Atenção redobrada ao piscar

Ficar muito tempo na frente de aparelhos eletrônicos e em ambientes com ar condicionado faz com que o número de piscadas diminua. Problemas decorrentes da falta de lubrificação nos olhos são cada vez mais recorrentes

Sensação de ardência, coceira e de areia nos olhos. Esses sintomas que incomodam são reflexos da Síndrome do Olho Seco, também chamada de Síndrome da Disfunção Lacrimal, uma das doenças oculares mais comuns. 

Ela é caracterizada pela diminuição da produção de lágrima ou deficiência em alguns de seus componentes. A qualidade da lágrima pode ficar alterada quando uma das três camadas (a de água, a de mucina e a de gordura) que a compõem está deficiente. Por isso, o membro da Associação Brasileira de Catarata e Cirurgia Refrativa (ABCCR), chefe do setor de superfície ocular da Universidade de São Paulo (USP) e chefe do setor de catarata da Santa Casa de São Paulo, Dr. Richard Yudi Hida, destaca que é de extrema importância o equilíbrio desses componentes para a saúde da superfície ocular. A camada gordurosa é responsável por não deixar a água evaporar. Se houver deficiência nessa camada, por exemplo, não é possível permanecer com os olhos abertos por mais que dois a três segundos, devido ao excesso de evaporação.

Sintomas e acometidos

Segundo o oftalmologista do Hospital CEMA, Dr. Omar Assae, os sintomas mais comuns são: a sensação de areia nos olhos, coceira, vermelhidão e olhos embaçados. Mas a oftalmologista e gerente médica da Johnson & Johnson Vision Care, Dra. Liane Touma Falci, explica que não é somente a sensação de ressecamento que caracteriza o olho seco. “A alteração da lacrimação pode ter sintomas mais leves ou mais intensos, como a sensação de corpo estranho.”

O oftalmologista do H.Olhos – Hospital de Olhos Paulista, Dr. Ibraim Viana Vieira, destaca ainda a fotofobia e a queimação que, habitualmente, pioram ao longo do dia. Embaçamento transitório da visão, olho vermelho e formação de secreção ou crostas nos cílios também são frequentes. 

Segundo a oftalmologista, Dra. Samantha de Albuquerque, a Síndrome do Olho Seco é mais comum em mulheres, especialmente após a menopausa, idosos e em pacientes com doenças reumatológicas, independente do sexo. “A incidência de olho seco é maior entre as mulheres, principalmente entre a quarta e sexta décadas de vida, quando ocorre uma redução natural do hormônio estrógeno. Ao longo da vida, ocorre redução progressiva na produção lacrimal, sendo que, por volta dos 65 anos de idade, há uma produção de cerca de 60% menos lágrima do que ocorre aos 18 anos de idade”, acrescenta a oftalmologista e membro da Sociedade Brasileira de Ceratocone, Dra. Mônica Feitas.

O Dr. Hida completa destacando que indivíduos que usam computador/tablet/celular, pessoas acima dos 40 anos de idade e quem usa lentes de contato estão mais propensos ao problema. Acredita-se que essa síndrome afete cerca de 18 milhões de brasileiros, segundo dados de uma pesquisa da Associação Brasileira de Portadores de Olho Seco (Apos).

Quando não diagnosticada e corretamente tratada, pode evoluir para lesão da superfície ocular e, em alguns casos, até à perda da visão, alerta o oftalmologista e membro da Sociedade Brasileira de Ceratocone, Dr. Leonardo Torquetti.

Ambiente hostil

Fatores, como poluição, umidade, temperatura ou ar condicionado, são os principais causadores do olho seco devido ao aumento da evaporação da lágrima por alterações na sua qualidade. 

“O uso de qualquer dispositivo eletrônico ou não eletrônico que faça com que o indivíduo permaneça constantemente fixando os olhos por muito tempo, pode causar também a Síndrome do Olho Seco devido à deficiência no piscar, principal ato na estabilização da superfície do olho. Outros fatores importantes são a maquiagem e doenças sistêmicas”, alerta o Dr. Hida.

