Ter dificuldade para ir ao banheiro é um fantasma que já assombrou muitas pessoas em alguma época da vida. Enquanto alguns pacientes sofrem desse mal em situações específicas, como viagens ou estar fora de casa, outros se queixam regularmente e devem mudar alguns hábitos de vida.
Mas para isso, é preciso entender quais os impulsionadores do incômodo. O intestino pode ser afetado por diferentes causas, como má alimentação, estresse e sedentarismo. É esta descoberta que inicia o tratamento e a resolução de um problema com diversos nomes: constipação, prisão de ventre, obstipação ou intestino preso são nada mais do que a doença que impede o paciente de ir ao banheiro tranquilamente.
“A constipação é uma condição de causa mais frequentemente multifatorial. Estão envolvidos fatores genéticos, anatômicos, fisiológicos, bioquímicos e hormonais (serotonina intestinal); hábitos alimentares; imobilidade física [por idade avançada, sequela de Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou traumas ortopédicos]; sedentarismo; uso de medicamentos cujo efeito colateral seja obstipação; doenças específicas (por exemplo, megacólon ou Doença de Chagas); lesões do períneo em mulheres, após fórcipe ou parto prolongado; retenção espontânea por não aceitar sanitário fora do domicílio; e diversas outras causas menos frequentes”, comenta o coordenador do Centro de Coloproctologia do Hospital Samaritano Higienópolis, Dr. Alexandre Fonoff.
Contra a prisão de ventre
Além da alimentação e dos exercícios físicos, a indústria farmacêutica foi capaz de desenvolver produtos que ajudam a diminuir ou acabar com a constipação intestinal. As fibras, os probióticos, prebióticos e os simbióticos facilitam a vida dos pacientes não somente no tratamento, mas na prevenção da patologia.
Probióticos: são produtos ou alimentos com alta concentração de lactobacilos e bifidobactérias, bactérias intestinais que aceleram o peristaltismo intestinal, ajudando a propulsão das fezes ao reto.
Prebióticos: são carboidratos específicos que alimentam as bactérias probióticas e aumentam a sua função.
Simbióticos: associam probióticos aos prebióticos, regulando o peristaltismo intestinal, além de ajudar no incremento de bactérias benéficas, com consequente diminuição das bactérias patogênicas.
Fonte: urologista do Núcleo de Urologia do Hospital Vitória, Dr. Fernando Saito
Tantos impulsionadores do problema fazem com que a constipação seja um incômodo comum a muita gente. Em torno de 15% da população se queixa, com aumento significativo da idade, chegando a 50% das pessoas a partir dos 60 a 65 anos. Além disso, existe uma predominância feminina entre os acometidos.
Isso acontece porque a variação das concentrações dos hormônios femininos no sangue, no período perto da menopausa e, também, na menopausa, dificulta o funcionamento normal do intestino.
Para diagnosticar a doença, são precisos alguns sintomas. De acordo com cirurgião do aparelho digestivo do Hospital Sírio-Libanês, Dr. Oswaldo Willian Marques Junior, o diagnóstico é baseado em dois ou mais critérios em 25% das ocorrências, ou seja, ao menos três meses de sintomas nos últimos seis meses.
Em resumo, o paciente tem de fazer esforço durante a evacuação, fezes endurecidas, sensação de esvaziação incompleta, sensação de bloqueio retal, ter de fazer manobras para evacuação e uma frequência menor do que três vezes por semana. “Existem pessoas que vão a cada quatro dias ao banheiro e são pacientes normais. Não dá para conceituar apenas isso como a constipação”, revela.
A importância da alimentação
Quando não há uma doença específica que causa a constipação, a alimentação inadequada costuma ser a grande responsável, seja como causa principal, seja como causa secundária e somadora no resultado final.
O Dr. Fonoff explica que a dieta balanceada se refere ao fornecimento de nutrientes (gorduras, proteínas e carboidratos), vitaminas, sais minerais, água e fibras vegetais de forma equilibrada e saudável, tanto para a função intestinal quanto para a prevenção de doenças cardiovasculares, metabólicas e de alguns tipos de câncer.
A primeira orientação para não sofrer com o problema é ter uma alimentação rica em fibras. “É recomendado o consumo entre 20 g a 30 g por dia. Frutas, vegetais, legumes, carboidratos integrais contêm fibras. O paciente pode acrescentar, também, cereal matinal e farelo de trigo, que são fontes ricas de fibras. Por outro lado, há pacientes que exageram, chegando a comer entre 40 g e 50 g, o que pode causar mais sintomas, principalmente gases”, explica o Dr. Junior.
