Velho mundo

O aumento da população com mais de 60 anos de idade é uma tendência global; mesmo países em desenvolvimento estão observando o crescimento contínuo do número de idosos

Antes da era da globalização, a realidade de países com economias maduras costumava ser bem diferente das nações ainda em desenvolvimento. Na Europa, onde o acesso à saúde de qualidade e a informações sobre métodos anticoncepcionais era bem difundido, o número de idosos sempre foi alto e a taxa de natalidade apresentava constante queda.  

Enquanto isso, em países de economia mais jovem como o Brasil, a saúde pública precária e a inexistência de políticas de controle de natalidade formavam um quadro inverso: alto índice de fecundidade e expectativa de vida abaixo da média mundial.  

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ilustram bem como era a realidade brasileira antes que o País começasse a despontar como uma das principais economias mundiais. Na década de 1980, a média de expectativa de vida do brasileiro era de 62,52 anos. No mesmo período, entre mil adultos, 656,2 pessoas que completaram 60 anos de idade podiam não completar 80 anos de idade.  

Enquanto os adultos não contavam com boas perspectivas para a velhice, a taxa de fecundidade era alta. Também em 1980, cada mulher brasileira tinha, em média, 4,4 filhos – índice já em queda, pois, em 1960, o número era de 6,3 filhos por mulher.  

A combinação desses dados fez com que o Brasil fosse considerado um país jovem. De acordo com o Censo realizado pelo IGBE em 1980, 26,22% da população tinha entre 0 e 9 anos de idade; 23,38%, entre 9 e 19 anos de idade; 44,24% estava na faixa de 20 a 59 anos de idade enquanto os adultos com mais de 60 anos de idade representavam apenas 6,07% da população.   

Nos últimos anos, a situação começou a se inverter. Até 2004, as pessoas de 0 a 29 anos de idade ainda eram maioria (54,4%) na população, no entanto, dez anos depois o indicador já diminuiu para 45,7%. Ao mesmo tempo, a proporção de adultos de 30 a 59 anos de idade cresceu no período, passando de 35,9% para 40,6%, assim como a participação dos idosos de 60 anos ou mais de idade subiu de 9,7% para 13,7%.  

Os números já consolidados mostram que o Brasil envelheceu e as projeções apontam que o amadurecimento da população deve seguir forte nos próximos anos. Segundo dados da Projeção da População por Sexo e Idade, divulgada pelo IBGE, em 2030, 18,6% deverá ter mais de 60 anos de idade e, em 2060, o percentual deve alcançar 33,7%. Proporcionalmente, o número de jovens deve cair nas próximas décadas. Em 2060, a proporção da população com até 14 anos de idade seria de 13%; a de jovens de 15 a 29 anos de idade, de 15,3%; e a de pessoas de 30 a 59 anos de idade, de 38%.  

Mapa da longevidade

Confira os países em que se vive mais: 

Ranking

País

Expectativa de vida 

1° 

Mônaco

89,5 

Japão  

84,7

Singapura

84,6

Macau

84,5

San Marino

83,2 

Islândia 

82,7

Hong Kong

82,8

Andorra

82,7

Suíça

82,5

10°

Jersey 

82,4

129°

Brasil 

75,2

Fonte: CIA World Factbook 

A dinâmica do envelhecimento 

Para a história de um país, três décadas é um período curto. Como o Brasil conseguiu mudar bruscamente a configuração da população em tão pouco tempo? De acordo com os especialistas entrevistados pelo Guia da Farmácia, o fenômeno do envelhecimento populacional segue uma tendência global, impulsionada por uma combinação de fatores.  

“A longevidade e o envelhecimento são fenômenos do século 21. Estão intimamente relacionados aos avanços da ciência e da medicina que, por meio dos seus estudos, vêm diminuindo o índice de mortalidade, devido ao maior controle sobre várias patologias”, explica a professora e coordenadora de Pós-Graduação em Gerontologia Interdisciplinar, da Universidade Veiga de Almeida (UVA), Maristela Poubel. 

