Onde a crise não tem vez

Apesar do pessimismo sobre a economia brasileira, cada vez mais empresários do varejo farmacêutico aproveitam o momento para expandir os negócios e abrir novas lojas pelo Brasil  

 A crise político-econômica, que se abateu sobre Brasil e boa parte do mundo no início deste ano, desencorajou muitos setores de investirem em novas unidades e fábricas, com medo de perdas e desaquecimento do mercado interno nacional. Contudo, em qualquer crise, sempre existem empresários ousados e corajosos que encaram os momentos de recessão e estagnação para crescer e evoluir nos negócios.

Nesse contexto, a frase “apesar da crise” virou sinônimo de piada na internet, por conta do cenário excessivamente sombrio que a chamada grande imprensa o tempo todo tenta traçar do mercado interno brasileiro. Na vida real, a piada mostra que há vários setores sobrevivendo e crescendo neste período de desconfianças. O varejo farmacêutico é um deles. Vários pequenos e médios proprietários de farmácias estão deixando o receio de lado e abrindo novas lojas. Eles aproveitam o momento de desencorajamento de certos segmentos para incrementar os serviços oferecidos e ocupar os espaços vazios da concorrência.

Boas histórias

São empresários como Eric Marcelo Mascarenhas, de Mato Grosso do Sul. Junto com a esposa, ele abriu, neste ano, a quarta loja da rede que administra com a esposa. Farmacêutico de formação, Mascarenhas aproveita o potencial de consumo das pequenas cidades do País para expandir os negócios e prosperar.

“A crise não é desculpa para nada. Se a gente não trabalhar, as crises passam e perde-se o bonde da história. O mercado farmacêutico historicamente é pouco afetado por crises, assim como os supermercados. Então, temos de arregaçar as mangas e ocupar os espaços, antes que a concorrência faça”, avalia o empresário sul-mato-grossense.

Mascarenhas já é dono de três drogarias nas cidades de Naviraí, Caarapó e Amambai. A unidade de Caarapó foi inaugurada no dia 6 de janeiro de 2015. Três meses depois, o empresário abriu a unidade Amambai, no dia 7 de abril. Agora, no fim de novembro, ele prepara a terceira inauguração do ano, na cidade de Naviraí, a 60 quilômetros da capital Cuiabá.

“Optamos por inaugurar unidades de apelo popular por conta da atração pelos baixos preços e descontos. Mesmo com a crise, nosso movimento cresceu 20% no geral. Percebemos que as pessoas não estão deixando de consumir, mas buscando opções mais baratas de compra. E uma política agressiva de preços é fundamental nesse momento de mudanças nos hábitos de consumo”, diz Mascarenhas.

A bandeira escolhida pelo empresário foi a UltraPopular. Para realizar a terceira inauguração neste ano em Mato Grosso do Sul, o empresário de Caarapó investiu cerca de R$ 300 mil na abertura da nova unidade. Otimista, ele diz que espera reaver esse valor em faturamento no máximo em um ano e meio.

O segredo do sucesso, segundo Mascarenhas, está em usar todos os espaços midiáticos das pequenas cidades onde se instala para se consolidar e fazer barulho. O empresário investe pesado em anúncios em rádios e jornais locais, carros de som, parcerias com associações das cidades e tabloides de ofertas.

“Em qualquer tempo, e principalmente nos de crise, não basta ter apenas preço baixo e competitivo se o cliente não entra na loja para comprar porque não sabe que você existe. O marketing pesado incomoda bastante a concorrência, mas dá visibilidade e boca a boca, garantindo o retorno de que a gente precisa”, afirma.

Visão estratégica

Cerca de 1.300 quilômetros de distância longe da pequena Naviraí, está outro destemido empresário chamado Alessandro Ribeiro Branco. Ao lado do irmão, ele é dono de duas farmácias na cidade de Paraisópolis, em Minas Gerais. Em 17 de outubro deste ano, os dois inauguraram a terceira unidade deles na cidade. Com 120 m², a nova loja faz parte da rede associativista Entrefarma e exigiu um investimento de aproximadamente R$ 250 mil. Preço que os irmãos Ribeiro Branco dizem ser necessário para continuarem se destacando no mercado local.