É necessário, também, beber ao menos oito copos de 240 mL água ou outros líquidos saudáveis por dia. Tomar chá quente 30 minutos antes de ir ao banheiro ajuda a deixar as fezes não tão duras. Comer devagar, mastigar muito bem os alimentos e evitar o consumo de sal e carboidratos de rápida absorção (como o pão branco e a farinha branca) são dicas que ajudam.
“Os vilões são os alimentos muito pobres em fibras vegetais, que normalmente passam por industrialização, refinação, descoloração ou coloração e associação de conservantes. Especial atenção para junk foods – alimentos e bebidas cuja concentração de quatro substâncias muito refinadas, como sal, açúcar, farinha de trigo e óleo vegetal (incluindo frituras), é bastante alta”, complementa o coordenador do Hospital Samaritano Higienópolis.
Batalha de alimentos
Como a reeducação alimentar é o primeiro passo para quem quer se livrar da constipação intestinal, é necessário entender quais são as comidas indicadas ou a ser evitadas por quem sofre do problema.
Alimentos vilões
• Excesso de sal.
• Carboidratos de rápida absorção (pão branco e farinha branca).
• Excesso de fibras.
• Junk food.
• Gorduras.
Alimentos que salvam
• Frutas como: laranja, mexerica, mamão, banana nanica, ameixa preta, abacaxi, abacate, acerola.
• Carboidratos integrais.
• Água.
• Sucos frescos naturais.
Fonte: cirurgião do aparelho digestivo do Hospital Sírio-Libanês, Dr. Oswaldo Willian Marques Junior
O principal aliado da boa alimentação é a prática de exercícios físicos. Qualquer tipo de movimento é melhor do que estar no total sedentarismo. Subir escadas, descer um ponto de ônibus antes do que o normal, levar o cachorro para passear, são pequenas ações que ajudam o corpo a ser mais saudável.
Nos casos onde a reeducação alimentar e a prática de atividades físicas não são o suficiente, o paciente deve associar medicamentos a terapias específicas. Entre os mais utilizados e indicados, estão os laxativos, os probióticos, os procinéticos (que aumentam o peristaltismo intestinal) e as fibras vegetais sintéticas.
De acordo com o Manual produzido pela MSD (subsidiária da Merck), existem cinco tipos de laxantes no mercado:
Agentes formadores de volume: agem lentamente, criando uma massa fecal macia. São um dos mais seguros para promover a eliminação das fezes e devem ser usados com aumento progressivo da dose para prevenir a impactação.
Agentes osmóticos: contêm íons polivantes pouco absorvidos, polímeros ou carboidratos que permanecem no intestino, aumentando a pressão osmótica intraluminal e, consequentemente, escoando água para o intestino. O volume aumentado estimula o peristaltismo, funcionando em cerca de três horas.
Catárticos estimulantes ou secretórios: atuam irritando a mucosa intestinal ou estimulando diretamente a submucosa e o plexo mioentérico.
Enemas: podem ser usados incluindo água da torneira e soluções hipertônicas preparadas comercialmente.
Agentes emolientes: atuam lentamente para amolecer as fezes, facilitando a sua passagem. Porém, não são potentes estimuladores da evacuação.
“Existem fisioterapias para a região perineal que melhoram casos de obstipação distal (obstrução de saída) e cirurgias corretivas na região retal para defeitos adquiridos após alguns tipos de parto ou alterações pelo esforço crônico para evacuar”, frisa o Dr. Fonoff.
O lado emocional do intestino
O medo e a vergonha de ir ao banheiro fora de casa são, também, grandes responsáveis pela prisão de ventre. De acordo com a coloproctologista do Centro de Coloproctologia do Hospital Samaritano, Dra. Helly Angela Caram Aguida, os educadores têm grande influência nesse amedrontamento.
O problema começa desde pequeno, quando as crianças (principalmente meninas) são ensinadas que a evacuação é algo vergonhoso, que não pode fazer barulho ou ter cheiro, para que as outras pessoas não saibam o que se está fazendo.
Quando a pessoa é ensinada que só pode ir ao banheiro dentro de casa e segura a vontade em lugares públicos, as fezes acabam desidratadas. “As fezes chegam ao reto e não podem ser evacuadas. O intestino grosso tem a função de formar o bolo fecal e ressecá-lo, para que não haja diarreia. Então, o intestino continua retendo líquido, ressecando as fezes. Além disso, o reto se contrai e manda o conteúdo um pouco mais para cima, em uma região onde não há percepção da evacuação, então a pessoa perde a vontade. As fezes só voltarão ao reto junto com um novo bolo fecal, mas estarão ressecadas e maiores, dificultando a evacuação”, alerta a especialista.
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