Expectativas e projeções

Laboratórios fabricantes de genéricos estão com a margem cada vez mais enxuta, em virtude da alta do dólar e disparada do preço da energia elétrica. Ao mesmo tempo, esperam turbinar as vendas diante da crise que vem apertando o orçamento do consumidor

O momento vivido atualmente pelo mercado brasileiro de genéricos pode ser considerado contraditório. Ao mesmo tempo que a Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos (PróGenéricos) anunciou que a categoria teve um desempenho acima da média do mercado farmacêutico, os números apontam o pior índice de crescimento nos últimos três anos. 

Em 2015, as vendas de genéricos somaram R$ 5,9 bilhões – alta de 11,75% frente a 2014. Embora se trate de um montante expressivo, entre 2013 e 2014 o crescimento foi maior – 14,88%. Em unidades, o desempenho dos genéricos melhorou em 12,19% entre 2015 e 2014. Foram comercializadas 978.333 milhões de unidades contra 872.044 milhões no mesmo período. Em volume, as vendas do ano de 2015 superaram os resultados alcançados entre 2014 em relação a 2013, porém ficaram menores do que a expansão registrada em 2013 em relação a 2012, que foi de 15,71%.

Para a presidente executiva da PróGenéricos, Telma Salles, o baixo desempenho da economia brasileira no ano passado foi determinante para um crescimento menor do que o esperado. “Entre os principais fatores que contribuíram para que esse resultado não fosse digno de se comemorar, estão os aumentos dos custos de produção, penalizados, sobretudo, com a alta do dólar e o aumento no custo da energia. Nesse contexto, podemos concluir que as margens das indústrias ficaram muito reduzidas, o que a médio e longo prazo pode produzir consequências nefastas ao setor, como redução de investimentos, por exemplo”. 

Oportunidade na crise 

Um desafio no caminho dos produtores de genéricos é aumentar o market share da categoria, que atingiu a fatia de 28,88% em unidades ao final de 2015. O percentual indica um avanço de menos de 2% na participação de mercado em volume. Para Telma, os números são preocupantes. Significa que menos pessoas têm conseguido comprar medicamentos no Brasil. “Quando a população não consegue se tratar adequadamente, o custo social aumenta. Doentes crônicos que não fazem uso correto do medicamento tendem a apresentar o quadro agravado e desenvolvem outras patologias. Essas pessoas vão recorrer a postos de saúde, ao Sistema Único de Saúde (SUS), e buscarão internações, aumentando o custo social”, afirma.

A princípio, parece um cenário assustador. “Em momento de crise, todo mundo é prejudicado, porque as pessoas passam a consumir menos. Não só a questão de preço, mas o ambiente em geral regula o comportamento do consumidor”, alerta o presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini. 

“Nós vamos enfrentar uma fase difícil. Todo crescimento que a indústria farmacêutica experimentou nos últimos anos foi calcado na ampliação da classe média e no nível de emprego. Isso vem caindo de forma assustadora. Hoje já há uma redução dos participantes da classe média, que é a faixa da população que consome mais. Então, vamos observar todas as categorias sofrendo queda no faturamento”, continua Mussolini, fazendo uma importante ressalva: “É óbvio que medicamentos que têm mais concorrência, como os genéricos, são os últimos a sentir o impacto”. 

Opção econômica

A crise pode não ser de todo o mal para o setor de genéricos.  Em função do cenário econômico pouco favorável, com aumento das taxas de desemprego e inflação de dois dígitos, os genéricos tornam-se a alternativa mais viável para o bolso enxuto dos consumidores por conta do preço mais acessível. 

“Em tempos de instabilidade, os genéricos tendem a crescer acima do mercado farmacêutico total, em razão, principalmente, da migração de demanda dos medicamentos de referência para os medicamentos genéricos pelo mercado consumidor, que busca economizar. Como medicamento é um item que o consumidor não pode ficar sem consumir, ele opta por uma alternativa mais econômica, no caso os medicamentos genéricos”, aposta o farmacêutico do setor de lançamentos do Laboratório Teuto, Thiago Lobo Matos.  

Apesar de o Brasil estar muito distante de mercados como o dos Estados Unidos, por exemplo, onde o setor representa cerca de 80% do volume comercializado, alguns sinais demonstram que a categoria está no caminho certo em busca do aumento na participação de mercado. Segundo pesquisa do Datafolha, em 2012, o índice de confiança era de 70% e, em 2014, já havia passado para 73% – o que mostra um crescente ganho de credibilidade para os brasileiros.

Para Telma, o receio quanto à eficiência e qualidade dos genéricos é um obstáculo superado. “A desconfiança ocorreu em um primeiro momento, hoje, os consumidores entenderam que são produtos exatamente iguais; também passaram a reconhecer as empresas fabricantes, sabem que são sérias e renomadas. Se não houve um avanço em participação de mercado como gostaríamos, foi por conta de fatores econômicos”, ressalta.