O Brasil conseguiu embarcar nessa tendência global a partir do momento em que melhoraram as políticas públicas de saúde e passou a ter acesso quase imediato às novidades em tratamentos de doenças, com a chegada da globalização. Diante do novo cenário, os brasileiros passaram a viver mais. Em 2014, dado mais atual divulgado pelo IBGE, a expectativa de vida ao nascer no Brasil já era de 75,2 anos. Ou seja, entre 1980 e 2014, houve um aumento de 12,4 anos no índice.  

Os avanços também aumentaram a chance de se chegar a uma idade avançada. Em um grupo de mil pessoas que alcançaram os 60 anos de idade, mais da metade delas (553) devem chegar aos 80 anos de idade. No último Censo, descobriu-se que o Brasil contava com quase 500 mil idosos com mais de 90 anos de idade. A expectativa é de que, em 2060, essa população aumente em mais de dez vezes, chegando a cinco milhões de cidadãos.  

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Novo estilo de vida  

 Cuidar melhor da saúde da população teve grande importância no fenômeno do envelhecimento, mas outros fatores diretamente ligadas à mudança de estilo de vida da mulher também contribuíram para que a pirâmide etária sofresse alterações na estrutura. Preocupadas em ter maior grau de escolaridade e construir uma carreira profissional sólida, as mulheres passaram a adiar cada vez mais a maternidade, além de optar por ter um menor número de filhos.  

A taxa de fecundidade no Brasil caiu para 1,77 filhos por mulher – abaixo do nível natural de reposição da população –, de acordo com o Censo Demográfico 2013. Desde a década de 1960, quando o governo começou a divulgar métodos anticoncepcionais e as mulheres passaram a ingressar no mercado de trabalho, o número de filhos por mulher apresentou queda. Somente nos últimos 14 anos, o índice caiu 26%, passando de 2,39 filhos por mulher para menos de dois, entre 2000 e 2013.  

Além disso, as brasileiras estão optando por ter filhos cada vez mais tarde. Cerca de 30% delas têm o primeiro filho depois dos 30 anos – em 2000, o índice era de 22,5%. Também cresceu o número de mulheres sem filhos no País. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013 mostravam que 38,4% das mulheres de 15 a 49 anos de idade não tinham filho. Entre as mulheres de 25 a 29 anos de idade, o percentual era de 40,4%.  

Mais consciência 

Outro movimento recente que também vem colaborando para que o brasileiro viva mais é o crescimento da preocupação com a saúde. De acordo com o Instituto Euromonitor, o mercado de alimentos saudáveis teve um crescimento de 95% nos últimos cinco anos, no Brasil – hoje, este setor é três vezes maior do que há uma década no País. 

O fenômeno é resposta ao descuido da saúde que o brasileiro apresentou logo que ganhou maior poder de renda. Com poder de compra, passou a fazer más escolhas na alimentação e tornou-se mais sedentário. Os índices de obesidade e outras doenças crônicas relacionadas à má alimentação e falta de exercício físico atingiram níveis preocupantes.  

A boa notícia é que dados da última Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), pesquisa anual feita pelo Ministério da Saúde (MS), mostram que o brasileiro se deu conta do problema e está começando a correr atrás do prejuízo. Os níveis de obesidade se mantiveram estáveis (17,9% da população geral), mas cresceu a prática de atividades preventivas ao excesso de peso.  

Em 2014, houve um aumento de 18% no percentual de pessoas que declaram praticar exercícios físicos regularmente – considerando somente os homens, o índice aumentou 42%. O prato do brasileiro também está mais colorido e saudável. A pesquisa mostrou 35,5% dos brasileiros comem legumes e hortaliças regularmente – entre as mulheres, o índice sobe para 42,5%. 

Autor: Flávia Corbó 

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