Incapacitante e reincidente

Muitas vezes, é quase impossível identificar as reais causas das intensas dores de cabeça, mas elas ocorrem devido a múltiplos processos do organismo. Durante as crises, há alterações tanto vasculares quanto em vias neurais 

Prevalente em todo o mundo, a dor de cabeça, ou cefaleia, tem mais de 180 modalidades diferentes, reconhecidas pela Sociedade Internacional de Cefaleia (IHS, na sigla em inglês), podendo ser divididas em primárias, secundárias ou nevralgias cranianas.

As mulheres são as que mais sofrem com o problema, estima-se que 76% delas tenham pelo menos um episódio registrado por mês e 99% sofrerão de dor de cabeça ao longo da vida, sendo mais frequente na faixa dos 18 aos 34 anos de idade.

O que todos esperam é o alívio imediato e eficaz, sem reincidência da dor. Isso justifica o grande consumo de analgésicos isentos de prescrição, mas alguns cuidados são primordiais, já que muitas vezes a ingestão de analgésicos pode mascarar ou desencadear outros tipos de doenças e até mesmo provocar o efeito contrário, quando o medicamento deixa de agir contra a dor, causando-a.

Tipos mais frequentes

As cefaleias primárias são aquelas causadas por distúrbios bioquímicos do próprio cérebro, que levam à dor por mau funcionamento de neurotransmissores e/ou receptores. Há dois tipos principais e mais frequentes: a dor de cabeça do tipo tensional (episódica ou crônica) e a enxaqueca (com ou sem aura). Segundo informa o departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), destaca-se ainda a dor de cabeça em salvas, que apesar de não ser frequente, é intensa e causa grande interferência na qualidade de vida dos pacientes. Já as secundárias são sintomas de uma doença e podem ocorrer devido a um simples resfriado, sinusite ou estarem associadas a infecções ou doenças mais graves.

Ramificações da dor

Há mais de 150 tipos de dores de cabeça, veja a descrição por grupos:

• Cefaleias primárias (sem lesão estrutural): enxaqueca, cefaleia do tipo tensional, cefaleia em salvas.

• Cefaleias secundárias: cefaleia por traumatismo craniano, cefaleia em decorrência de acidentes vasculares cerebrais, cefaleia devido a alterações na pressão arterial, cefaleia por excesso ou abstinência de substância, cefaleia por infecções, cefaleia por alterações da face, pescoço, olhos, cefaleia devido a transtorno psiquiátricos, cefaleia por alterações metabólicas, cefaleia por hipertensão e hipotensão intracraniana.

• Cefaleias das nevralgias: nevralgia do trigêmeo (síndrome da dor facial).

Elas são divididas também por graus de intensidade:

• Grau 1: não atrapalha a vida do indivíduo.

• Grau 2: atrapalha a vida do indivíduo.

• Grau 3: incapacita o indivíduo.

Curiosidade

• Tensional: é a mais comum em toda a população. Esse tipo de dor está relacionada à tensão ou contração exagerada, anormal e mantida de grupos musculares dos ombros, pescoço, couro cabeludo e até face.

Geralmente, é desencadeada pelo estresse ou cansaço, a dor de cabeça do tipo tensional tem uma prevalência de 65% a 87%, sendo mais comum em mulheres entre 20 e 50 anos de idade. Fatores como estresse, excesso de trabalho e esforço muscular podem agravá-la. A dor pode ser em peso ou pressão, de leve à moderada, não impedindo as atividades rotineiras. Pode vir acompanhada de sensibilidade à luz ou a ruídos. Acontece, normalmente, nos dois lados da cabeça, podendo durar até uma semana.

O tratamento começa com a eliminação da tensão ou corrigindo problemas físicos que estão causando as dores. Nesses casos, os analgésicos comuns podem ser usados, porém, seu uso não pode exceder a dez dias consecutivos. Não havendo melhora, ou havendo piora do quadro, o paciente deve procurar um médico.

Podem ainda ser episódicas ou crônicas. As cefaleias crônicas ocorrem, em média, 15 ou mais dias por mês, acima de três meses, ou seja, algo como 180 dias de dor ao ano ou mais.

• Enxaqueca: uma doença do cérebro, transmitida e herdada geneticamente, cuja prevalência é de 12% a 15%, em geral, entre mulheres de 20 a 40 anos.

