Estudo revela que a maioria das mulheres sente insegurança e vergonha quando estão no período menstrual
A menstruação é um processo biológico natural do corpo feminino. Todos os meses, o útero se prepara para o período de ovulação. A camada interna do órgão fica mais grossa e a taxa de progesterona aumenta, com o intuito de proteger o óvulo a ser fecundado. Quando a gravidez não ocorre, seja por uso de métodos anticoncepcionais ou outras causas, os níveis hormonais caem e o endométrio (parte interna do útero) começa a desfazer a camada protetora. Daí, forma-se o fluxo sanguíneo da menstruação. Após a descamação, inicia-se uma outra formação de hormônios para promover novamente o crescimento do útero.
Do ponto de vista da ciência, a menstruação consiste em um processo orgânico e cíclico que deveria ser encarado com naturalidade e familiaridade, devido à frequência com que se manifesta. No entanto, na prática, a situação é bem diferente. Mesmo em tempos de liberdade sexual e empoderamento feminino, a menstruação segue como um forte tabu.
A afirmação foi comprovada por uma pesquisa de âmbito global realizada pela Johnson & Johnson em parceria com a KYRA Pesquisa & Consultoria. Após entrevistar 1,5 mil mulheres de 14 a 24 anos de idade, de diferentes países – Brasil, Índia, África do Sul, Filipinas e Argentina –, o estudo registrou dados que mostram que o tabu em torno da menstruação é generalizado e está presente mesmo entre as jovens.
Você sabia que, no mundo todo, há várias crenças e mitos que rondam o período menstrual?
Brasil
• 43% não andam descalças ou conhecem alguém que não faz isso durante esse período.
• 31% não lavam o cabelo ou conhecem alguém que evita esta ação durante o ciclo menstrual.
Filipinas
• 75% não tomam banho ou conhecem alguém que não toma durante o
ciclo menstrual.
• 49% não tomam sorvete ou bebidas geladas ou conhecem alguém que não toma durante a menstruação.
• 24% não fazem bolo ou maionese ou conhecem alguém que não faça durante
a menstruação.
África do Sul
• 32% não encostam em imagens religiosas ou conhecem alguém que age desta forma.
• 34% não visitam templos ou conhecem mulheres que evitam fazer isso.
Índia
• 57% não entram na cozinha ou conhecem alguém que evita fazer isso.
• 39% são tratadas pela família como intocáveis ou conhecem pessoas que passam pela mesma situação.
• 39% não dormem na própria cama ou conhecem pessoas que têm este hábito.
• 37% não sentam na mesa com a família ou conhecem alguém que tem o mesmo hábito.
• 30% são proibidas de sair de casa ou conhecem alguém que passa pela mesma situação.
Fonte: Johnson & Johnson
No Brasil, 66% das entrevistadas afirmaram que ficam desconfortáveis com o período menstrual, 57% se sentem sujas e 42% revelaram ficar inseguras – apenas 19% mostraram confiança durante a menstruação. Parte desse receio de falar de menstruação está ligado à falta de informação sobre o assunto. Das mais de mil mulheres entrevistadas, 54% relataram que não sabiam absolutamente nada ou tinham poucas informações sobre menstruação no momento da menarca.
Essa falta de conhecimento sobre o funcionamento do corpo feminino gera muita vergonha e desconforto. A pesquisa descobriu que sete em cada dez mulheres se preocupam com a maneira como descartam o absorvente usado no lixo porque outras pessoas podem vê-lo e somente 22% não têm medo de levantar durante a aula no período menstrual. Quase a metade confessa esconder o absorvente no caminho do banheiro (46%) e duas em cada cinco meninas pedem absorventes para outra mulher como se fosse um segredo (42%).
A especialista em reprodução humana assistida, ginecologia e obstetrícia, Dra. Adriana de Góes, confirma a falta de informação e o medo de abordar o tema mesmo na relação médico-paciente. “É um assunto pouco divulgado e até no consultório a paciente questiona muito pouco e tem um certo tabu em relação à menstruação”.
A falta de informação é preocupante, uma vez que esse marco representa o início de muitas mudanças na vida feminina. “A primeira menstruação significa que os ovários se desenvolveram o suficiente para a mulher começar a ovular. Então se inicia a vida reprodutiva. A partir do momento que ela ovula, pode também engravidar, ainda que precocemente, nessa fase”, lembra.
