A era dos smartphones nas farmácias

Com o celular em mãos para fazer suas consultas de preços, produtos e tratamentos e valorizando uma experiência de compras rápida, interativa e segura, os consumidores levam as farmácias para uma nova era

A crise econômica brasileira não se reflete no varejo apenas pela queda no consumo. Um efeito que exige atenção dos players da área é que, com o bolso mais apertado, o consumidor se torna mais seletivo. Afinal, o orçamento restrito pede escolhas inteligentes, tanto de produtos quanto de pontos de venda (PDVs).

Entretanto, essa seletividade no consumo não é consequência, apenas, da situação econômica. O crescente acesso dos brasileiros à informação também é preponderante.

Com o celular na ponta dos dedos, o shopper consegue comparar preços, mercadorias, canais de venda e tudo mais de que precisar, tomando a decisão da lista de compras antes de sair de casa.

Avanços da assistência farmacêutica pela tecnologia

Não é só o consumidor que adere ao formato digital. Já estão sendo desenvolvidas novas soluções para que as farmácias também sejam capazes de usar a tecnologia a seu favor.

Durante o Abrafarma Future Trends 2017, foi anunciado o desenvolvimento de um novo software que promete ajudar na gestão dos serviços farmacêuticos: o ClinicaRx.

O sócio fundador desse novo sistema, Cassyano Correr, explica que a solução foi apresentada em agosto de 2017 e, até o fechamento desta edição, estava em fase de pré-comercialização para redes interessadas em testes numa etapa-piloto.

“O ClinicaRx permite criar um registro eletrônico de todos os atendimentos clínicos que se faz na farmácia”, conta. Quando as informações sobre um paciente são inseridas nesse sistema, ele também é capaz de disponibilizar inteligências e algoritmos, trazendo respostas automáticas a respeito da melhor interpretação do resultado, orientação adequada que o farmacêutico pode fazer ao paciente e as recomendações de encaminhamento ao médico.

“O software também dá suporte total à gestão de pacientes crônicos, para o estímulo à adesão do tratamento, à aplicação de vacinas na farmácia, ao gerenciamento de tratamentos, à prescrição farmacêutica e a uma série de outros parâmetros”, resume o executivo.

Em uma era de tanta concorrência entre lojas e produtos, essa realidade se intensifica, fazendo com que as compras não sejam escolhidas apenas pelo preço.

Podem ser levados em conta experiência de compras, prestação de serviços, atendimento, conveniência, entre diversos outros fatores factíveis ou subjetivos, mas capazes de fazer toda a diferença na hora da escolha pela preferência.

Nesse sentido, assim como todo o varejo, as farmácias precisam estar atentas a esse comportamento, de um consumidor digital e emponderado, que requisita excelência na hora de investir sua renda.

Acompanhe, a seguir, comportamentos que não podem ser deixados de lado pelo canal e como algumas farmácias pelo País têm se adaptado a esse novo perfil de compras.

1. Consumidor omnichannel

Utilizar lojas físicas ou virtuais, simultaneamente, e esperar a mesma experiência na hora de efetuar a compra já é uma característica marcante entre os brasileiros. O canal farma, que tem entrado de forma gradativa ao e-commerce, já começa a sentir os efeitos dessa realidade.

Segundo a consultora especializada em varejo farmacêutico, Silvia Osso, por aqui, o comércio eletrônico das farmácias tem sido uma fonte de pesquisas de preços a distância.

“Depois da pesquisa, o consumidor se dirige ao PDV para ‘barganhar’ mais descontos, ofertas ou substituição de produtos por outros de tão boa qualidade, mas com preços mais baixos”, diz.

A Ultrafarma, por exemplo, já está atenta a essa prática. “Fazemos questão de praticar o mesmo preço, tanto no ponto físico quanto no e-commerce. Como complemento à unidade de preço, priorizamos um atendimento humanizado via chat, televendas e mídias sociais. São quase 200 colaboradores contratados, pois não terceirizamos a relação com o cliente”, mostra a diretora de marketing da empresa, Lana Bitu.

A rede Pague Menos e outras de grande porte também estão atentas à questão dos preços. Assim, ao entrar no Portal de compras da loja, o cliente precisa selecionar o seu estado. Essa ação faz com que a rede se adapte para uma determinada região e traga os preços praticados nela, até por conta de questões tributárias de cada área.

A Drogaria Onofre, considerada uma das pioneiras do setor em vendas on-line, também tem conseguido conquistar esse mercado ainda pouco explorado.

“Hoje, as vendas pelo e-commerce representam 40% do faturamento da empresa. Temos realizado fortes investimentos para logo integrar toda a experiência dos clientes, independentemente do canal”, sinaliza o diretor de marketing da companhia, Eduardo Magion, acrescentando que, nas três capitais onde atua com lojas físicas, são oferecidos serviços de entrega expressa, que podem ser realizados em até quatro horas, para as compras efetuadas até às 21h.

