Envelhecimento ativo: a demanda dos idosos nas farmácias

A longevidade já faz parte da realidade da terceira idade no País. Cuidando mais da saúde e da qualidade de vida, público desse nicho busca por produtos e serviços que atendam à sua demanda

A população brasileira manteve a tendência de envelhecimento dos últimos anos e ganhou 4,8 milhões de idosos desde 2012, superando a marca dos 30,2 milhões em 2017, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) – Características dos Moradores e Domicílios, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

De acordo com o levantamento, em 2012, a população com 60 anos de idade ou mais era de 25,4 milhões. Os 4,8 milhões de novos idosos em cinco anos correspondem a um crescimento de 18% desse grupo etário, que tem se tornado cada vez mais representativo no Brasil. As mulheres constituem maioria expressiva, com 16,9 milhões (56% dos idosos), enquanto os homens idosos somam 13,3 milhões (44% do grupo).

Envelhecimento ativo

Contudo, a longevidade impõe desafios para a população brasileira, em que parte significativa segue exercendo alguma atividade profissional mesmo após a aposentadoria. Um levantamento realizado em todas as capitais do País pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) Brasil, divulgado em dezembro do ano passado, mostra que sete em cada dez idosos (70%) estão aposentados. Mas, desse total, 21% continuam trabalhando e uma das principais razões é o fato de a renda não ser suficiente para pagar as contas (47%). Já 48% disseram que querem se sentir produtivos nessa fase da vida e 46% buscam manter a mente ocupada.

Outro estudo da CNDL/SPC Brasil observa, ainda, que boa parte dos lares conta com a renda de familiares acima dos 60 anos de idade. Nove em cada dez (91%) idosos contribuem financeiramente com o orçamento, sendo que 43% são os principais responsáveis pelo sustento da casa. Ainda assim, 34% dos entrevistados recebem algum tipo de custeio — percentual que cresce para 40% entre as mulheres — vindo, principalmente, de pensão por falecimento do cônjuge (15%) ou de familiares (15%).

“As pessoas com mais de 60 anos de idade, especialmente nas cidades, têm tido uma vida com uma participação muito mais ativa na sociedade (envelhecimento ativo) e trabalhando de forma autônoma, mesmo após aposentarem-se e comumente conectados por meio das novas tecnologias de comunicação. Além disso, sobretudo na última década, os idosos têm demonstrado mais interesse em realizar mudanças no estilo de vida, desenvolvendo hábitos considerados mais saudáveis, o que em muito favorece o envelhecimento livre de doenças e uma vida mais independente”, conclui a médica nutróloga e endocrinologista, Dra. Vania Assaly, que acabou de abordar estes e outros assuntos sobre envelhecimento bem-sucedido na primeira edição do World Pro Health Conference, realizado em São Paulo (SP).

Oportunidades ao varejo

Diante do crescimento do público idoso (constituído por pessoas de 60 anos de idade ou mais de acordo com o Estatuto do Idoso) economicamente ativo, que participa das compras pessoais (ou da família), é fundamental que o varejo se prepare para atende-los. Afinal, o aumento da expectativa de vida faz com que aconteça uma maior demanda do consumo.

“Se a população vive por mais tempo, ela consome por mais tempo, com isto, há um impacto no aumento da demanda dos produtos no ponto de venda (PDV), seja para tratar ou prevenir uma doença. E esse aumento da demanda faz com que se aumente a produção na indústria, ou seja, o efeito colateral impacta toda cadeia, da indústria ao consumidor final”, explica o diretor do Instituto Pedro Dias, Pedro Dias.

