Estresse atinge 90% da população mundial

Considerado uma epidemia, o estresse atinge 90% da população mundial e os transtornos de ansiedade caminham ao lado, o que agrava o problema, levando o paciente a quadros ainda mais preocupantes

Muito se fala sobre rotinas estressantes e o quanto elas fazem parte do cotidiano, mas quando se aprofunda o tema, descobre-se que o estresse e a ansiedade estão bem mais presentes na vida das pessoas do que se pode imaginar.

O estresse é algo que perturba o equilíbrio e pode estar ligado a um evento desagradável, momentâneo ou a algo crônico, constante. Ele é apontado pelos especialistas no assunto como um padrão de resposta a um fator ou evento, seja ele físico ou emocional.

“Trata-se de um conjunto de reações orgânicas, em resposta a estímulos internos e/ou externos, que podem ser tanto de ordem física quanto psíquica. Pode-se definir o estresse como um conjunto de reações fisiológicas necessárias para adaptação a novas situações”, explica o psicólogo da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, Bruno Alexandre Ferreira.

Ainda de acordo com o especialista, pesquisas recentes mostram que os brasileiros ocupam o segundo lugar em relação às pessoas com alto nível de estresse.

“Cerca de 70% dos brasileiros sofrem com estresse, sendo que 30% estão relacionados ao estresse no trabalho. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o estresse atinge o percentual de 90% da população mundial, demonstrando o quão importante é este tema em nossa atualidade”, alerta Ferreira.

Tratamento: fitoterápicos X convencionais

Entre os medicamentos que podem ser prescritos para tratar quadros de estresse e ansiedade é possível encontrar fitoterápicos e medicamentos convencionais ou tradicionais.

Segundo a farmacêutica da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, Ana Carolina Oliveira Ferreira, é preciso esclarecer que ansiolíticos convencionais são medicamentos normalmente de origem sintética que são utilizados para tratar os sintomas ocasionados pela ansiedade e tensão. Já os fitoterápicos são medicamentos extraídos de plantas medicinais, ou seja, exclusivamente de matéria-prima ativa vegetal.

“Como exemplos de plantas medicinais na produção de fitoterápicos que atuam no combate de sintomas da ansiedade e que também possuem efeito calmante temos: valeriana, passiflora, camomila e melissa. Os fitoterápicos, assim como os demais medicamentos de origem sintética, passam por um processo industrial, portanto, possuem legislação específica referente à produção e comercialização”, explica.

Ainda de acordo com a farmacêutica, os medicamentos calmantes e ansiolíticos podem ser divididos entre os seguintes grupos:

  • Benzodiazepínicos (midazolam, diazepam, lorazepam, triazolam, alprazolam, nitrazepam, clordiazepóxido e flurazepam).
  • Antagonistas dos receptores de 5-HT (buspirona, gepirona e ipsapirona), barbitúricos (pentobarbital, fenobarbital e tiopental).
  • Antagonistas dos receptores beta-adrenérgicos (propranolol) que são utilizados, principalmente, para a diminuição dos incômodos referentes a sudorese, tremor e taquicardia.

Já a farmacêutica responsável pela Farmácia Universitária da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP), Maria Aparecida Nicoletti, destaca que tanto o fitoterápico como o medicamento “convencional”, que contém fármacos obtidos por síntese química, são considerados medicamentos alopáticos.

“Um dos fitoterápicos mais utilizados é a Passiflora incarnata que atua na insônia e na hiperexcitabilidade nervosa, induzindo ao sono próximo do fisiológico. Saliente-se que medicamento contendo Passiflora incarnata não deve ser usado com medicamentos sedativos e depressores do Sistema Nervoso Central (SNC)”, alerta Maria Aparecida.

Outros fitoterápicos destacados pela farmacêutica são:

  • Valeriana officinalis.
  • Melissa officinalis.

Com relação aos fatores considerados estressores ou desencadeantes do estresse, a pesquisa Stress Brasil, realizada pelo Instituto de Psicologia e Controle do Stress (IPCS), apontou que os brasileiros consideram como maior fonte de estresse os relacionamentos (familiares, amorosos, com colegas e chefes); seguido de dificuldades financeiras e de sobrecarga de trabalho em segundo e terceiro lugar, respectivamente.

