Oportunidade lucrativa

Categorias de cuidados Pessoais têm sido a grande aposta do varejo farmacêutico e ganham atenção especial quanto ao sortimento de itens

Há muito tempo que nem só de medicamentos se compõe o tíquete médio de uma farmácia. Acompanhando um novo perfil de consumidor que busca otimizar suas compras em locais que concentram mais opções, as farmácias investem cada vez mais em um sortimento de produtos que vão muito além dos Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs) e Rxs (abreviação para a palavra latina recipere ou recipe que significa “faça uso de”), e onde itens de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (HPC) ganham mais visibilidade a cada ano.

Para uma melhor noção do crescimento e potencial de vendas de produtos de HPC nas farmácias, basta analisar os dados da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), que apontam que, apenas em 2014, os chamados não medicamentos foram responsáveis por cerca de R$ 10,7 bilhões em receitas. E mais: ao considerar os valores do ano anterior, pode-se observar um crescimento de 14,69%, valor superior aos 11,91% registrados nos medicamentos como um todo e até dos genéricos, que cresceram apenas 6,38% nas vendas do ano passado.

Segundo estimativa da entidade, produtos que não integram a lista de medicamentos representam, atualmente, algo em torno de 30% do faturamento das farmácias de um total de R$ 32,3 bilhões apenas no ano passado.

Para o consultor do Projeto Higiene e Beleza da Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar), Valdomiro Rodrigues, as categorias de HPC têm sido uma grande aposta para o varejo farmacêutico e isto se deve pelo atual comportamento do shopper brasileiro que entende a farmácia como um dos locais corretos para exercer a sua experiência de compra deste setor. “Diferentemente dos medicamentos, que em sua grande maioria têm preços controlados pelo governo, os produtos do setor de HPC têm preços livres, o que permite ao varejista trabalhar com preços que protegem suas margens e o ajudam a perpetuar seu negócio.”

Em alta, apesar da crise

O segmento de HPC continua sendo promissor ante os demais que sofrem com a crise econômica pela qual atravessa o País, já que segue em crescimento, mesmo em ritmo menos acelerado que nos últimos anos.

De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), a indústria brasileira de HPC apresentou um crescimento médio deflacionado composto próximo a 10% ao ano nos últimos 19 anos, tendo passado de um faturamento ex-factory, líquido de imposto sobre vendas, de R$ 4,9 bilhões, em 1996, para R$ 43,2 bilhões em 2014.

No entanto, as vendas de janeiro a setembro de 2015 já apresentam queda real de 6,7% em relação ao mesmo período do ano anterior, motivadas por vários fatores, tais como a instabilidade política e econômica pela qual o Brasil tem passado; a decisão do governo, tomada no início de 2015, de passar a cobrar o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) também das distribuidoras de cosméticos; a retração do poder de compra do consumidor; e a crise hídrica, que também impactou na venda de itens de higiene.

Para o gerente de inteligência de mercado da P&G, Marcos Lima, as categorias de Higiene e Beleza (H&B) seguem em crescimento, diferente de outras em que se tem observado constante queda. “O consumidor brasileiro já está sentindo no bolso os efeitos da crise econômica e, por isso, já diminuiu o índice de compras de bens duráveis, parou de viajar, faz menos refeições fora de casa”, diz. 

“Mudou também o comportamento na hora de ir às compras, com diminuição da frequência e alteração nos canais que eram mais comuns para ele, contudo não quer ter de abrir mão de produtos de melhor qualidade que já experimentou e, por isso, prefere uma compra mais certeira. Um exemplo é o investimento em produtos de tratamento, como as ampolas, para manter o cabelo bonito, já que diminuiu a frequência com que vai ao cabeleireiro. É por isso que a categoria continua sendo uma aposta para o mercado.” 

