O poder das compras por impulso

Seja para suprir ou até mesmo antecipar uma necessidade, as vendas não programadas contribuem significamente para o incremento da lucratividade de uma farmácia 

No ponto de venda (PDV), a chance de uma mulher solteira, que mora sozinha, comprar uma loção pós-barba é praticamente nula, assim como a de um homem, também solteiro, comprar absorventes. A constatação não requer maiores estudos e é simples: não há necessidade, e nenhum apelo de vendas, promoção ou algo do gênero impulsionará seu consumo.

As situações descritas apenas exemplificam o que defende o sócio fundador do Instituto Brasileiro de Vendas (IBVendas), Mário Rodrigues, de que “ninguém compra o que não precisa”, e que cabe ao vendedor, por meio de inteligência emocional e empatia, por exemplo, ativar essas necessidades quando realmente existe o potencial de compra para oferecer a solução da empresa. Seu sócio, Carlos Cruz, vai além e explica que saber fazer as perguntas certas no ato da venda, de modo a entender o processo de compras, garantirá o sucesso e aumento do tíquete médio.

“Como dizia Adam Smith, considerado o pai da economia moderna, ‘nossas necessidades são infinitas, os recursos é que são escassos’, e por isso é fundamental que o vendedor atue como um consultor de negócios, potencializando essas necessidades”, explica Cruz. “Elas podem ser ativadas – como é o caso de uma dor de cabeça, que o obriga a comprar um analgésico, ou preventivas e de segurança, de modo a antecipar uma suposta precisão”, diz.

Experiência de compra

Um estudo realizado pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), no primeiro semestre de 2015, apontou que 53% dos consumidores brasileiros realizaram pelo menos uma compra por impulso nos últimos meses, sendo que o percentual é maior entre as mulheres (57%) e consumidores da classe A e B (61%). As promoções atraíram 51% dos consumidores, seguidas por preço atrativo (31%), características do produto, como funcionalidade e beleza (6%), além de facilidade de pagamento (4%), também incentivam compras não planejadas.

A venda por impulso funciona, e bem, quando está alinhada à estratégia do varejista. “Em linhas gerais, ele conhece o seu cliente, sabe quem ele quer atrair e tem clareza de quais produtos este cliente não compra nem em sua loja nem na concorrência”, defende o consultor na área de Inteligência em Varejo, Olegário Araújo. “Podemos dizer que o varejista sabe o que fazer para aumentar o tíquete médio com rentabilidade, por meio de uma estratégia sustentável, pois sabe que o cliente está cada vez mais bem informado e exigente, e tem diante de si mais opções e menos tempo, e tudo o que lhe for ofertado deve ser para facilitar o processo de compra, antecipando necessidades”, diz.

Cross-merchandising

Há fatores que agregam nas compras por impulso, como é o caso de um bom merchandising, muito utilizado para impulsionar as aquisições não programadas e aumentar as oportunidades de vendas. Tanto o visual como o cross-merchandising devem ser valorizados pelo varejista, pois uma loja bem organizada, iluminada, em que a disposição dos produtos induz ao consumo, e onde os produtos correlatos e complementares seguem uma sequência lógica de utilização, são bem-vistas aos olhos do shopper.

“Cross vem de cruzar, logo, trata-se de desencadear uma venda cruzada ou simplesmente lembrar o consumidor daquele item complementar. Se você coloca um produto correlato próximo do outro que fazia parte da intenção de compra do cliente, em um ponto extra, está estimulando-o a uma nova compra. A técnica alavanca as vendas por impulso de estímulo e associação. Esse é o objetivo principal de sua aplicação”, explica a diretora da Connect Shopper e consultora de varejo e shopper marketing, Fátima Merlin. “Pensando nisso, o canal farma deve refletir novas formas de exposição, principalmente de Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs), já que muitos clientes reclamam que estes produtos são mal sinalizados, desorganizados, o que dificulta a compra”, lembra Fátima.