“Cinco anos atrás, quando abrimos a primeira loja aqui, não existia rede organizada e centralizada. Nós chegamos com uma estrutura profissional, fazendo diferença na região. O medo da crise só atrapalha o processo de consolidação da nossa marca na cidade. Se eu não ocupar os espaços que ainda existem, outras redes podem chegar. Por isso estamos fazendo esse investimento, porque ele é necessário para a manutenção da nossa liderança. O temor hoje pode significar o problema de amanhã, por isso a gente tem encarado com naturalidade esse novo investimento nesse momento turbulento”, conta Ribeiro Branco.

Com menos de 30 mil habitantes, a cidade de Paraisópolis está localizada na Serra da Mantiqueira e tem uma vizinhança próspera e grande, como as cidades de Pouso Alegre e Itajubá. O investimento numa terceira unidade é a forma que os irmãos Ribeiro Branco encontraram para ocupar cada vez mais os espaços da cidade, fechando o cerco contra outras concorrentes vizinhas. É uma maneira também de dar opção de compra aos moradores locais, para que os mesmos não procurem as cidades maiores na hora das compras.

“Todo mundo quer comodidade. Ninguém quer pegar o carro e sair da sua cidade para comprar medicamento ou itens básicos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (HPC). Para tanto, a gente tem de trabalhar os preços. Não basta apenas estar lá. Tem de oferecer serviços, comodidade e, sobretudo, preços competitivos. Por isso, a gente escolheu a Entrefarma para continuar na cidade com bandeira competitiva e estruturada. É um jeito de sempre estar na ponta e brigar de frente com a concorrência”, aponta o empresário da cidade de Paraisópolis.


Constatação lógica

A realidade de Minas Gerais e Mato Grosso do Sul não é isolada no Brasil. Ela faz parte de uma realidade brasileira bastante próspera, que nem sempre sai nas páginas de jornais e telejornais. Mesmo com a crise, o mercado de varejo farmacêutico brasileiro tem se mantido em crescimento e aquecido, contrariando a onda de pessimismo atual.

Segundo a Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar), só em 2015, já foram abertas 281 novas lojas associativistas no País. Neste ano, a entidade teve ainda o ingresso de uma nova rede associativista, a 47ª, que ajudou a elevar esse número para 484 pontos de venda (PDVs) em todo o País em 2015.

A Febrafar fechou o mês de setembro último somando 9.539 lojas em todo território nacional. No fim de 2014, contudo, esse número era de 9.055 PDVs. Somados os números e considerando as incorporações, a associação teve uma média de quase 30 novas lojas sendo abertas por mês em todo o Brasil desde o início de janeiro deste ano.

Na avaliação do professor do Centro de Pesquisa, Desenvolvimento e Educação Continuada (Cepdec), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Rodnei Domingues, as perspectivas para esse segmento do mercado varejista continuam bastante prósperas para 2015 e também para 2016.

“O comércio varejista de medicamentos deverá crescer 10% em 2015. Esse é um resultado muito positivo e animador. Para 2016, mesmo considerando os cenários mais pessimistas, o crescimento da receita não deverá ser inferior a 10%. Os gráficos, que ilustram a performance do mercado no decorrer dos anos, mostram que picos de crescimento se alternam com vales de redução da demanda. Essa variação é natural, o que significa que as fases difíceis são substituídas por outras mais promissoras, por isso o empresário não pode se deixar abater nos momentos mais difíceis”, comenta Domingues.

Como já tinha adiantado ao Guia da Farmácia na edição de setembro último, o presidente da Febrafar mantém a avaliação de que o pessimismo deve deixar de ser a tônica da cobertura econômica no País e, principalmente, no setor varejista de farmácia.

“Existe um temor desproporcional. Tem de parar de falar de crise. Nosso segmento cresceu 11% no primeiro trimestre deste ano, portanto, não há crise. O desempenho anual está alto quando comparado inclusive à média mundial”, afirma Tamascia.

Mais do que chute, a opinião de quem entende do mercado é baseada em números. Portanto, o empresário, que pensa em expandir os negócios, não pode cruzar os braços diante da crise. Trabalhar parece a palavra de ordem daqueles que ainda têm ambições nesse segmento tão próspero do mercado brasileiro.

Autor: Rodrigo Rodrigues

Alta do dólar

Edição 276 - 2015-11-01 Alta do dólar

Essa matéria faz parte da Edição 276 da Revista Guia da Farmácia.

Deixe um comentário