Apesar de cases de sucesso como esses serem cada vez mais frequentes, o e-commerce ainda não deslanchou nas farmácias. O presidente executivo da Associação Brasileira das Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), Sérgio Mena Barreto, acredita que poderá haver uma mudança nesse comportamento se as normas brasileiras permitirem fazer o que já é praticado nos Estados Unidos.

“Por lá, há um modelo chamado ‘refil’, em que o paciente pode baixar um aplicativo da farmácia e solicitar, ao médico, a renovação da receita, eletronicamente, sem a necessidade de voltar ao consultório. A compra se torna automática. Se chegamos a esse patamar no Brasil, as compras vão decolar”, projeta.

Para o diretor da consultoria Inteligência de Varejo, Olegário Araújo, também existem desafios mercadológicos importantes (preço) e operacionais (processos e sistemas) para ser vencidos.

“O cliente quer ter uma solução conveniente e uma boa experiência, mas que passa um site responsivo (acessível de qualquer equipamento), intuitivo, seguro e com informações corretas do produto. A qualidade do cadastro (informações básicas do produto) e a imagem (a interação com o item virtual) ainda comprometem muitas operações”, pondera.

Em relação ao comportamento do consumidor, que pesquisa preços antes de fazer suas compras, vale um alerta. “As farmácias precisam ser mais proativas e não apenas reagir ao preço da concorrência. Somente reagir pode afetar a lucratividade do negócio”, finaliza.

2. Busca por promoções

Há algum tempo se destacando nos PDVs, as promoções seguem firmes e fortes entre as preferências do consumidor, segundo aponta o estudo Winning the Future, realizado pela Kantar Worldpanel, entre abril de 2016 a março deste ano.

O Brasil está entre os países que mais geraram valor em ofertas especiais (40,1%) no primeiro trimestre de 2017. A pesquisa indica que 80% dos consumidores brasileiros compraram itens em promoção no último trimestre, sendo que 55% deles afirmaram que a oferta especial é o principal fator na hora da escolha da loja.

Assim, algumas farmácias pelo País começam a atrair o consumidor utilizando essa tática e de forma personalizada, para resultados mais assertivos.

A Raia Drogasil é um exemplo, segundo Mena Barreto. “Quando o cliente chega a uma das lojas da rede, recebe um cupom com ofertas de produtos personalizadas de acordo com o seu Cadastro de Pessoas Físicas (CPF). São indicadas ofertas com base em produtos já comprados pelo consumidor ou com os quais ele poderia se interessar”, conta.

3. Era dos aplicativos

Que os brasileiros aderiram aos aplicativos, não é mais segredo. Com tantos celulares em mãos, é natural que haja mais maturidade no uso dessas soluções, inclusive para compras.

Uma pesquisa recentemente divulgada pela Panorama Mobile Time e o Opinion Box revelou que 46,2% dos internautas do País com smartphone já fizeram compras dentro de um app.

As farmácias já têm usado esse hábito em seu favor, seja para aumentar as compras, como também para atrair mais clientes à loja. A comprovação dessa realidade vem por meio de números apresentados pelas redes associadas à Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar), que adotaram, há cerca de um ano, uma ferramenta que a entidade desenvolveu em parceira com a Stefanini Inspiring.

Um grande destaque do projeto foi o chat do aplicativo, pelo qual os consumidores trocaram mensagens com as lojas. Por meio dessa ferramenta, eles buscaram, principalmente, atendimento farmacêutico e informações sobre produtos.

Dados referentes ao mês de julho último apontaram que a frequência nas farmácias das redes de um cliente com aplicativo instalado em seu smartphone foi de 2,3 vezes por mês, já a de um cliente sem aplicativo contabilizou 1,6.

Mas o impacto maior está em relação ao tíquete médio mensal consumido pelos clientes, sendo o valor com aplicativo de R$ 90,97, e de quem não tem aplicativo de R$ 68,89.

“A diferença se justifica pela capacidade de fidelização que a ferramenta proporciona, pois está sempre municiando os clientes de informações pertinentes e promoções que se enquadrem em suas reais necessidades. É de enorme serventia para o cliente, pois a tecnologia é utilizada, por exemplo, para identificar os padrões de consumo e oferecer as promoções que realmente sejam relevantes”, explica o diretor de operações da Febrafar, Ney Henrique Arruda Santos.

Atualmente, já são 12 redes (769 lojas) ligadas à entidade que aderiram ao aplicativo e são desenvolvidas sete campanhas, entre elas, de boas-vindas, cupons de descontos e uso contínuo.