Mudanças de comportamento
O desconforto e a insegurança são tão presentes que mais da metade das mulheres mudam seus hábitos durante o período menstrual. O impacto é observado tanto em ações mais corriqueiras – 74% das brasileiras deixam de entrar na piscina e 66% evitam praticar esportes – como em atitudes básicas: 46% das entrevistadas afirmaram que evitam até sair de casa quando estão menstruadas, somente 26% se sentem produtivas durante o período e uma em cada dez deixa de ir para a escola e/ou trabalhar quando está menstruada.
A vida cotidiana da mulher também é afetada por uma série de crenças e mitos que rondam o período menstrual há séculos, mesmo que não tenham qualquer embasamento científico. No Brasil, 43% não andam descalças ou conhecem alguém que não faz isso durante esse período e 31% não lavam o cabelo ou conhecem alguém que evita essa atividade durante o ciclo.
O mesmo ocorre em outros países, onde também existem costumes que assombram as mulheres. Na África do Sul, por exemplo, 32% não encostam em imagens religiosas ou conhecem alguém que age desta forma e 34% não visitam templos ou conhecem mulheres que evitam fazer isso. Já na Índia, 57% não entram na cozinha, 39% são tratadas pela família como intocáveis e 37% não sentam à mesa com a família.
Dor e desconforto
Não bastasse mexer tanto com a vida cotidiana da mulher, a menstruação vem, muitas vezes, acompanhada de dor e desconforto. Cerca de 85% da população feminina que menstrua relata apresentar pelo menos um ou mais sintomas pré-menstruais como cólica, sensação de inchaço, sintomas depressivos e irritabilidade. Esse quadro desagradável é fruto das alterações hormonais que acontecem no organismo feminino, sobretudo entre as pacientes que ovulam (aquelas que menstruam regularmente sem uso de contraceptivo).
Estima-se que a cólica menstrual atinja de 40% a 70% das mulheres com menos de 30 anos e de 2% a 10% relatam sintomas incapacitantes, segundo a ginecologista do Horas da Vida, Dra. Luiza Riccio. Essa dor característica da menstruação ocorre pela liberação de substâncias chamadas prostaglandinas durante o fluxo menstrual, que causam a contração do útero e a dor. Já a tensão pré-menstrual (TPM) seria um conjunto de manifestações físicas, emocionais e comportamentais nas mulheres em idade reprodutiva durante a chamada fase lútea do ciclo menstrual: após a ovulação e antes da menstruação.
“Os sintomas e a intensidade podem variar de mulher para mulher e alteram as atividades diárias da paciente. Acredita-se que eles sejam decorrentes da interação entre os neurotransmissores do sistema nervoso central (SNC) e os hormônios normalmente produzidos durante o ciclo menstrual”, conta a Dra. Luiza.
Muitas vezes, o quadro de desconforto só é amenizado com o uso de medicamentos. Os mais eficazes são os anti-inflamatórios, mas caso a cólica se torne mais intensa, não apresente melhora com medicações simples ou venha associada a sintomas como dor na relação sexual ou fora do período menstrual, a paciente deve procurar o seu ginecologista para uma avaliação. “Para mulheres que têm intolerância absoluta à medicação, a solução é bloquear efetivamente a ovulação por meio do uso de métodos contraceptivos hormonais”, recomenda a Dra. Adriana.
Como as Brasileiras se sentem em relação à menstruação
Sujas 57% (global 40%)
Desconfortáveis 66% (global 50%)
Capazes 19% (global 24%)
Inseguras 42% (global 28%)
Além de tratamento medicamentoso, a melhora da qualidade de vida durante o período menstrual pode ser obtida por meio de mudanças de hábitos de vida que incluem horas adequadas de sono, redução do estresse, alimentação balanceada, sessões de drenagem linfática e, principalmente, a realização de atividade física regular. “Ao contrário do que pensam muitas mulheres, que julgam ser melhor ficar de repouso, atividades físicas são tidas como grandes aliadas para combater o desconforto. Elas liberam endorfina, o que pode modular os sinais depressivos que aparecem nesse período”, conta a especialista.
O controle do impacto dos hormônios no corpo feminino durante a vida fértil da mulher pode trazer ganhos posteriores, quando se iniciar a fase da menopausa.
A falta de estrogênio, o principal hormônio feminino, que deixa de ser produzido pelos ovários após a menopausa, leva a mudanças no funcionamento da musculatura da pelve e na genitália feminina, ocasionando o surgimento da incontinência urinária e do ressecamento vaginal.
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