Farmácias brasileiras investem em crescimento agressivo

Com desempenho acima da média mundial, varejo farmacêutico brasileiro investe em ousadas estratégias de progresso

Há mais de dez anos, o varejo farmacêutico brasileiro apresenta índices de crescimento invejáveis. No ano passado, não foi diferente. Enquanto a inflação oficial no Brasil fechou o ano na casa do 6,4%, o setor de farmácias e drogarias apresentou crescimento nominal de 9,6%, de acordo com números da Nielsen.

As grandes redes são o canal que mais impulsiona esse bom desempenho, com 15%, em média, de evolução entre 2013 e 2014, segundo a Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), que concentra menos de 10% das cerca de 68 mil farmácias em funcionamento no País.

Caso os resultados sigam no mesmo patamar nos próximos anos, a expectativa é de que, até 2018, o Brasil passe de 6º para 4º maior mercado farmacêutico no mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China e Japão, estimam as projeções do IMS Health. O otimismo pode ser explicado por uma conjunção de fatores que, quando combinados, transformam o mercado farmacêutico brasileiro em uma potência.

O mais notório desses movimentos combinados é o envelhecimento da população. Durante anos, o Brasil foi composto em maioria por crianças e jovens, mas, agora, a situação começa a se inverter. Desde 2004, a faixa da população que mais cresceu está situada entre os 30 e 80 anos, enquanto a quantidade de cidadãos com menos de 24 anos caiu.
Até 2060, o número de brasileiros acima de 65 anos deve quadruplicar. Segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população com essa faixa etária deve passar de 14,9 milhões (7,4% do total), em 2013, para 58,4 milhões (26,7% do total), em 2060. A consequência será que cada grupo de cem indivíduos em idade ativa sustentará 65,9 indivíduos.

Essa mudança na pirâmide etária ocorrerá principalmente devido ao aumento da expectativa de vida do brasileiro, à queda na taxa de fecundidade e aos avanços da medicina. O resultado é que, com um maior número de idosos, o consumo de medicamentos, principalmente aqueles de uso contínuo, deve crescer exponencialmente.

Os produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (HPC) também passam por um momento positivo dentro do País. O ganho de renda dos brasileiros nos últimos anos fez crescer o consumo de certas categorias. Segundo o IMS Health, 34% das vendas das farmácias vêm de não medicamentos. E mesmo com o crescimento da inflação, do endividamento e de outros tropeços da economia, esses novos consumidores não se mostram dispostos a recuar.

De acordo com o coordenador de atendimento ao varejo da Nielsen, Carlos Gouveia, esse resultado foi possível, pois a cesta de produtos de higiene e beleza é a última em que o consumidor corta gastos, quando a situação financeira vai mal. “Ele prefere cortar primeiro os supérfluos e até mesmo diminuir gastos com alimentação.”
Este comportamento é observado em todos os tempos de crise financeira. Em momentos críticos, o consumidor reduz os gastos com itens de alto valor agregado e aumenta o consumo daqueles ligados a cuidados pessoais, como forma de indulgência.

Consequências oriundas

Essa conjunção de fatores positivos para as vendas das farmácias e drogarias fez acender o interesse de empresários de todo o mundo no mercado brasileiro. As primeiras movimentações ocorreram internamente na forma de fusões e aquisições. Segundo o ranking do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo & Mercado de Consumo de 2014 (Ibevar 2014), que lista as 120 maiores do varejo brasileiro, no segmento de drogarias e perfumarias, há oito redes com faturamento na casa do bilhão.

O ano de 2011 foi um marco para as mudanças que estariam por vir, com a fusão da Droga Raia e Drogasil e, logo depois, Drogaria São Paulo e Pacheco. As duas uniões se provaram certeiras e fizeram o mercado estrangeiro passar a olhar para o varejo brasileiro com maior interesse. No ano de 2014, o grupo DPSP obteve um faturamento estimado em R$ 6,4 bilhões. A Raia Drogasil teve um desempenho ainda melhor, com R$ 7,38 bilhões.

A expansão agressiva do número de lojas é a principal estratégia dessas potências do varejo. Somente no ano passado, a Raia Drogasil realizou a abertura de 130 novas lojas, com operações em 17 estados da Federação, incluindo o ingresso em cinco novos mercados. Ao todo, a rede já soma mais de mil pontos de venda. O crescimento das lojas em operação a mais de um ano representou 10,9%, enquanto nas lojas maduras (aquelas com mais de três anos em operação), o incremento foi de 6,1%.
“Tivemos um trimestre excepcional, e estamos muito satisfeitos com o nosso desempenho no ano como um todo. Concluímos a integração de todos os nossos sistemas corporativos em fevereiro passado, e este é o primeiro ano em que operamos de forma efetivamente integrada, podendo colher os benefícios da fusão que originou a Raia Drogasil. Pudemos compartilhar os ativos e competências de Droga Raia e de Drogasil, gerando ganhos de produtividade e, sobretudo, melhorando a experiência de compra dos nossos clientes”, destaca o presidente da companhia, Marcilio Pousada.

