Alcon se apresenta como empresa independente

Cisão da Novartis, anunciada em abril último, coloca a companhia num novo estágio, completamente focada no seu core business, que é a área de vision care

A Alcon, empresa líder mundial em cuidados oftalmológicos dedicados a ajudar as pessoas a enxergarem melhor, anunciou, em 9 de abril último, sua estreia como uma empresa independente, de capital aberto, e a conclusão de sua separação da Novartis.

Para comentar sobre o novo momento da empresa, o presidente da companhia, Luciano Marques, concedeu uma entrevista exclusiva ao Guia da Farmácia, contando que, a partir de agora, a Alcon terá mais foco no seu core business, que é a área de vision care, e flexibilidade na busca de sua própria estratégia de crescimento, com uma estrutura mais eficiente que permitirá expandir os mercados.

A Alcon tem, hoje, uma presença global em 74 países e atende pacientes em mais de 140, com negócios de rápido crescimento em mercados emergentes. No Brasil, a empresa atende a quase 90% do canal farma, atuando em cerca de 80 mil pontos de venda (PDVs).

Guia da Farmácia • Por que a Alcon decidiu se tornar uma empresa independente?

Luciano Marques • Essa foi uma decisão estratégica. A Alcon, até então, pertencia ao Grupo Novartis, que tem várias divisões de negócios: produtos inovadores, genéricos e oncológicos, todas voltadas para medicamentos, e tinha a divisão Alcon, com foco nos medical devices, como equipamentos, lentes intraoculares e lentes de contato. Já se percebe, aí, que há uma natureza um pouco diferente nos negócios, embora todas estivessem envolvidas na área da saúde.

A Novartis, como Grupo, fez uma avaliação sobre se deveria prosseguir com a Alcon como uma divisão ou como uma empresa independente. Na conclusão, que levou aproximadamente um ano, houve o entendimento de que a Novartis atuando com foco em medicamentos e a Alcon prosseguindo de forma independente na área de saúde ocular seria uma oportunidade muito maior de crescimento para ambas as partes.

Guia • A transição aconteceu, então, num momento em que ambas as empresas sentiram a necessidade de seguir o seu core business, certo?

Marques • Exatamente. O core business da Alcon é ajudar as pessoas a enxergar melhor e os negócios estão focados no setor de cuidados com a visão. Já a Novartis é um conglomerado focado em medicamentos inovadores em várias áreas. Então, quando olhamos o DNA de cada empresa, vemos como uma grande oportunidade para cada uma tomar decisões mais focadas e não diluídas num grande grupo.

Guia • Por quanto tempo a Alcon atuou com o grupo Novartis e quais foram os ganhos nesse processo?

Marques • Desde 2011, e os ganhos foram diversos. A Alcon integrou um grupo muito maior e que tinha uma área de serviços bem mais ampla e com vários negócios. Em alguns momentos, especialmente na área de medicamentos, houve uma sinergia muito grande, especialmente na área de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) e de distribuição. Foi um momento de fortalecimento com esses setores que eram comuns.

Guia • Agora como uma empresa independente, quais são os principais planos da Alcon?

Marques • O nosso foco continua o mesmo, mas agora sem nenhuma interferência de fazer parte de uma empresa maior e que tem o foco mais diluído. Nosso foco continuará sendo fazer as pessoas verem melhor e vamos fazer isto com ainda mais agilidade, pois tudo estará voltado para o nosso DNA.

Nosso negócio continua funcionando da mesma forma, sem nenhuma alteração por conta da nova estrutura, seja em serviço ou capacidade de atender ao mercado. Somos uma empresa que fatura US$ 7 bilhões mundialmente e tem uma liderança mais do que consolidada no setor em que atua.

Guia • Quais são os planos da Alcon para o mercado brasileiro?

Marques • Por aqui, continuamos com duas grandes divisões de negócios. Uma delas é mais focada no setor cirúrgico, com equipamentos e lentes intraoculares dirigidas para cirurgia de catarata. Para tanto, temos uma grande infraestrutura, que vai desde consultores cirúrgicos e assistência para que os equipamentos funcionem com alto padrão de qualidade. E temos liderança na categoria de vision care, com produtos emblemáticos e líderes no segmento.

Na parte de lágrimas artificiais, temos o Systane, focada no olho seco. Nesta divisão, temos, ainda, as soluções de limpeza para lentes de contato, com Opti-Free, também líder no segmento; e as vitaminas dedicadas à saúde ocular. Nesta divisão, também temos toda a linha de lentes de contato.

Estamos muito comprometidos com esse segmento e, inclusive, aumentamos o número de representantes, dando um foco para as visitas às farmácias, assegurando que a marca tenha uma boa comunicação com seus consumidores e levando informações aos profissionais do canal. Também ampliamos nossa presença entre os médicos, que são os prescritores de nossos produtos.

Temos adquirido ainda novas tecnologias, todas elas alinhadas a essa questão de cuidados com a visão, como o olho seco. Recentemente, adquirimos uma empresa, a Tear Film, que já tem produtos disponíveis e produtos em pipeline, todos na área de olho seco. Na própria linha Systane, temos planos de trazer uma linha completa no Brasil, com soluções customizadas para o olho seco.

Guia • A Alcon tem fábrica aqui no Brasil?

Marques • A fábrica que pertencia a Alcon produzia medicamentos e lágrimas artificiais. Na cisão, essa fábrica ficou na Novartis, mas 40% da produção dessa fábrica fica para a Alcon e não teremos alteração nas nossas entregas. A possibilidade de desenvolver uma nova fábrica no Brasil é um cenário possível.