O executivo lembra, ainda, que a mulher que antes ia ao salão pelo menos uma vez por semana, deixou de ter essa frequência, então agora busca por produtos que tratem do seu cabelo com uma qualidade similar. “Desse modo, ela passa a investir em uma ampola de tratamento, em uma tintura de qualidade, etc. É a mesma coisa que observamos com azeites ou cervejas premiums, que tiveram seus consumos elevados pelo fato de os consumidores saírem menos de casa para jantar”, diz. 

Endossando o raciocínio de Lima acerca do comportamento do consumidor de produtos de HPC, está o presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra, que vê o consumo relativamente protegido para este ano. “O público consumidor depende basicamente de dois fatores para continuar comprando produtos de HPC: emprego e renda que, por mais intempéries que sofreram, não foram os mais atingidos neste setor”, argumenta. 

“Tivemos cerca de 55 milhões de consumidores que deixaram as classes D e E em 2002, e três milhões retornaram em 2015, mas que ainda assim não querem abrir mão do benefício conquistado”, lembra. Terra ainda explica: “Uma pessoa que trocou o sabonete por xampu para a lavagem de cabelo certamente não quer voltar a usar o sabonete e é exatamente aí que está a oportunidade da farmácia lucrar com isto e aumentar o mix de produtos de HPC, já que este consumidor não quer e também não para de consumir, ainda que faça substituições ou vá com menos frequência ao ponto de venda (PDV).”

Segundo dados de pesquisa do Kantar World Panel, a classe C, principal responsável pelo grande crescimento do mercado nos últimos anos, já começa a restringir suas compras de produtos da categoria, principalmente Cremes e Loções (-6%), Hidratante Corporal (-5%) e Produtos de Higiene Pessoal (-4%). 

“Dessa forma, vemos que, ainda que a crise esteja presente, os segmentos de cabelos, fragrâncias e maquiagem acabam ainda apresentando certa imunidade”, explica a presidente da REDS (Research Designed for Strategy), empresa de pesquisas focada em bens de consumo, Karina Millaré. 

“Isso é de se esperar, já que o Brasil é o segundo mercado mundial em cabelos, o primeiro em fragrâncias e o terceiro em maquiagem, sendo que este último teve um desenvolvimento bastante recente no Brasil, graças ao surgimento de novas marcas e aos canais de vídeos digitais, promovendo blogueiras a formadoras de opinião para esse segmento”, lembra.

Sortimento nas gôndolas

No varejo farmacêutico, é possível observar diferentes estratégias quanto à definição do mix de produtos de H&B. Como lembra o consultor da Febrafar, é possível encontrar, em boa parte das redes de farmácias, um bom sortimento de produtos com análise de produtividade das marcas e um correto trabalho de gerenciamento de espaços. “Por outro lado, na maioria das médias e pequenas farmácias, encontramos muitas oportunidades no que se refere a mix de produtos, áreas de autosserviço, nivelamento de preços e, principalmente, velocidade de reposição da demanda para mitigar as rupturas das marcas preferidas pelos clientes.”

Para Karina, o grande desafio para as marcas será garantir sua relevância a fim de que os consumidores das classes D e E continuem acreditando que vale a pena empregar seus recursos em determinadas marcas e não trocá-las por outras mais baratas.

“Com a menor disponibilidade de recursos dos consumidores, a equação custo-benefício faz-se cada vez mais importante, com implicações tanto no que tange o desenvolvimento de produtos multibenefícios, onde os consumidores possam tratar mais de uma demanda; como em formatos, como é o caso dos packs familiares, com clara vantagem no custo unitário, que também podem ajudar na experimentação de novos produtos, funcionando como ‘porta de entrada’ para novos lançamentos”, pondera.

Expectativas consolidadas

Para o presidente do conselho do Programa de Administração de Varejo da Fundação Instituto de Administração (Provar/FIA), Claudio Felisoni de Angelo, 2016 será um ano complexo, com desaceleração de renda e empregos, o que vai exigir, por parte dos varejistas, um planejamento assertivo, gestão focada e conhecimento de mercado no qual está inserido. “Mais importante do que buscar mais consumidores é entender o comportamento dos que já entram em sua loja e, assim, aperfeiçoar a experiência deles, tendo como consequência o aumento de faturamento.”