Como será a vida do idoso em 2025

LONGEVIDADE: a expectativa de vida em 2025 vai superar os 92 anos, e o idoso se tornará um dos pivôs da organização das sociedades e dos mercados;

INDEPENDÊNCIA: ele terá mais autonomia, sobretudo, em relação aos filhos;

ATENDIMENTO: exigirá assistência especializada, mas não aceitará ser infantilizado ou humilhado;

AUTONOMIA: a maioria dos idosos vai continuar vivendo em domicílio próprio. A porcentagem dos que continuarão morando com familiares cairá de 11% em 99 para 6% em 2025. Eles optarão cada vez mais por flats, hotéis ou residências com serviços;

CONSUMO: com grande potencial de consumo, o idoso exigirá ser tratado como cliente e não como doente;

INCLUSÃO: não aceitará viver no ostracismo ou ser objeto de rejeição ou desprezo. Fará questão do convívio com outras faixas etárias;

BELEZA: não abrirá mão do direito de se sentir atraente e sedutor;

CONHECIMENTO: terá a sua experiência cada vez mais valorizada e reconhecida;

PROJEÇÕES: orientará a sociedade quanto a suas necessidades e expectativas próprias, como fizeram os jovens nos anos 70 e 90.

Fonte: parte da pesquisa do Instituto Sodexo, fornecida a esta reportagem pela consultora especializada em varejo farmacêutico, Silvia Osso

O consumidor idoso se tornou, inclusive, importante no fator de decisão de compra de produtos para a família, principalmente no varejo, já que, por conta de ter um maior tempo livre, dirige-se mais vezes aos centros de compra. Além disso, o idoso tem o forte hábito de trocar opiniões com pessoas, influenciando nas compras de outros shoppers.

Dias calcula que o tíquete médio do idoso no País é de, aproximadamente, R$ 150,00/mês. No entanto, esse número pode variar de acordo com o porte da farmácia, se ele tem ou não condições de adquirir esses produtos e das doenças/necessidades envolvidas.

Envelhecimento ativo: preparando o ponto de venda

Não há necessidade de criar corners para idosos. É possível, sim, ter sinalização visual para alguns artigos de interesse, mas esse grupo não deseja que os produtos a eles destinados sejam segregados em um canto ou área. Eles querem a inclusão.

“O público não vê com bons olhos quando o tratam de forma conservadora, ou quando lançam produtos posicionados como artigos para idosos. O consumo desses bens os taxaria de ‘velhos’ e isso é tudo o que eles não querem”, alerta a consultora especializada em varejo farmacêutico, Silvia Osso.

Os clientes idosos esperam encontrar, no PDV, produtos que os beneficiem e os auxiliem na qualidade de vida. Ao pensar no sortimento ideal, vale pensar nas doenças que mais acometem os idosos.

Doenças recorrentes e tratamento indicado

A população idosa no País tem cuidado mais da saúde por conta do acesso à informação, segundo analisa o presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria Gerontologia (SBGG), Dr. Carlos André Uehara.

“Por verem muitas pessoas próximas falecendo ou com quadros evoluídos de algumas doenças, os idosos acabam ficando mais atentos à questão da prevenção”, diz.

Entretanto, algumas doenças costumam ser prevalentes em pessoas com mais de 60 anos de idade, como hipertensão e diabetes que, juntas, constituem os principais fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares [infarto e Acidente Vascular Cerebral (AVC), por exemplo], conforme alerta a médica nutróloga e endocrinologista, Dra. Vania Assaly.

“Também são frequentes nessa faixa etária, as doenças respiratórias e mentais, como depressão, além de câncer e doenças neurodegenerativas, como Alzheimer, que têm como importante fator de risco a própria idade”, acrescenta.

Acompanhe, a seguir, os alertas do Dr. Uehara sobre os riscos que algumas doenças podem trazer ao público idoso e os tratamentos medicamentosos frequentemente utilizados.

HIPERTENSÃO

Riscos: Acidente Vascular Cerebral (AVC) e infarto.

Tratamento: há várias classes de medicamentos que podem atuar como anti-hipertensivos. Entre eles, os inibidores da ECA e betabloqueadores.