Guia • Como fica o potencial do setor de vision care diante do envelhecimento da população no País e da era digital, com pessoas o tempo inteiro diante de telas, fator que pode prejudicar a visão?

Marques • Prevemos uma crescente necessidade de soluções para saúde ocular. Com a idade e o envelhecimento, não só se mantém o volume de cirurgias de catarata, mas associado ao ambiente em que vivemos, traz também a hipermetropia, que é a dificuldade de enxergar de perto.

Nesta geração, também se destacam os sintomas do olho seco. Se todo mundo está na frente de um device, celular, computador e se vive num ambiente com poluição, fatores que favorecem esse problema, assim, a necessidade mais frequente no uso de lubrificantes oculares passa a aumentar.

Guia • Como avalia os cuidados com a saúde dos olhos da população brasileira?

Marques • Sentimos que é uma área crescente em preocupação, porque as informações hoje são muito mais difundidas. Contudo, ainda existe um grande espaço para a população tomar consciência sobre a saúde ocular. Nesse aspecto, temos feito várias iniciativas para fazer a nossa parte e falar sobre saúde ocular.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 80% das deficiências visuais podem ser prevenidas ou curadas. Isso é importante para que se aumentar o investimento nessa área. A prevenção poderia economizar, globalmente, US$ 102 bilhões aos cofres públicos com serviços de atendimento ocular adequado. Portanto, é uma área de oportunidade enorme, não só no Brasil como no mundo.

A Alcon, aqui no Brasil, tem o compromisso de estar muito próxima do médico oftalmologista, mas também de todos os profissionais desta área, como os farmacêuticos, para promover a educação continuada da questão.

Recentemente, avançamos para ajudar os profissionais da saúde usando os meios digitais, levando informação de forma mais leiga, para o consumidor, sobre a importância de se procurar um médico, de usar corretamente uma lente de contato, de tomar consciência sobre os sintomas do olho seco, alertando as pessoas que elas não precisam conviver com os sintomas, já que existe tratamento.

Guia • E como está o mercado de lentes de contato no Brasil?

Marques • É um mercado muito pequeno ainda, mas com um potencial enorme de crescimento. Especula-se que esse mercado não atinja 1% de penetração da população brasileira.

Na Europa, a média de penetração é de 12%. No País, os brasileiros precisam ter mais consciência de que podem usar lentes e melhorar a visão com estes produtos e que eles são, hoje, muito confortáveis ao uso.

Além disso, o canal de distribuição ainda é restrito, porque não é toda ótica que vende lentes de contato; e nem todo médico se foca nas lentes de contato. Temos, ainda, a questão do acesso, inerente a qualquer país em desenvolvimento.

Guia • O uso de soro fisiológico para limpeza das lentes de contato ainda é recorrente entre os usuários?

Marques • Sim. Ainda há muita desinformação. Observamos muitas pessoas usando de forma inadequada o soro fisiológico para limpeza de lentes de contato. E a indicação não é essa. Existem muitas tecnologias envolvidas nas soluções específicas para esse fim e trabalhamos campanhas com o tema.

O fato de o soro não ter sido feito para assepsia de lentes não garante nenhuma desinfecção ou tratamento que a lente exige para que seja funcional ao olho do paciente. Continuamos na nossa meta de alertar tanto a médicos quanto a farmacêuticos sobre esses riscos. As soluções de limpeza limpam, desinfetam e hidratam a lente, aumentando o conforto e adesão ao uso da lente.

Guia • A Alcon está presente em quantas farmácias pelo País?

Marques • Até por conta da condição de liderança da Alcon no mercado, a empresa é amplamente presente tanto em redes quanto em independentes. Atendemos a quase 90% do mercado, atuando em cerca de 80 mil farmácias no Brasil.

Guia • O que o varejo farmacêutico poderia fazer para incrementar as vendas de produtos de saúde ocular no PDV?

Marques • Temos muitas iniciativas parceiras com os PDVs. Quando a farmácia entende que o soro fisiológico tem outro foco, não deixar esses produtos próximos nas gôndolas faz com que o consumidor não seja induzido ao entendimento errado.

Outro ponto que os PDVs poderiam explorar é a informação em torno dos colírios, alertando o consumidor que nem todos eles são iguais. Existem colírios lubrificantes; outros são descongestionantes, para tirar a vermelhidão do olho; e existem os multifuncionais, que vão hidratar e lubrificar o olho.

Esse conhecimento é muito importante para que o paciente e o consumidor adquiram o produto que estão buscando. Se eles tiverem a necessidade deles atendida, eles compram novamente. Basicamente, o ciclo de informação é favorável a todos os envolvidos na cadeia.

Guia • A empresa tem lançamentos previstos para este ano?

Marques • Temos novas lágrimas artificiais a caminho, mas não arriscaria dizer que para este ano, porque dependemos de processos regulatórios. Para Opti-Free, estamos lançando uma nova opção para viajantes e acabamos de lançar, também, na família Opti-Free, as gotas umidificantes, que são colírios para quem usa lente de contato.

Guia • Quais são as projeções de crescimento da Alcon para 2019?

Marques • Nossa projeção é positiva, sim. Esperamos um ano em que vamos crescer acima da média de mercado. Isso não só por uma questão da economia, que dá sinais de retomada, mas pela quantidade de inovação que estamos trazendo para o mercado.

A combinação da inovação e percebermos que estamos em segmentos que crescem dois dígitos nos leva ao pensamento de que vai ser um ano positivo para a Alcon no Brasil.

Foto: Shutterstock

Conhecimento é Tudo!

Edição 319 - 2019-06-06 Conhecimento é Tudo!

Essa matéria faz parte da Edição 319 da Revista Guia da Farmácia.