Uso correto dos fitoterápicos

Consumidor precisa ser bem informado. Mesmo tendo base natural, classe medicamentosa não é isenta de interações ou efeitos adversos

Com o avanço da pesquisa e desenvolvimento voltados aos fitoterápicos, surgiram, nos últimos anos, produtos eficazes e seguros, possibilitando aos médicos e usuários a opção terapêutica de tratar e prevenir várias doenças com menos agravos à saúde que medicamentos sintéticos similares.

“Os medicamentos fitoterápicos evoluíram muito em qualidade”, afirma a professora de Farmacognosia da Faculdade Oswaldo Cruz, Nilsa Sumie Yamashita Wadt. “O problema da sua prescrição é que muitos médicos não acreditam ou não sabem bem sobre os fitoterápicos, visto que eles não têm fitoterapia na graduação. Daí a importância da inclusão desses medicamentos na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) [lista do Sistema Único de Saúde (SUS) em que constam medicamentos que devem atender às necessidades de saúde prioritárias da população brasileira]. Mesmo que sejam poucos itens disponíveis, já é um avanço”, acredita.

Um exemplo é a espinheira santa, utilizada no tratamento de gastrites, revela a professora, lembrando que a vantagem dos medicamentos fitoterápicos é sua menor toxicidade em relação aos sintéticos. “Fitoterápicos disponíveis hoje podem ser utilizados em substituição aos alopáticos sem diminuição da eficácia medicamentosa, pois são padronizados e seguem parâmetros de qualidade iguais àqueles”, explica Nilsa.

“Além disso, a escassa divulgação de pesquisa na área nos últimos 30 anos e alguns falsos paradigmas criados por pessoas desorientadas ou com interesses em prejudicar o setor, afastaram de forma significativa o interesse de boa parte da classe médica dessa categoria. Ensinamentos sobre a prática da fitoterapia há tempos já não são mais incluídos nas faculdades de Medicina, podendo ser alcançados apenas em cursos de especialização”, esclarece o professor de pós-graduação nas áreas de Fitoterapia e Farmacoterapia do Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico (ICTQ), Lincoln Marcelo Lourenço Cardoso. “Um dos grandes desafios do setor para a expansão do mercado é a aproximação dos profissionais prescritores da informação técnica e da evidenciação científica que justifique a utilização desses produtos por meio da demonstração de segurança e eficácia terapêutica.”

Atuação medicinal

Os fitoterápicos podem agir como profiláticos ou curativos em diversas doenças. Por ser produzidos exclusivamente com matéria-prima ativa vegetal, agem no organismo como alopáticos, sendo que todas as substâncias presentes na planta medicinal utilizada na sua preparação atuam em conjunto em um órgão ou sistema do organismo.

Papel das farmácias na dispensação de fitos

Farmácias e drogarias têm a missão de investir em ações de conscientização sobre o uso correto de medicamentos. A atenção ao consumidor pode incluir também a criação de folhetos explicativos sobre fitoterápicos, folders para públicos específicos (mulheres grávidas, lactantes, idosos, crianças) e até contratar consultores para dar palestra sobre o tema à população do entorno da farmácia, o que pode ser feito em parceria com a indústria, ensinam os especialistas em varejo.
Além de contribuir para o uso responsável de medicamentos, essas ações trazem incremento à imagem da marca e se traduzem em resultados de vendas, com a fidelização da clientela. As empresas podem otimizar seus recursos e ampliar ganhos com medidas simples, como organizar os produtos de acordo com os interesses dos consumidores. No caso dos fitoterápicos, se possível, reservar a eles um local específico e próximo a produtos relacionados com o bem-estar, como os alimentos funcionais.