“Além disso, viver situações consideradas traumáticas ou completamente desconhecidas também pode ser gerador de estresse. De modo geral, a literatura tem apontado que são considerados estressores os acontecimentos de vida interpretados como negativos pelo indivíduo”, explicam as psicólogas do Hospital Sírio Libanês, Juliana Siquinelli Padula e Viviane Yumi Hatano.

Ansiedade desencadeante

A ansiedade também é uma resposta emocional que pode estar ligada à antecipação de uma situação de perigo, uma ameaça, um acontecimento futuro que gera um estado de hiperviligância, resultando em sentimento de apreensão e até alterações fisiológicas.

De acordo com a psiquiatra do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Dra. Débora K. Kussunoki, é importante ressaltar que a ansiedade não é necessariamente uma doença e está presente em situações de vida habituais.

“Porém, o Transtorno de Ansiedade (TA) é uma doença, com sinais e sintomas que causam sofrimento e têm impacto negativo sobre a vida do indivíduo”, afirma a psiquiatra.

Ela explica ainda que no Transtorno de Ansiedade Generalizada (TGA) há uma preocupação excessiva de difícil controle, em eventos ou atividades diversas, como trabalho ou escola, por exemplo, na maioria dos dias.

Incidência recorrente

Com toda a rotina da vida moderna, as pessoas estão sendo mais diagnosticadas com ansiedade e estresse. “Acreditamos que a população está mais ansiosa e estressada pelo ritmo de vida da atualidade, muitos compromissos ao mesmo tempo, longa jornada de trabalho e muitas cobranças. Estamos vivendo em uma sociedade imediatista, em que há dificuldade para lidar com suas frustrações e dificuldades para esperar o que colocaram como meta para si, gerando assim angústias, insegurança e medo, fazendo com que fiquem mais ansiosas e estressadas”, avalia a psicóloga da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, Ana Paula de Biasi.

Ela conta que os sintomas do estresse podem ser divididos em dois grupos. Alguns sintomas físicos são: dores de cabeça, dores e tensão musculares, taquicardia, gastrite, exaustão física e alteração de apetite. No grupo psíquico, alguns sintomas são: desânimo, irritabilidade, dificuldade em se concentrar, insônia, tristeza, alteração de humor e insatisfação com a vida. “Já a ansiedade pode causar medo excessivo, angústia, fobias, inibições e pânico”, afirma.

O estresse e o cortisol

O cortisol nada mais é do que um hormônio produzido pelas glândulas suprarrenais e tem como função preparar o organismo para situações de estresse. Dessa forma, ele é liberado exatamente quando o indivíduo está exposto a situações que o levem a um quadro estressante, como uma briga ou ameaça, por exemplo.

A endocrinologista do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Dra. Tarissa Petry, explica que o cortisol tem muitas funções relacionadas a deixar o corpo pronto para essas situações, como: disponibilizar proteína, gordura e glicose, aumentar a pressão arterial, além de ser um potente anti-inflamatório.

Segundo informa a médica, em casos de aumento de cortisol pelo estresse, os seus efeitos são reversíveis e não causam danos permanentes. “Porém, caso a pessoa use corticoides em doses elevadas e em longo prazo, ou tenha alguma doença em que haja aumento de produção de cortisol pelo organismo (Síndrome de Cushing), os efeitos serão evidentes: aumento de glicemia e pressão arterial, perda de massa óssea, bochechas rosadas, estrias violáceas largas no abdome, acne”, explica.

Principais gatilhos

Alguns fatores importantes que podem gerar estresse e ansiedade são:

  1. Pressa.
  2. Resolver várias situações ao mesmo tempo.
  3. Longas jornadas de trabalho.
  4. Falta de lazer/atividades prazerosas.
  5. Mudanças indesejadas.
  6. Problemas de saúde.
  7. Obrigações familiares.
  8. Dificuldades no trabalho.
  9. Autocobrança em excesso.
  10. Falta de tempo para si.

Fonte: psicólogo da Rede de Hospitais São Camilo, Bruno Alexandre Ferreira

Ela destaca ainda que, em situações de estresse, os níveis de cortisol irão subir e retornar ao normal novamente. “Portanto, isso é fisiológico e não patológico”, afirma.