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Esforços necessários

Para atingir metas previamente estabelecidas, apesar das adversidades econômicas, as indústrias farmacêuticas têm buscado garantir a eficiência operacional em toda a cadeia. No entanto, para o diretor de negócios da Medley, Carlos Aguiar, os percentuais de crescimento dos genéricos não irão melhorar apenas com um esforço isolado dos fabricantes. “Cabe ressaltar a necessidade de esforço conjugado da indústria, governo e varejo, a fim de preservar as condições necessárias que garantam competitividade, qualidade e sustentabilidade desse segmento”, pontua Aguiar. 

De acordo com o diretor-geral da Sandoz Brasil, André Brázay, trabalhar bem as questões regulatórias também é um passo importante para aumentar a participação de genéricos no mercado. “É preciso continuar trabalhando em melhorias para agilizar os trâmites de registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e fortalecer os controles e a supervisão da comercialização de produtos farmacêuticos, sempre visando à garantia da qualidade do medicamento oferecido ao paciente”.

A demanda por prazos de registro mais enxutos é antiga e já chegou até o Senado, com uma audiência pública para debater o Projeto de Lei do Senado (PLS) 727/2015, de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), que altera os prazos de concessão de registro de medicamentos Anvisa e torna mais transparente a tramitação dos processos.

Atualmente, a regra em vigor, baseada na Lei 6.360/1976, concede o tempo máximo de 90 dias para a conclusão dos registros, mas, na prática, o prazo é desrespeitado com frequência. No entanto, a realidade cumprida pela Agência é bem diferente. Em média, são necessários 1062 dias para a aprovação de registro de um medicamento genérico. 

Acompanhando de perto o trabalho da Anvisa, o presidente executivo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Antônio Brito, garante que a entidade tem feito um grande esforço nos últimos dois anos para revisar os processos, reforçar a equipe e, com isso, reduzir os prazos para registro de produtos. “As estatísticas mostram que essa redução já começou a ocorrer. No entanto, o passivo era – e ainda é – tão grande que os prazos continuam sendo absolutamente insuportáveis.” 

Boas perspectivas 

Apesar de ainda enfrentar entraves no momento do registro de medicamentos, o ano promete ser abundante em lançamentos de genéricos. Um levantamento realizado pela PróGenéricos mostra que, em 2015, a Anvisa autorizou a cópia de 35 medicamentos de referência. “Claro que há muito a ser aprimorado, mas nos últimos dois anos, a Anvisa vem se mostrando bem competente no enfrentamento dos problemas. E a priorização foi para os genéricos inéditos. Tem sido feito um trabalho muito bom. Percebemos o esforço e a resposta tem sido satisfatória”, elogia Telma.

A expectativa é que as novas moléculas gerem um ganho de R$ 615 milhões por ano. E não deve parar por aí: estima-se que a lista de medicamentos inovadores que poderão ganhar cópias só tende a crescer. Até 2025, as novidades que irão surgir no mercado deverão ser capazes de gerar um faturamento extra de R$ 1,7 bilhão. 

Genéricos altamente rentáveis já começaram a surgir nas prateleiras. A Neo Química, divisão de genéricos da Hypermarcas, prepara ainda para este ano o lançamento de genéricos de três dos 35 medicamentos que perderam a patente recentemente: tadalafila, celecoxibe e cliridato de olopatadina. 

A EMS, que lidera o mercado de genéricos há três anos, também prepara lançamentos importantes para 2016, com aproximadamente dez moléculas já aprovadas pela Anvisa, sendo que, destas, sete são inéditas, ou seja, representam a primeira versão genérica do medicamento após a expiração da patente.

“Juntos, apenas esses lançamentos de novos genéricos, previstos para chegarem às farmácias nos próximos três meses, representam um mercado de no mínimo R$ 500 milhões em faturamento”, destaca o diretor comercial da unidade de Genéricos da EMS, Aramis Domont.

Reforçando o cenário de contradição, a Sandoz, divisão de genéricos da Novartis, sofreu as consequências do mau momento vivido pela economia brasileira, mas, ainda assim, a fábrica instalada em Cambé (PR) registrou recorde de produção, com 1,6 bilhão de comprimidos produzidos – aumento de 23% em relação ao ano anterior. “Foi maior que a projeção, alavancada por alguns lançamentos bem-sucedidos, recuperação de portfólio, mas, principalmente, por um cuidadoso e consistente trabalho de nossa equipe para entender e atender cada vez melhor as necessidades de nossos clientes e pacientes”, acredita Brázay, da Sandoz Brasil. 

Evolução no lançamento de Genéricos Inéditos

Ano

2010

2011

2012

2013

2014

2015

Número de 

genéricos inéditos 

33

21

28

25

23

35

Fonte: Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)

Autor:Flávia Corbó

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