Felisoni de Angelo ressalta, ainda, que a farmácia que oferecer o melhor conjunto de atributos é a que terá maiores chances e sucesso neste ano. “Quando vamos às compras, não adquirimos um produto e, sim, um conjunto de atributos. Desde 1994, com a estabilidade da economia, o atributo preço passou a ser uma condição necessária, com produtos parecidos e preços próximos. Outros aspectos passaram a ter peso relevante no conjunto de atributos valorizados pelo consumidor, como, por exemplo, loja próxima, programas de fidelidade, estrutura de pontos, assim como a mão de obra treinada para atender e atrair esse consumidor, fazendo-o perceber o valor dessa operação”, explica. 

“Assim, quando esses atributos são trabalhados em conjunto, formam o que chamamos de fatores de isolamento da concorrência, o que é muito importante já que as empresas se encontram em um mercado altamente competitivo, e quem oferecer o melhor conjunto, certamente, conquistará o consumidor”, conclui.

Portanto, nessa nova maneira de perceber o varejo, o que deve ser segmentado são os perfis dos clientes e não os processos de compra, que devem ser convergentes e unificados. “O ano de 2016 promete consolidar uma nova era para o varejo, pois o período de instabilidade na economia brasileira tende a favorecer iniciativas mais criativas das empresas, que não poderão perder oportunidades de encantar o consumidor. Atentos às novas necessidades dos shoppers, os lojistas deverão investir em atendimento cada vez mais personalizado e em produtos que façam a diferença no PDV”, complementa Rodrigues, da Febrafar.

“Embora os dados de 2015 sejam ainda preliminares, já é possível afirmar que a categoria de protetor solar pode crescer acima de 14% sobre o ano de 2014. São destaques também as categorias de desodorantes, produtos para cabelo, produtos infantis e produtos masculinos. E para 2016, o crescimento dos dermocosméticos”, sugere. 

Para o especialista em varejo farmacêutico do Centro de Pesquisa, Desenvolvimento e Educação Continuada (Cpdec), Rogério Lopes Junior, ainda que as pesquisas mostrem que o varejo farmacêutico tenha crescido mesmo com a crise, é fundamental ampliar a oferta de produtos (concentração, tamanhos ou quantidade de embalagens) e pesquisar o público foco do estabelecimento para antever necessidade de consumo.

“Por exemplo: se a área de influência primária da farmácia for a população C, é preciso ter muita atenção, pois este consumidor foi o mais afetado pelo atual momento”, ressalta. “Os atendentes precisam estar preparados para oferecer aos clientes alternativas que podem ser mais vantajosas naquele momento (outros tamanhos e marcas, por exemplo). Desse modo, mesmo diante de um consumidor mais cauteloso, a loja não perde vendas, pois consegue entender as necessidades de seu público”, finaliza.

Dicas para uma farmácia atraente em HPC

1) Tenha um sortimento eficiente:

• Tenha uma regra líder;

• Tenha uma marca mais barata, dando opção para quem não pode pagar; 

• Garanta que as marcas com investimento estarão disponíveis;

• Tenha uma opção de produto com alto valor agregado; 

• Não adicione marcas que não gerem venda incremental;

• Não adicione novas marcas antes de ter certeza de que tem as versões corretas das que já existem.

2) Organize sua gôndola por marca. Isso facilita a consumidora a encontrar os produtos na gôndola;

3) Lembre o consumidor de produtos que ele pode – e precisa – comprar (principalmente de categorias em que as compras são menos frequentes). É interessante trabalhar com clip strip ou adjacências.

Fonte: P&G

Autor: Tatiana Ferrador 

Aumento de imposto

Edição 280 - 2016-03-01 Aumento de imposto

Essa matéria faz parte da Edição 280 da Revista Guia da Farmácia.

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