Pesquisas revelam o grau de confiabilidade dos fármacos no País

Discernimento dos brasileiros em relação aos medicamentos de referência, genéricos e similares foi estudado

A percepção da população quanto à efetividade dos genéricos é avaliada em estudo conduzido pelo Grupo Interdepartamental de Economia da Saúde (Grides) da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em parceria com a empresa Foco Opinião. De acordo com essa pesquisa, 58,8% dos entrevistados consideraram os medicamentos genéricos tão efetivos quanto os de referência. Apesar da percepção positiva encontrada pelo Grides, quase um terço da população (30,4%) ainda disse acreditar que os genéricos são medicamentos menos efetivos. Mesmo com a apuração das informações, não é possível apontar os motivos que levaram a tal percepção. “Pelos dados levantados, não é possível entender o motivo pelo qual uma parte da população reluta em aceitar os genéricos”, salienta a farmacêutica e pesquisadora da Unifesp, Elene Paltrinieri Nardi, uma das autoras do estudo. “Para isso, seria necessário aprofundar as questões levantadas com outros estudos que investigassem, por exemplo, se a percepção negativa é causada por falta de conhecimento da população em relação aos diferentes tipos de medicamentos ou se a regulação e a vigilância que envolvem esses fármacos são suficientes para garantir produtos realmente efetivos e seguros”, pondera.

A presidente do Instituto de Estudos em Varejo (IEV), Regina Blessa, destaca que quem não adquire genéricos os desconhece e acaba pensando que esses medicamentos são mais fracos que os produtos de referência. “Quem usa sabe que alguns funcionam e outros não, por isso acabam preferindo marcas confiáveis. O fato é que quem tem dinheiro e tem um problema grave de saúde não arrisca, a não ser que já tenha usado e aprovado. É uma questão de experiência particular”, avalia.

Diferencial: Sexo e faixa etária

Foi observado também na pesquisa da Unifesp que a maior utilização de genéricos ocorre no público feminino (49,2%) e nas pessoas acima de 65 anos de idade (61,1%). O curioso é que, apesar de consumirem mais genéricos, os idosos têm maior percepção negativa sobre esses medicamentos do que os mais jovens. Além disso, 59,2% disseram que prefeririam tomar o medicamento de referência em um cenário em que os preços fossem parecidos e 41% relataram que os genéricos são mais apropriados para doenças menos graves. “Esses resultados sugerem uma subutilização ou um aumento da desconfiança no uso desses medicamentos no caso de uma doença mais grave”, explica Elene. “A visão negativa observada na população mais idosa levanta preocupações que envolvem barreiras na utilização dos genéricos e na potencial redução da aderência à terapia medicamentosa por esse grupo”, reitera Elene. Para a consultora especializada em varejo farmacêutico, Silvia Osso, dois motivos podem explicar esse tipo de percepção dos genéricos. Grande parte dos idosos foca a economia na hora da compra do fármaco, considerando ser o genérico, no mínimo, 35% mais barato que o de referência. Outro motivo está ligado ao aumento da adesão ao Programa Farmácia Popular, cujo número maior de usuários é composta de idosos e, na dispensação, o programa foca o genérico. “Podemos atribuir também aos mitos populares que existem sobre essa categoria de medicamentos e que, se forem levados como verdade pelos idosos, o índice de reversão do conceito é muito baixo”, explica Silvia.

Quesito renda

Ao contrário do esperado, a população de menor poder aquisitivo expressou na pesquisa maior desconfiança em relação aos genéricos. O percentual de 32,4% dos que recebiam até dois salários mínimos mensais creem que os genéricos são medicamentos menos efetivos. Já os 24,3% da população que recebia mais de dez salários mínimos concordam com a mesma afirmação. Para Silvia Osso, alguns fatores devem ser considerados para explicar a forma de pensar dessa faixa da população: o mínimo acesso à informação, a crença popular de que o genérico não faz efeito e o pouco tempo que esse tipo de medicamento existe no Brasil. “Se formos comparar com os Estados Unidos, o genérico representa 60% do mercado farmacêutico em unidades e, no Brasil, gira em torno de 25%. A diferença é que o genérico está presente nos EUA desde 1960, mas, no Brasil, teve seu início em 1999. Certamente, com o passar dos anos e com a continuidade da comprovação da qualidade e eficiência do genérico, atingiremos no País o mesmo patamar do mercado americano”, observa Silvia.

Regina Blessa pensa um pouco diferente. “Quem está acostumado a não gastar com produtos de alto padrão não tem a percepção de comprar um produto de segunda linha. Para as classes C e D, o importante é poder comprar. Em razão do baixo índice de informação, eles são facilmente clientes da “empurroterapia” de farmácias populares e só se preocuparão com essa questão se o medicamento adquirido não funcionar.”