A Drogaria Onofre, igualmente, tem investido no mobile. Recentemente, lançou a uma nova versão de seu aplicativo para Android e iOS, apostando num diálogo ainda mais próximo com o cliente.

“A nova versão traz banners de destaque, navegação por categorias de produtos, busca e detalhamento das mercadorias, informações de Servicço de Atendimento ao Consumidor (SAC), link para as redes sociais da Onofre, relação das lojas físicas, entre outras”, enumera Magion. Com isso, o faturamento nos canais eletrônicos da Onofre deve receber um incremento de 10% até o fim do ano.

Para Araújo, um dos segredos para farmácias conquistarem bons resultados via aplicativos é sair do limite da divulgação de preços. “Num ambiente altamente tecnológico, o toque humano é fundamental. É a combinação desses fatores que permitirá o varejista conquistar a mente (a razão ou o bolso), mas também o coração dos clientes e assim construir uma relação de longo prazo”, ensina o consultor.

4. Conveniência e prestação de serviços

A conveniência é algo que sempre foi buscado no canal farma e que, pela falta de tempo da população, ganha mais importância. “Clientes de farmácia gostam de comodidade nas formas de pagamento, além de velocidade e agilidade no atendimento. As farmácias com Atenção Farmacêutica ou Consultório Farmacêutico também têm sido bem-vistas junto aos clientes, principalmente com aqueles com mais idade e baixo poder aquisitivo”, sinaliza Silvia.

As farmácias de grande porte têm investido para aprimorar a conveniência. A Ultrafarma, por exemplo, já conta com uma equipe de 200 colaboradores no televendas/SAC e de 250 motoboys contratados, que entregam o pedido de 12 a 24 horas após ele ser feito (entregas na Grande São Paulo).

Além disso, suas lojas físicas dispõem de, aproximadamente, 100 colaboradores com conhecimento técnico para dispensação de medicamentos, apoiados por grupo de farmacêuticos em tempo integral, prestando serviço de Atenção Farmacêutica. “Com treinamentos, desenvolvimento e capacitação, as farmácias da marca têm tempo médio de atendimento de sete minutos”, constata Lana.

5. Mídias sociais

Divulgação de ofertas e descontos, somadas a orientações sobre doenças e prevenção – seja via Facebook, Instagram e WhatsApp – têm sido táticas usadas pelas farmácias para divulgação de suas marcas nas redes sociais. Esta aposta é extremamente válida.

A pesquisa Panorama Mobile Time e o Opinion Box, que entrevistou brasileiros que acessam a internet e possuem smartphone, já identifica que o WhatApp é o aplicativo mais presente nos celulares dos brasileiros, com 66% de usuários; seguido pelo Facebook (57,4%); e Instagram (32,4%).

Para atender a essa realidade, a Ultrafarma tem uma equipe digital voltada, exclusivamente, para as estratégias não apenas de mídia (que tem como premissa a conversão em vendas), mas também de mídias sociais, de forma que sejam mais do que relevantes: que agreguem valor ao consumidor.

A Onofre também tem buscado usar as redes sociais, inclusive com foco em cativar seus clientes por meio da informação, incentivando-os à prevenção de doenças.

“Firmamos uma parceria com o especialista em qualidade de vida e saúde Marcio Atalla, que será o embaixador da marca pelos próximos dois anos. Inclusive, ele está comandando a webserie Desafio Onofre – 90 dias para mudar sua vida, que visa incentivar as pessoas para um estilo de vida mais saudável”, diz Magion.

6. Experiência e fidelidade

A experiência do consumidor no canal farma tem se transformado e o layout das lojas é a parte mais visível desta transformação. A Ultrafarma é um exemplo.

“Nossas lojas começaram a passar, em agosto último, por uma renovação de espaço e de comunicação que visa a uma experiência de compra mais confortável, dinâmica e rica em conteúdo. Incluímos, inclusive, uma agenda de degustação de produtos e permanente consultoria de nutricionistas”, revela Lana.

Também este ano, em fevereiro, a Drogaria Onofre deu início a um novo projeto arquitetônico às lojas, a fim de melhorar e simplificar a experiência de navegação e compra.

“Hoje, os mais de 12 mil itens, de variadas marcas, estão disponibilizados em quatro setores: Sentir-se bem [conveniência de saúde, medicamentos com prescrição e Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPS)]; Cuidar de Você (produtos de higiene, beleza e dermocosméticos para homens e mulheres); Viver Melhor (vitaminas e itens destinados a diabéticos e pessoas da terceira idade); e Pais e Filhos (dedicado a grávidas e ao dia a dia dos bebês)”, descreve Magion.

Foto: Shutterstock

Passagem obrigatória

Edição 299 - 2017-10-23 Passagem obrigatória

Essa matéria faz parte da Edição 299 da Revista Guia da Farmácia.