As crises podem ser desencadeadas pelo estresse, menstruação, determinados alimentos, álcool, mudanças de tempo, luz e cheiros. Movimentos como balançar e abaixar a cabeça e esforços físicos podem agravar as dores. É comum a pessoa com enxaqueca sentir dor pulsátil e ficar incapacitada para atividades de rotina. Além da dor, o paciente costuma sentir náusea – às vezes chega a provocar vômitos – e maior sensibilidade à luz, aos ruídos e cheiros. Ela pode ser sem ou com aura.

• Em salvas: não tão frequente, sentida só de um lado da cabeça e muito intensa, a dor de cabeça em salvas tem prevalência de 0,1% a 0,4%, geralmente em homens entre 20 e 40 anos. A dor pode durar de 15 minutos a três horas, se não tratada. As crises podem acontecer com frequência de uma (a cada dois dias), até oito por dia. Olho vermelho, lacrimejamento, congestão e corrimento nasal, suor facial, contração da pupila, queda e/ou edema da pálpebra do mesmo lado da dor são os principais sintomas durante a crise. O consumo de álcool pode ser um fator desencadeante. Deitar-se pode agravar sua intensidade.

Os especialistas dizem que a maioria dos diagnósticos são clínicos, mas na persistência e se necessário, cabe solicitação de exames de imagem.

Fontes: Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

 

Enxaqueca, um capítulo à parte

O processo da crise começa basicamente com a liberação de substâncias inflamatórias e intensidade de estímulos elétricos do cérebro, causando a dilatação dos vasos sanguíneos, responsável pela intensidade da cefaleia. Apesar da eficácia associada a um arsenal terapêutico disponível para o tratamento da enxaqueca, uma grande parte dos pacientes não fica sem dor.

De acordo com o neurologista pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Dr. Antônio Eduardo Damin, os medicamentos para crise devem atuar nos dois fatores desencadeantes, os neurais e vasculares. 

“O paciente pode fazer um tratamento com princípios ativos, como a sumatriptana, que vai tratar a vasodilatação, e o naproxeno, que trata a inflamação. Hoje, ele consegue encontrar essas duas substâncias em um único comprimido, mas que agem de forma sinérgica. Quando combinado, o tratamento precisa resolver os reais fatores que levam à dor”, destaca o doutor.

As enxaquecas manifestam-se em crises recorrentes e atrapalham tanto a vida dos pacientes, que são responsáveis por abstinência no trabalho e queda da produtividade. Estima-se que 1,4% do total de anos de vida saudável dos pacientes afetados é interrompido pelas fortes dores de cabeça. Ao considerar a expectativa de vida dos brasileiros de 75 anos de idade, essa estatística corresponde a pouco mais de um ano dentro de um quarto escuro e longe do convívio social. De acordo com a Sociedade Brasileira de Cefaleia (SBCE), a enxaqueca acomete mais de 30 milhões de brasileiros e é responsável por 35% das consultas neurológicas no País. A prevalência ao longo da vida pode chegar a 43% das mulheres e 18% dos homens. Apesar disso, metade dos pacientes permanece sem diagnóstico.

Mesmo entre aqueles em tratamento para o problema, 30% voltam a sentir o incomodo nas primeiras 24 horas da crise, o que os médicos chamam de recorrência. E esse retorno da dor retira a pessoa mais uma vez do convívio social, trazendo sensação de impotência, perda de momentos importantes e até mesmo perda de controle sobre si mesma e sobre sua vida.

A enxaqueca não é uma simples dor de cabeça, é um caso muito mais sério do que se imagina e pode trazer graves consequências para quem sofre com a doença. Nos momentos de crise, o paciente entra em desespero, como se deixasse de ter o controle da própria vida. Pode perder momentos especiais da vida, como aniversários de pessoas queridas, entrevistas de trabalho, reuniões familiares, entre outros. De acordo com uma recente pesquisa realizada na fan page Enxaqueca Não, apoiada pela Libbs Farmacêutica, dedicada a ajudar o paciente na relação com a doença e que conta com mais de 300 mil seguidores, entre as queixas mais citadas estão viagens e momentos marcantes da vida, como o nascimento de um filho.

Ramificações da enxaqueca

Sem aura

A enxaqueca sem aura apresenta pelo menos cinco crises, com duração de quatro a 72 horas (quando não tratadas ou tratadas sem melhora). Possui pelo menos duas das seguintes características:

• Localização unilateral;

• Caráter pulsátil;

• Intensidade moderada ou grave (interferindo ou incapacitando para as atividades diárias);

• Agravamento ao subir degraus ou realizar atividade física equivalente.