Tendência de movimentos

Outra companhia com postura agressiva quando se trata de expansão é a Pague Menos. De origem nordestina, hoje ela é a única presente em todos os 26 estados e no Distrito Federal. Entre as metas que foram cumpridas no ano passado, estava o crescimento de 18%, com a abertura de 90 novas unidades.

“O volume de lojas é um dos principais vetores de crescimento da empresa. A abertura de pontos de vendas, juntamente com o crescimento das mesmas unidades, se mantém na base de 10% ao ano. Esses são os veículos de crescimento da companhia”, destaca o responsável pela área de planejamento e relações com investidores das Farmácias Pague Menos,
Eduardo Dias.

Para sustentar tal ritmo de crescimento, a companhia busca manter uma forte liderança do time e boa gestão de processos, principalmente na área de tecnologia e de operações em loja. “Ainda contamos com o apoio do Instituto Áquila em relação à metodologia de gestão. Esses três pilares dão sustentação à alavancagem operacional da empresa à medida que aumentamos o ritmo de vendas e número de lojas”, conta Dias.

Entre os recursos disponíveis, estão plataformas de geomarketing cujas informações permitem uma série de análises sobre o comportamento do shopper e de suas necessidades, bem como o perfil dos concorrentes em relação a preço, mix e posicionamento. Além disso, uma equipe de campo realiza análises qualitativas do ambiente.
Em proporções menores, outras redes também estão buscando se unir para ter mais potencial de crescimento, principalmente no volume de lojas em funcionamento. Em 2013, a Profarma comprou as redes cariocas Drogasmil e Farmalife e, além da abertura de novas unidades, investiu no remodelamento das unidades, o que resultou em um aumento de 20%
no faturamento.

A Panvel também trabalha em ritmo acelerado de expansão e tem um número expressivo de lojas, considerando que atua somente na região Sul. Em 2014, eram 321 pontos de venda, responsáveis por 67% do faturamento do grupo gaúcho Dimed. Das vendas, 35% vêm de itens de beleza, com 20% do total de artigos de marca própria.

Chegada internacional

Há dois anos, deu-se a primeira invasão estrangeira no território das gigantes do varejo farmacêutico brasileiro. A norte-americana CVS adquiriu o controle da rede de drogarias Onofre, a oitava maior do País em receita. A operação envolveu a venda de 80% das ações da Onofre, fundada pela família Arede, por R$ 600 milhões. A quantia incluiria as dívidas da companhia, referentes a passivos tributários. As empresas não confirmam o valor do negócio. O anúncio foi feito durante a divulgação dos resultados trimestrais da CVS.

Desde então, a rede americana tenta implementar uma nova fase na Drogaria Onofre. A estratégia de expansão da marca envolve a ampliação de oferta de medicamentos a custos competitivos. Com a inauguração de uma unidade no bairro paulistano do Itaim, em dezembro de 2014, a rede fechou o ano com 47 lojas nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo e Rio Grande do Sul. A unidade reúne um portfólio diversificado de saúde e bem-estar e contará com mais de 100 m² e 12 funcionários, entre eles 3 farmacêuticos à disposição para uma atenção personalizada.

Especulações do mercado financeiro mostram que, estabelecidas as diretrizes para o crescimento da Onofre, o grupo estrangeiro começou a traçar planos mais ambiciosos, que envolvem a compra do grupo São Paulo Pacheco. Segundo analistas, três propostas já teriam sido feitas, sendo a mais recente delas costurada ao redor de cifras superiores a R$ 6 bilhões, todas recusadas pelo sócio controlador do grupo e responsável pela gestão da rede carioca Pacheco, Samuel Barata.

onofre

A rede de drogarias Onofre teve seu controle adquirido pela norte-americana CVS

Projeção com conteúdo

Talvez pela ameaça de invasão das gigantes estrangeiras, se observa que, apesar de agressiva, a estratégia de crescimento é calculada e inclui lojas que apresentem diferenciais em relação à concorrência. Uma das tendências que deve crescer, em 2015, é a abertura de pontos de venda preparados para prestar serviços de atenção farmacêutica, que envolvem revisão de medicação, sistema de dispensação personalizada, programas de tratamento e atendimentos ambulatoriais, como imunização, nebulização e testes de saúde.


A Abrafarma já começou a dar os primeiros passos para preparar as redes filiadas. Em julho de 2014, a entidade iniciou um trabalho que envolve a elaboração de manuais, reuniões com grupos de especialistas e a capacitação de farmacêuticos. Neste ano, ocorrerá a implantação de serviços em lojas-piloto, o monitoramento dos resultados e o desenvolvimento final do modelo de negócios.

As diretrizes da Abrafarma ainda não foram definidas, mas as Farmácias Pague Menos já iniciaram a ampliação dos serviços de assistência farmacêutica. No segundo semestre de 2014, a rede implantou o Clinic Farma, serviço que dispõe de uma sala de atenção farmacêutica, que já está disponível em cinco unidades da rede e deve ser alvo de rápida expansão. O sistema começou a funcionar na unidade junto à matriz, em Fortaleza (CE), e a intenção é chegar a, no mínimo, uma loja em cada capital brasileira em 2015.

Autor: Flávia Carbó

Público feminino

Edição 267 - 2015-02-01 Público feminino

Essa matéria faz parte da Edição 267 da Revista Guia da Farmácia.

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