado pela autoridade sanitária como medicamento de venda sob prescrição médica. Com o passar dos anos, após o medicamento ser utilizado em larga escala por um grande número de pacientes e de terem sido levantadas informações suficientes acerca da segurança de seu uso e de que possui características intrínsecas de um Medicamento Isento de Prescrição (MIP) [no caso brasileiro, deve constar em uma lista específica, Grupos e Indicações Terapêuticas Especificadas (Gite)], a empresa poderá submeter à autoridade sanitária um pedido de reclassificação do enquadramento da categoria de venda do produto. Também um medicamento novo pode ser registrado como isento de prescrição no Brasil se for comercializado como MIP por mais de cinco anos nos Estados Unidos ou na Europa e se apresentar grupo terapêutico e indicação descritos no Gite e em dados de farmacovigilância.


Lista de Grupos e Indicações Terapêuticas Especificadas (Gite)

Grupos Terapêuticos

Indicações Terapêuticas

Observações

Antiacneicos tópicos e adstringentes

 Acne, acne vulgar, rosácea, espinhas

Restrição: retinoides

Antiácidos, antieméticos, eupépticos, enzimas digestivas

Acidez estomacal, azia, desconforto estomacal, dor de estômago, dispepsia, enjoo, náusea, vômito, epigastralgia, má digestão, queimação, pirose, esofagite péptica, distensão abdominal, cinetose, hérnia de hiato

Restrições: metoclopramida, bromoprida, mebeverina inibidor da bomba de próton

Antibacterianos tópicos

Infecções bacterianas da pele

Permitidos: bacitracina e neomicina

Antidiarreicos

Diarreia, disenteria

Restrições: loperamida infantil, opiáceos

Antiespasmódicos

Cólica, cólica menstrual, dismenorreia, desconforto pré-menstrual, cólica biliar/renal/intestinal

Restrição: mebeverina

Anti-histamínicos

Alergia, coceira, prurido, coriza, rinite alérgica, urticária, picada de inseto, ardência, ardor, conjuntivite alérgica, prurido senil, prurido nasal, prurido ocular alérgico, febre do feno, dermatite atópica, eczemas

Restrições: adrenérgicos, corticoides (exceto hidrocortisona de uso tópico

Antisseborreicos Caspa, dermatite seborreica, seborreia, oleosidade  
Antissépticos orais, antissépticos bucofaríngeos Aftas, dor de garganta, profilaxia das cáries  
Antissépticos nasais, fluidificantes nasais, umectantes nasais Antissépticos nasais, fluidificantes nasais, umectantes nasais  
Antissépticos oculares Antissépticos oculares  Restrições: adrenérgicos (exceto nafazolina com concentração< 0,1%), corticoides

Antissépticos da pele e mucosas

Assaduras, dermatite de fraldas, dermatite de contato, dermatite amoniacal, intertrigo mamário/perianal/interdigital/axilar, odores dos pés e axilas  
Antissépticos urinários Disúria, dor/ardor/desconforto para urinar  
Antissépticos vaginais tópicos Higiene íntima, desodorizante  
Aminoácidos, vitaminas, minerais Suplemento vitamínico e/ou mineral pós-cirúrgico/cicatrizante, suplemento vitamínico e/ou mineral como auxiliar nas anemias carenciais, suplemento vitamínico e/ou mineral em dietas restritivas e inadequadas, suplemento vitamínico e/ou mineral em doenças crônicas/convalescença, suplemento vitamínico e/ou mineral em idosos, suplemento vitamínico e/ou mineral em períodos de crescimento acelerado, suplemento vitamínico e/ou mineral na gestação e aleitamento, suplemento vitamínico e/ou mineral para recém-nascidos, lactentes e crianças em fase de crescimento, suplemento vitamínico e/ou mineral para prevenção do raquitismo, suplemento vitamínico e/ou mineral para a prevenção/tratamento auxiliar na desmineralização óssea pré e pós-menopausal, suplemento vitamínico e minerais antioxidantes, suplemento vitamínico e/ou mineral para prevenção de cegueira noturna/xeroftalmia, suplemento vitamínico como auxiliar do sistema imunológico  

Fonte: Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)