As pessoas que trabalham em escritórios estão sujeitas a mais fatores de risco, destaca o Dr. Vieira. Ambientes refrigerados por ar condicionado apresentam redução da umidade relativa do ar. Nessas condições, ocorre o aumento da evaporação da lágrima, com alteração de sua composição e osmolaridade.

Prevenção e tratamento

Uma das maneiras de prevenir o incômodo pelo olho seco, segundo explica a Dra. Liane, é que as pessoas evitem se posicionar embaixo de saídas de ar; lembrarem-se de piscar mais quando estiverem na frente de aparelhos eletrônicos. “A tela deve estar na linha dos olhos e manter uma postura adequada, com os braços a 90º do tronco, são maneiras de amenizar o problema.”

Pacientes que não respondem à revisão dos fatores ambientais são inicialmente tratados com lágrimas artificiais ou géis. “A segunda linha de tratamento inclui anti-inflamatórios e tetraciclinas tópicos ou por via oral. Em alguns casos mais graves, pode ser necessário o tratamento cirúrgico com redução da fenda palpebral ou oclusão transitória dos pontos lacrimais”, avalia o Dr. Vieira.

Existem, de acordo com a oftalmologista e ex-chefe do setor de doenças externas oculares e córnea do Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Dra. Myrna Serapião dos Santos, várias opções de lágrimas artificiais, que podem ser usadas sem prescrição médica, uma vez que não possuem efeitos colaterais. 

Alguns produtos vão além e têm em sua composição substâncias, como ácido hialurônico e carboximetilcelulose. Estes dois compostos potencializam a lubrificação e a hidratação, proporcionando mais conforto, alívio, sem a sensação de embaçamento visual. Esse tipo de lágrima artificial é indicado para pacientes com qualquer grau da doença e àqueles que usam lentes.

Recentemente, novas modalidades de tratamento com objetivo de atingir a causa do olho seco têm sido introduzidas. Ele envolve cinco estágios:

1. Substituição da lágrima: existem as lágrimas artificiais aquosas e as viscosas para quadros mais severos. Atualmente, algumas lágrimas artificiais não possuem ou neutralizam os conservantes. Esse tipo pode ser utilizado mais frequentemente do que o habitual.

2. Conservação da lágrima: a oclusão dos pontos lacrimais pode ser feita com plugs, provisórios de colágeno ou permanentes de silicone, que permanecem dentro dos ductos lacrimais. Os plugs podem ser introduzidos no olho manualmente pelo médico no consultório, sem que o paciente sinta dores. Outra opção é a cauterização dos pontos lacrimais ou oclusão cirúrgica.

3. Estimulação da produção de lágrimas: existem certos medicamentos que aumentam o lacrimejamento, como a pilocarpina.

4. Terapia anti-inflamatória: esse tipo de tratamento pode ser baseado no uso adequado e controlado de corticoide tópico e da ciclosporina tópica. A ideia é minimizar o efeito do processo imune nas glândulas lacrimais e superfície ocular. 

5. Terapia hormonal: utilização de hormônios andrógenos orais ou tópicos, ainda em estudo.

Tipos de colírios

A lágrima é o tipo mais comum. Ela recobre e ajuda a manter a umidade adequada da superfície externa ocular. Além disso, o diretor médico da Hypermarcas, Dr. João Fittipaldi, destaca que ela contém substâncias bactericidas que protegem o olho, impede a aderência de corpos estranhos, atua na oxigenação da córnea, remove detritos e sujeira, age na lubrificação – evitando atrito com as pálpebras – e agrega substâncias nutritivas para o olho.

“As ‘lágrimas artificiais’ e ‘colírios umidificadores’ são termos utilizados por médicos e pacientes quando se referem a quaisquer colírios prescritos pelo médico oftalmologista com intuito de repor a lágrima natural do indivíduo”, completa o Dr. Hida. Não existe um consenso com relação à nomenclatura. 