A principal diferença com os sintéticos é que nestes existe uma agregação de elementos químicos para isolar a molécula principal, enquanto os fitoterápicos utilizam o chamado fitocomplexo, ou seja, todos os componentes do extrato seco padronizado ou da tintura interagem para a obtenção do efeito terapêutico desejado. O modo de ação dos medicamentos fitoterápicos está relacionado com sua composição, ou seja, às drogas vegetais que os compõem, pois há uma grande variedade de substâncias ativas presentes nessas drogas vegetais com atividade biológica, e que estão classificadas quimicamente.

Essas classes de ativos podem apresentar mais de uma atividade e a droga vegetal apresenta mais de uma classe de ativos. As principais classes são os taninos, flavonoides, antraquinonas, saponinas, cardioativos, óleos essenciais, alcaloides, lignoides, entre outras. 

A opção pela utilização dos fitoterápicos deve ser sempre endossada por um profissional habilitado em prescrevê-los. “Em primeiro plano, os médicos. Porém, outros profissionais, como farmacêuticos e nutricionistas, já gozam de regulamentação que lhes permite prescrever fitoterápicos, desde que eles não requeiram prescrição médica”, revela o professor do ICTQ.

“O farmacêutico pode indicar e prescrever um fitoterápico da mesma forma que um Medicamento Isento de Prescrição (MIP)”, revela o membro do Grupo de Práticas Integrativas e Complementares do Conselho Federal de Farmácia (CFF), Nilton Luz Netto Junior. “Deve-se optar por aqueles que possam ser utilizados sem a vigilância de um médico para fins de diagnóstico, de prescrição ou de monitoramento, e não usá-los em doenças, distúrbios, condições ou ações consideradas graves”, salienta.

“As reações adversas que possam ocorrer durante o tratamento, e que porventura não sejam previstas, devem se notificadas ao fabricante e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que sejam documentadas”, acentua o especialista. “Mesmo que o médico não prescreva um fitoterápico, ele ou o farmacêutico devem perguntar ao paciente se ele está fazendo uso desse tipo de medicamento e alertá-lo para a possibilidade de interações, devido ao uso concomitante”, pondera a professora titular da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP), Elfriede Marianne Bacchi.

Considerando que os fitoterápicos são compostos por várias substâncias, ou seja, todas aquelas presentes em um vegetal ou no extrato vegetal, não devem ser utilizados em doenças em que uma faixa muito estreita de dose é necessária, na opinião da professora da USP.

Como exemplo, ela cita os glicosídeos cardiotônicos, que são substâncias que atuam aumentando a força de contração do coração. Nesse caso, a faixa terapêutica, isto é, o limite entre a dose terapêutica e a dose tóxica, é muito estreita. “Imaginando que, em vez de prescrever um glicosídeo cardiotônico, o médico prescreva um fitoterápico contendo glicosídeos cardiotônicos, várias outras substâncias, além dos glicosídeos cardiotônicos ou de um glicosídeo cardiotônico específico, estarão presentes, interferindo na atividade. Dessa maneira, o medicamento poderá causar intoxicação ou não ter efeito, lembrando que é impossível quantificar todas as substâncias presentes em um fitoterápico”, aponta.
A principal indicação de um fitoterápico é para casos em que haja um sinergismo. “Duas ou mais substâncias presentes no fitoterápico atuam de modo sinérgico, de forma a podermos diminuir a dose, com o mesmo efeito e, ao mesmo tempo, diminuindo possíveis efeitos tóxicos.”

Para a professora Nilsa, da Faculdade Oswaldo Cruz, é possível associar medicamento fitoterápico com sintético, porém as interações devem ser bem monitoradas. Ela lembra que os medicamentos à base de Gingko biloba, por exemplo, não podem ser utilizados no longo prazo, pois interferem em fatores de coagulação, consequentemente, não se deve tomá-los com anticoagulantes. “Esse é um erro muito comum, pois a população, principalmente os idosos, gosta de tomar ácido acetilsalisílico infantil, pois acredita que ‘afina o sangue’, mas esta ação é a mesma do Gingko biloba”, revela.

Fito 2015

Especial Fito 2015

Essa matéria faz parte do Especial Fito 2015.

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