Durante as crises, presença de pelo menos uma das seguintes manifestações:

• Náuseas e/ou vômitos;

• Fotofobia (sensibilidade à luz) e fonofobia (sensibilidade ao som).

Com aura

É a mais comum entre as pessoas que sofrem de enxaqueca. Não está relacionada a nenhum outro distúrbio, mas pode ocorrer um tipo de “premonição” horas ou dias antes de uma crise, com bocejos, alterações de humor, dificuldade de raciocínio, inchaço em alguma parte do corpo, vontade inexplicável de comer certos alimentos (particularmente doces) e cansaço.

A aura caracteriza-se por fenômenos sensoriais temporários, como cegueira parcial, visão de pontos luminosos, que brilham e piscam, podendo assumir formas em ziguezague; podem permanecer estáticos ou mover-se, como começar no canto da visão, ou no centro, expandindo-se. Podendo afetar um ou ambos os olhos.

Outros fenômenos, além dos visuais, podem constituir aura de enxaqueca, como a paralisia do movimento ocular, formigamento (na cabeça, nos lábios, na língua, nos braços, no corpo); paralisia parcial (em poucos casos); dificuldade em falar, ouvir, barulho no ouvido, existindo até um tipo que se acompanha de perda de consciência ou alucinações.

Fonte: Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

Como evitar as dores de cabeça

Algumas dicas podem ajudar a prevenir dores de cabeça nos pacientes, como:

• Ter uma boa noite de sono;

• Manter uma alimentação equilibrada;

• Evitar o uso abusivo de álcool e café;

• Praticar atividade física regularmente;

• Relaxar no meio do expediente;

• Evitar situações estressantes;

• Descansar os olhos;

• Evitar o uso exagerado de fones de ouvido em tom excessivo.

 

O farmacêutico e os tratamentos

Os pacientes buscam o diagnóstico e medicamentos que possam aliviar as dores, sem efeitos colaterais, como os que agridam o estômago.

Existem diferentes classes de analgésicos que tratam as dores de cabeça, em suas diversas ocorrências. Os isentos de prescrição, em geral, integram a classe dos Anti-Inflamatórios Não Esteroides (AINEs), e são voltados para o alívio das dores tensionais. Para o alívio das dores crônicas, participam outras classes terapêuticas.

Os principais analgésicos isentos de prescrição comercializados no mercado brasileiro são ibuprofeno, paracetamol, ácido acetilsalicílico e dipirona.

De acordo com dados da Sociedade Brasileira de Reumatologia, em pacientes portadores de enxaqueca, o uso de analgésicos em excesso pode favorecer o efeito rebote, quando o organismo, no lugar de responder ao tratamento, aliviando a dor, responde gerando dor.

A Atenção Farmacêutica prestada em farmácias e drogarias tem grande importância no tratamento, já que normalmente a maioria dos pacientes compra os analgésicos isentos por livre escolha.

Em relação aos Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs), é importante observar os cuidados descritos em bula, bem como, se há alergia ou sensibilidade a algum componente da fórmula.

Diferenças entre analgésicos

• Ibuprofeno: utilizado para alívio das dores leves a moderadas. Sua ação inicia-se de dez a 30 minutos após a administração e possui duração de seis a oito horas.

• Ácido acetilsalicílico: proporciona o alívio sintomático de dores de intensidade leve a moderada, e de febre nos resfriados e gripe. Sua ação inicia-se 20 minutos após ser ingerido e tem duração de seis horas. 

É contraindicado em caso de suspeita de dengue ou em uso de outros anticoagulantes.

• Dipirona sódica: tem ação analgésica para alívio de dores leves a moderadas sendo também indicada para febres. A ação analgésica dura em média seis a oito horas e tem início após 20 a 30 minutos da administração do medicamento.

• Paracetamol: promove o alívio de dores leves a moderadas, mas não possui ação anti-inflamatória significativa. O analgésico tem duração de seis a oito horas. Os pacientes que utilizam de forma exagerada álcool ou que sejam portadores de doenças hepáticas agudas ou crônicas devem ter cautela em sua utilização.

Fonte: Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR)

Autor: Lígia Favoretto

Mercado ilegal de medicamentos

Edição 275 - 2015-10-01 Mercado ilegal de medicamentos

Essa matéria faz parte da Edição 275 da Revista Guia da Farmácia.

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