Anti-inflamatórios

Lombalgia, mialgia, torcicolo, dor articular, artralgia, inflamação da garganta, dor muscular, dor na perna, dor varicosa, contusão, hematomas, entorses, tendinites, cotovelo de tenista, lumbago, dor pós-traumática, dor ciática, bursite, distensões, flebites superficiais, inflamações varicosas, quadros dolorosos da coluna vertebral, lesões leves oriundas da prática esportiva

Permitidos: naproxeno, ibuprofeno, cetoprofeno. Tópicos não esteroidais

Antiflebites

Dor nas pernas, dor varicosa, sintomas de varizes, dores das pernas relacionadas a varizes, dores após escleroterapia venosa

 

Antifiséticos, antiflatulentos, carminativos

Eructação, flatulência, empachamento, estufamento, aerofagia pós-operatória, gases, meteorismo

 

Antifúngicos, antimicóticos

Micoses de pele, frieira, micoses de unha, pano branco, infecções fúngicas das unhas, onicomicoses, dermatomicoses, pitiríase versicolor, tínea das mãos, tínea dos pés, pé de atleta, tínea do corpo, micose de praia, tínea da virilha, candidíase cutânea, monilíase cutânea, dermatite seborreica, dermatomicoses superficiais, vulvovaginites, dermatite perianal, balanopostite, candidíase vaginal, candidíase oral

Permitidos: tópicos

Anti-hemorroidários

Sintomas de hemorroidas

Permitidos: tópicos

Antiparasitários orais, Antihelmínticos

Verminoses

ermitidos: mebendazol, levamizol

Antiparasitários tópicos, escabicidas, ectoparasiticidas

Piolhos, sarna, escabiose, carrapatos, pediculose, lêndea

 

Antitabágicos

Alívio dos sintomas decorrentes do abandono do hábito de fumar, alívio dos sintomas da síndrome de abstinência

Restrição: bupropiona

Analgésicos, antitérmicos, antipiréticos

Dor, dor de dente, dor de cabeça, dor abdominal e pélvica, enxaqueca, sintomas da gripe, sintomas de resfriados, febre, cefaleia, dores reumáticas, nevralgias, lombalgia, mialgia, torcicolo, dor articular, artralgia, inflamação da garganta, dor muscular, contusão, hematomas, entorses, tendinites, cotovelo de tenista, lumbago, dor pós-traumática, dor ciática, bursite, distensões

Permitidos: analgésicos (exceto narcóticos

Ceratolíticos

Descamação, esfoliação da pele, calos, verrugas, verruga plantar, verruga vulgar

 

Cicatrizantes

Feridas, escaras, fissuras de pele e mucosas, rachaduras

 

Colagogos, coleréticos

Distúrbios digestivos, distúrbios hepáticos

 

Descongestionantes nasais tópicos

Congestão nasal, obstrução nasal, nariz entupido

Restrições: vasoconstritores

Descongestionantes nasais sistêmicos

Congestão nasal, obstrução nasal, nariz entupido

Permitido: fenilefrin

Emolientes e lubrificantes cutâneos e de mucosas

Hidratante, dermatoses hiperqueratóticas, dermatoses secas, pele seca e áspera, ictiose vulgar, hiperqueratose palmar e plantar, ressecamento da pele, substituto artificial da saliva, saliva artificial para tratamento da xerostomia

 

Emolientes, lubrificantes e adstringentes oculares

Secura nos olhos, falta de lacrimejamento, irritação ocular

 

Expectorantes, balsâmicos, mucolíticos, sedativos da tosse

Tosse, tosse seca, tosse produtiva, tosse irritativa, tosse com catarro, mucofluidificante

 

Laxantes, catárticos

Prisão de ventre, obstipação intestinal, constipação intestinal, intestino preso

 

Reidratante oral

Hidratação oral, reidratação oral

 

Relaxantes musculares

Torcicolo, contratura muscular, dor muscular, lumbago, entorses

 

Rubefacientes

Vermelhidão, rubor

 

Tônicos orais

Estimulante do apetite, astenia

 

MIPs 2016

Especial MIPs 2016

Essa matéria faz parte do Especial MIPs 2016.

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