Desse modo, ao facilitar a experiência de compra, reorganizando a exposição e colocando os produtos para cada necessidade agrupados, os reflexos sobre a lucratividade da loja ficam mais latentes. “O cliente percebe que o sortimento da loja é variado, mas está organizado e acessível”, complementa Araújo. “Uma ideia é selecionar duas grandes categorias – a que vende mais e a que vende menos – de modo a reforçar o posicionamento da loja no primeiro caso, e apresentar outras possibilidades no segundo.” O consultor lembra, ainda, a importância de comunicar ao cliente mudanças de layout, já que alguns clientes realizam suas compras no “piloto automático”, ou seja, já sabem onde os produtos estão, em qual gôndola, corredor, etc. e quando não os encontram, podem ficar confusos e até mesmo desistir da compra.

Para a gerente de operações da Allis, que atua na área de Inteligência em Varejo, Mariana Fagundes, o varejo sempre está em busca de vendas incrementais – é a filosofia do R$ 1,00 a mais. “Se em uma visita ao PDV a atenção do cliente for capturada por uma boa exposição ou promoção e isto fizer com que ele compre, a missão do merchandising foi cumprida”, analisa. “As farmácias no Brasil vêm se modificando com o tempo e já não são mais pontos apenas de compras de medicamentos. A diversificação do sortimento faz com que outras categorias se tornem destino, como artigos para bebês e dermocosméticos, e com isto os varejistas sempre buscam novidades para aumentar o fluxo nas lojas e consequentemente as vendas”, conclui.

Entre as categorias mais vendidas por impulso dentro do varejo farmacêutico, estão os cremes dentais, sabonetes, preservativos, esmaltes, lâminas de barbear, barras de cereais, refrigerantes e, em medicamentos, os MIPs, já que muitos clientes têm por hábito manter uma farmacinha pessoal abastecida.

Para a arquiteta de varejo, Beatriz Pissato, no PDV, o ideal é trabalhar bem a questão de ponta de gôndola e com os produtos que têm melhores margens de saída e tentar ser o mais lucrativo possível na cesta de compra do consumidor. Vendas casadas, promoções e posicionamento de pontos extras costumam dar resultados. Ela ressalta, no entanto, que há pelo menos quatro dicas valiosas que podem ser aplicadas no PDV para potencializar o consumo não planejado, além das tradicionais gôndolas e prateleiras: a exposição em torre central dentro da loja para os produtos que se quer dar destaque; a utilização de mesas com acomodação de produtos do chão até a linha dos olhos; o posicionamento próximo aos caixas de produtos que se somam à compra, que estimulam a compra por impulso; e, finalmente, a escolha de um mix completo, com produtos relacionados próximos uns dos outros, para as vendas cruzadas – como um aparelho de barba ao lado da espuma de barbear.

Dicas para uma ação bem-sucedida de cross-merchandising

1. Espalhe ideias
É possível, e aconselhável, que o cross-merchandising esteja em todos os corredores, porém não no mesmo espaço – principalmente no pequeno varejo. É preciso saber escolher quais produtos se encaixam na estratégia. Evite itens de volume elevado.

2. Faça associações relevantes
Considera-se que o cross-merchandising foi bem-sucedido quando o cliente se lembra daquele produto na hora da compra e sente que sua experiência teve um resultado melhor em função disso. Jamais force a barra. Produtos que não têm relação nenhuma causam estranhamento e fazem com que o consumidor se sinta forçado a adquirir.

3. Lembre-se de onde você está
O porte da loja influencia diretamente no modo de aplicar as técnicas. Em um estabelecimento popular, fitas penduradas na prateleira entre dois produtos são uma boa alternativa para o cross-merchandising.

4. De olho na legislação
Antes de executar o cross-merchandising, é importante ter a certeza de que aquela execução é permitida por lei. Um exemplo é o caso amendoim com a cerveja que, em São Paulo, é proibido, mas em outros estados, não.