Elene Paltrinieri Nardi vê com apreensão o desconhecimento dos genéricos. “As visões mais negativas em relação aos genéricos, observadas em pessoas de menor renda e nas mais idosas, levantam preocupações, uma vez que esses grupos precisam adquirir medicamentos com custos reduzidos, seja pela restrição orçamentária seja pela concomitância de doenças crônicas levando, consequentemente, à utilização de um número expressivo de medicamentos”, conclui a pesquisadora.

Outro estudo, realizado em setembro de 2014 pelo Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ), e pelo Datafolha, revela que a maior parte dos brasileiros confia nos genéricos. Na enquete, 73% das pessoas disseram isso contra 70% dos que responderam pesquisa semelhante em 2012. No estudo, os mais confiantes nesse tipo de fármaco são os idosos, a partir dos 60 anos. Entre eles, a taxa de confiança atinge 78%. “A população brasileira com idade a partir dos 60 anos acredita e confia mais nos medicamentos genéricos do que a população mais jovem. No entanto, vale salientar que a diferença no grau de confiança entre os jovens e os brasileiros da terceira idade é mínima – fica em, no máximo, quatro pontos percentuais”, afirma o diretor de pesquisa do ICTQ, Marcus Vinicius de Andrade. As pessoas que mais confiam nos genéricos estão principalmente nas classes A e B e são do gênero masculino, adiciona Andrade. Em termos regionais, a população do Sudeste ostenta o maior índice de confiança: 76%. No Centro-Oeste, região que sedia um dos maiores polos de fabricação de genéricos do País (Anápolis-GO), apresentou o menor índice: 67%.

Andrade faz outra ponderação. “O grau de confiança nos genéricos, de modo geral, estagnou nos últimos dois anos. A variação em termos percentuais está dentro de uma margem de erro que não representa mudança significativa na pesquisa. O que nos chamou a atenção é que a diferença no grau de confiança entre as diversas faixas etárias se inverteram – mesmo com poucos pontos percentuais de diferença. Há dois anos, os jovens com idades entre 26 e 40 anos, em termos percentuais, eram os que mais acreditavam nesse tipo de medicamento. Atualmente, são os idosos com idade a partir dos 60 anos.” A confiança entre os brasileiros da terceira idade nos medicamentos genéricos cresceu de 65%, em 2012, para 78% em 2014. Outro ponto de destaque na pesquisa, na visão do diretor do ICTQ, revela que, nos últimos dois anos, também houve estagnação no grau de confiança dos medicamentos de referência na faixa próxima de 80% – em 2012, o índice era de 79%. Em 2014, ficou em 78%. “No entanto, houve um crescimento muito relevante da confiança nos medicamentos similares. Em 2012, esse índice era de 35%; em 2014, o grau de confiança saltou para 54%”, salienta Andrade. Isso pode ser reflexo de mudanças determinadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), nas quais os testes de bioequivalência dos similares são os mesmos dos genéricos, comprovando a qualidade e a equivalência terapêutica em relação ao medicamento de marca.

Confiança nos medicamentos de marca e similares

•    Em 2014, segundo pesquisa do Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ)/Dataflolha, 78% das pessoas acreditavam plenamente nos medicamentos de referência. São, principalmente, os brasileiros das regiões Norte e Centro-Oeste, do gênero masculino, com nível superior, e as classes socioeconômicas A e B.
•    Na pesquisa do ano passado, 54% dos brasileiros residentes nas regiões metropolitanas no Sudeste do País, do gênero masculino e com idade a partir dos 60 anos mostravam confiar plenamente nos similares.

Fonte: Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ)/Datafolha

 

Objetivo principal

Os genéricos foram estabelecidos no Brasil pela Lei nº 9.787, de fevereiro de 1999, como uma forma de fortalecer o acesso da população aos medicamentos com melhor qualidade, mais segurança e mais econômicos. Eles apresentam o mesmo princípio ativo, concentração, forma farmacêutica, via de administração e indicação terapêutica que o seu respectivo medicamento de referência. Apesar disso, em quase 16 anos, sua aceitação e substituição ainda geram dúvidas na população. “A pesquisa da Unifesp pode contribuir para promover políticas públicas de saúde que incrementem o acesso da população a medicamentos seguros e com qualidade e, também, para auxiliar as estratégias que visem à otimização dos gastos em saúde com medicamentos”, observa o diretor do Grides, Marcos Bosi Ferraz.

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