Além disso, existem diversas substâncias lubrificantes oculares disponíveis atualmente no mercado para tratamento do olho seco, sendo que as principais são à base de hialuronato de sódio, carmelose sódica, glicerol, glicerina, carboximetilcelulose, propilenoglicol, etc. 

“Dispomos de algumas dessas drogas sob a forma de colírio e outras sob a forma de gel, para permanência no globo ocular por período mais prolongado. Vale lembrar que a maioria das substâncias visa interferir na camada aquosa da lágrima; enquanto outras são mais direcionadas para tratar situações que interferem sobre a camada gordurosa mais externa da lágrima, controlando a sua evaporação”, orienta a Dra. Mônica. 

DICAS DE PREVENÇÃO AOS PACIENTES DA FARMÁRCIA

Cada tipo de olho seco tem suas peculiaridades no tratamento. De maneira geral, algumas orientações no dia a dia devem ser consideradas.

Descansar os olhos: usar computador ou ler por muito tempo força a vista e reduz o número de piscadas. Faça pequenos intervalos, direcionando os olhos para um ponto distante. Esse exercício também ajuda relaxar a musculatura responsável pelo foco de perto.

Acertar a altura da tela do computador: o ideal é que a tela fique um pouco mais baixa do que a linha do olhar. Os olhos voltados para baixo ficam mais relaxados e menos abertos.

Piscar com mais frequência: quando a pessoa está diante de atividades que exigem o olhar mais atento, pisca-se menos, o que prejudica a lubrificação da córnea.

Beber bastante líquido: assim como os lábios, os cabelos e a pele, os olhos também se desidratam.

Usar óculos de sol: eles protegem os olhos de fatores externos que podem irritar a vista, como os raios ultravioleta B (UVB) e o vento.

Higienizar bem a região dos olhos: retirar a oleosidade da pele e resquícios de maquiagem, utilizando sabonetes neutros. Esse cuidado evita a danificação da lágrima e o entupimento das glândulas que secretam componentes para a lágrima.

Complementação com ômega 3: ele ajuda na composição da camada mais oleosa da lágrima, importante para evitar que ela evapore facilmente.

Descansar bem: boa qualidade e quantidade de sono são de extrema importância para descansar os olhos.

Fonte: membro da Associação Brasileira de Catarata e Cirurgia Refrativa (ABCCR), chefe do setor de superfície ocular da Universidade de São Paulo (USP) e chefe do setor de Catarata da Santa Casa de São Paulo, Dr. Richard Yudi Hida

 

Como trabalhar o produto 

Em farmácias e drogarias, vale a pena investir numa categoria de saúde dos olhos, que traz um bom tíquete médio. Entretanto, é importante trabalhar o Gerenciamento por Categorias (GC) para facilitar a identificação dos produtos por parte do paciente. “Por exemplo, os colírios vendidos sem prescrição médica devem ser expostos do lado de fora do balcão”, explica a gerente de produto da Alcon, Marcia Martins.

“É preciso se diferenciar para chamar a atenção dos clientes nos pontos de venda (PDVs). É vital definir e identificar o perfil da loja, público-alvo e a rotina de compra. Com esse conhecimento, é possível estabelecer qual o espaço ideal para os colírios, assim como a política de preços, ofertas e promoções, rentabilizando mais a loja e oferecendo soluções”, explica o diretor comercial da Allergan, Ailton Paiva.

Além disso, de acordo com o Dr. Fittipaldi, a categoria deve estar sempre bem abastecida para evitar perda de vendas por rupturas. “O PDV deve ter comunicação clara, com correta precificação e exposição de medicamentos referências lado a lado com seus respectivos similares para que o consumidor possa fazer a associação e entender as diferentes apresentações disponíveis no mercado.” 

 

Foto: Shutterstock

Pesquisas farmacêuticas

Edição 295 - 2017-06-01 Pesquisas farmacêuticas

Essa matéria faz parte da Edição 295 da Revista Guia da Farmácia.

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