5. Pense como consumidor
Essa é a chave do negócio.

 

Fatores de uma compra por impulso

• Atitudes espontâneas, resultantes de um particular estímulo, de uma necessidade repentina de comprar;

• Resposta a um sentimento de urgência (vi algo que chamou a atenção, posso precisar, talvez precise, me lembrei ao ver, etc.);

• Ambiente: fatores climáticos, disponibilidade do produto, fatores culturais, ações no ponto de venda (PDV);

• Aspectos comportamentais: emoção e prazer;

• E há ainda o impulso no sentido de doença relativa à compulsão para compra.

Fonte: Connect Shopper

O papel do vendedor

Se no passado a profissão de vendedor era vista como opção temporária e transitória na carreira, hoje tem um papel extremamente estratégico, já que são os grandes responsáveis pela geração de receita às empresas e pilar que torna possível manter todos os outros centros de custo.

A consultora de varejo e mestre em comportamento do consumidor pela Universidade da Califórnia (UCLA-USA), Fátima Bana, acredita que o vendedor é uma peça-chave para os produtos sem receituário e cosméticos em geral, já que pode impulsionar a venda de correlatos. “Um cliente que está em busca de xampu para cabelo seco, por exemplo, pode ter interesse e levar também ampolas de tratamento, creme hidratante para o cabelo e uma boa máscara para evitar o ressecamento. Em 90% dos casos, a conversão é certa”, pontua a executiva.

Quando o vendedor expõe seu produto ou serviço com um atendimento franco e com o verdadeiro interesse em atender à necessidade do cliente, o potencial comprador retribui naturalmente seu franco feedback e, ao aceitar a troca de informações nesse retorno, o vendedor tem a oportunidade de conhecer seu produto sob uma nova visão, a do comprador, lembra Cruz, do IBVendas. “O profissional de vendas precisa desenvolver sua capacidade investigativa, sua capacidade de perguntar com o interesse genuíno de ajudar o cliente, que naturalmente passa a dar valor a isso.”

Já para o presidente da Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar), Edison Tamascia, a compra por impulso não acontece apenas pela abordagem do atendente e, sim, graças a uma série de fatores conjugados. “É preciso apostar em um conjunto de ações para ter sucesso, como a ambientação da loja (iluminação e temperatura ambiente), disponibilidade correta dos produtos, precificação benfeita, preços competitivos, variedade de produtos, profundidade de estoque e, depois de tudo isto, empatia do atendente”, defende

Como lucrar com as compras não programadas

• Aprofunde seu conhecimento sobre a dinâmica dos produtos e serviços ofertados;

• Treine continuamente a equipe para entender as necessidades e os desejos de seu público-alvo;

• Exercite o poder da empatia: coloque-se no lugar dele e analise se o atendimento prestado é o mesmo que gostaria de receber;

• Invista no diálogo com seus principais clientes e depois transforme este diálogo em solução: organizando melhor a loja, apostando na comunicação e na qualificação dos colaboradores;

• Escute ideias de seus funcionários, pois eles estão na chamada “linha de frente” e podem contribuir na melhoria de processos;

• Deixe sua loja funcional aos olhos do cliente. Por exemplo, reorganize a exposição dos produtos e crie um centro de cuidados para o cabelo. O mesmo raciocínio vale para os cuidados com a pele, unhas, etc. O fato de todos os produtos complementares estarem juntos facilita a vida do cliente, que percebe a variedade do mix de forma clara e objetiva;

• Aposte na comunicação: seja de lançamentos, promoções, packs promocionais, etc.;

• E finalmente: conheça o seu cliente. Um varejista que não conhecer seu grupo de cliente principal correrá o risco de perder espaço para a concorrência que pode ser a venda por internet, catálogo, a perfumaria, o supermercado, o atacarejo, entre outros. E não se esqueça: a venda por impulso deve fazer parte de uma estratégia sustentável.

Fonte: consultor na área Inteligência em Varejo, Olegário Araújo

Autor: Tatiana Ferrador

Alta do dólar

Edição 276 - 2015-11-01 Alta do dólar

Essa matéria faz parte da Edição 276 da Revista Guia da Farmácia.

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