DIABETES

Riscos: além do infarto e do AVC, há riscos de amputações por lesões de membros. Pacientes podem evoluir para uma doença renal, com necessidade de diálise ou transplante do órgão, além de apresentar retinopatia diabética (complicação por excesso de açúcar no sangue), entre outras.

Tratamento: pode ser feito com antidiabéticosorais (comometformina) e/ou insulinas injetáveis.

ALZHEIMER

Riscos: declínio mais acelerado das condições do paciente, que pode apresentar problemas na cognição (dificuldade de pensar, confusão mental, delírios…), no comportamento (agitação, agressão, inquietação…), no humor (apatia, raiva, solidão…), além de problemas físicos, como incontinência urinária e incapacidade de coordenar movimentos musculares.

Tratamento: hoje, não há medicamentos que mudem o desfecho da doença, mas que podem reduzir a velocidade de progressão. Para esses casos, são usados os anticolinesterásicos e antipsicóticos.

OSTEOPOROSE

Riscos: fraturas de colo de fêmur e de coluna.

Tratamento: reposição de cálcio e outras medicações com atuação diretamente
no osso.

DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA (DPOC)

Riscos: falta de ar e muito cansaço, além de risco de infecção pulmonar.

Tratamento: existem formas de controle, com corticoides, broncodilatadores e betabloqueadores, entre outros.

INCONTINÊNCIA URINÁRIA

Riscos: idosos mais frágeis podem apresentar casos de delírio e alterações comportamentais por conta do problema. Mas mais do que isso, a incontinência urinária é uma das razões pelas quais a família pode levar o idoso para instituições de longa permanência. A incontinência também pode aumentar o risco de queda e isolamento social. Muitos pacientes com o quadro deixam de sair e praticar suas atividades pelo receio de escape urinário.

Tratamento: pode envolver diversas frentes. Entre elas, a fisioterapia. Alguns medicamentos, como antibióticos, podem ser envolvidos, mas vai depender da origem do mal.

Fonte: Hospital Israelita Albert Einstein

Medicamentos para hipertensão, diabetes, dislipidemias e doenças osteoarticulares (artrose, osteoporose, entre outras), além dos produtos não medicamentosos, como as fraldas geriátricas, são alguns daqueles que não podem faltar. Contudo, antes de comprar inúmeros produtos e ampliar o mix irracionalmente, vale estudar a demanda dos mesmos na loja. Assim, será possível ser mais assertivo nas compras e otimizar os recursos”, ensina Dias.

Na hora da exposição, a sugestão fica para a necessidade de acesso fácil para essas pessoas, ou seja, evitando obstáculos, que não permitem a elas encontrarem os produtos que desejam.

“Eles querem lojas modernas, iluminadas, artigos de boa qualidade e bons preços, onde o custo-benefício é sempre ponderado”, acrescenta a consultora.

Humanização no atendimento

Muitas vezes, o público da terceira idade entra no PDV não só para comprar um produto e/ou serviço. Eles querem carinho e atenção e o atendente precisa ter essa sensibilidade e jogo de cintura ao atendê-lo.

“Farmacêuticos e balconistas precisam oferecer um cuidado especial para esse público que são clientes em potencial, porque, em sua maioria, são polimedicados (tomam vários medicamentos por dia)”, aconselha Dias, acrescentando que, ao tratá-los bem, a fidelização é espontânea e tem um efeito colateral na sua rede de contatos, que indicam o PDV a outros potenciais clientes.

No atendimento, é importante que as farmácias considerem que a menor habilidade física desse público não significa menor capacidade mental. É preciso perceber que apenas parte da população idosa é “carente” e precisa de atenção especial. “Não de deve tratá-los como se fossem incapazes. Ter menos capacidade física não significa menos capacidade mentalmente”, pontua Silvia.

Foto: Shutterstock

Conhecimento é Tudo!

Edição 319 - 2019-06-06 Conhecimento é Tudo!

Essa matéria faz parte da Edição 319 da Revista Guia da Farmácia.