É preciso destacar que o cortisol tem a importante função de ajudar a promover a energia necessária para as atividades do organismo, especialmente ao acordar, em jejum.

“Ele também ajuda a manter a pressão arterial e é secretado fortemente pela manhã, para começar a mobilizar a energia após o período de sono. O cortisol passa a ser danoso causando alterações, como excesso de gordura no abdome, de glicose, perda de massa muscular e de cabelos, por exemplo, apenas quando o corpo é exposto constantemente a níveis elevados desse hormônio”, comenta o médico endocrinologista e diretor da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo (SBEM-SP), Dr. Felipe Henning Gaia Duarte.

Mais equilíbrio

O tratamento para o estresse e a ansiedade consiste em uma série de mudanças na própria rotina e que pode até culminar na prescrição de medicamentos. Afastar-se dos gatilhos é uma das recomendações. O que nem sempre é possível. Mas há algumas coisas que podem ser feitas para ao menos atenuar os sintomas desses quadros. Uma delas é a prática de atividade física.

A coach e sócia diretora da AV Treinamento Inteligente, Vanessa Menache, conta que a atividade física desencadeia uma série de reações químicas, liberando hormônios que geram a sensação de bem-estar no organismo.

“De acordo com pesquisadores, alguns efeitos do exercício são facilmente percebidos em curto prazo, como a melhora do humor, das funções cognitivas e diminuição dos níveis de estresse. Eles também observaram que depois de um exercício, o cérebro é ativado em múltiplas áreas, devido à liberação de endorfina, dopamina e triptofano que ajuda na produção da serotonina”, explica.

Síndrome de Burnout

Também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional, a Síndrome de Burnout é um fenômeno resultante de um estresse crônico no trabalho, que impacta negativamente na saúde mental do profissional e em sua produção laboral. Do inglês, burnout significa “queima por inteiro”, remetendo à exaustão física e emocional do profissional.

“A Síndrome de Burnout é caracterizada pela exaustão emocional, distanciamento das relações pessoais (despersonalização) e diminuição do sentimento de realização pessoal. Os sintomas observados são: exaustão emocional e física, irritação, ansiedade, tristeza, apatia, desânimo, falta de interesse, alteração do sono e apetite e dores”, explica a psicóloga do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Natália Novaes Pavani Araújo.

Segundo ela, além do sofrimento psíquico e físico do profissional que sofre da Síndrome de Burnout, estudos apontam para o risco de abuso do uso de álcool, drogas ilícitas e medicamentos, bem como ao risco de problemas familiares e conflitos sociais.

“Os índices elevados de absenteísmo, prejuízo da qualidade do trabalho, afastamentos e acidentes de trabalho também são os impactos observados nas instituições”, relata.

Para o psicólogo da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, Caio Viana, profissionais como policiais, professores, profissionais de saúde estão entre os mais acometidos pela Síndrome de Burnout.

“Hoje em dia, percebemos que as pessoas têm vivenciado a Síndrome de Burnout quando convivem com chefias inadequadas, carga horária de trabalho estressante, especialmente em funções que demandam muito do físico ou intelectual, entre outros”, diz.

Segundo Viana, o tratamento contempla desde o apoio familiar até o acompanhamento psicoterapêutico, psiquiátrico com prescrição de medicamentos.

Além das alterações neurológicas que a atividade física é capaz de causar atuando como um antidepressivo natural, há ainda a elevação da frequência cardíaca e o fortalecimento muscular que garantem maior energia e resistência durante as tarefas do dia.

“Atividades realizadas em grupo ainda agregam o fator social, melhorando a interação com outras pessoas e diminuindo o isolamento e solidão que, muitas vezes, agravam casos depressivos. Os exercícios que desenvolvem a coordenação intramuscular aumentam a frequência cardíaca e, com os desafios que sejam possíveis de realizar, são os mais indicados para pessoas que buscam reduzir níveis de estresse e ansiedade”, comenta.

Foto: Shutterstock

Hilab está permitido

Edição 321 - 2019-08-08 Hilab está permitido

Essa matéria faz parte da Edição 321 da Revista Guia da Farmácia.