“Mulher é bicho esquisito, todo mês sangra.” O verso, da canção Cor de Rosa Choque, lançado por Rita Lee, em 1982, descreve um pouco da complexidade que é o organismo feminino. Flutuações hormonais, menstruação, gravidez e menopausa são algumas das condições que tanto as diferenciam dos homens.
Mas isso não quer dizer que elas são mais frágeis.
De acordo com a endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo (SBEM-SP), Dra. Paula Pires, estudos mostram que os homens se cuidam menos e ficam mais doentes.
“Em média, as mulheres vivem sete anos mais que os homens e elas se cuidam mais. O problema é que muitas mulheres estão sobrecarregadas com trabalho de casa e fora de casa e, muitas vezes, falta tempo para praticar exercícios e para organizar melhor a rotina alimentar”, diz.
O fato é que a saúde feminina demanda mais cuidados por apresentar patologias bastante específicas, mas que podem ser rastreadas precocemente com o devido acompanhamento médico.
“De uma forma geral, a mulher moderna tem cada vez mais se preocupado com a saúde, embora no Brasil exista uma deficiência na informação e na conscientização da necessidade de acompanhamento ginecológico e de rastreamento. Dessa maneira, algumas doenças preveníveis, como câncer de colo de útero, ainda têm alguma incidência. Se a prevenção ocorresse de maneira eficaz, provavelmente, os casos diminuiriam”, comenta o ginecologista do Hospital Santa Catarina, Dr. Gustavo Barison.
O cuidado com a saúde da mulher começa junto com a primeira menstruação (menarca) e perdura o resto da vida. “Anualmente, é necessária a realização de exames que garantam a saúde ginecológica, assim como previnam o aparecimento de neoplasias que acometem as mulheres, como o câncer de mama, ovários e colo uterino”, comenta o mastologista da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, Dr. Daniel Gallo.
Segundo ele, quando se fala de saúde da mulher, há uma série de enfermidades capazes de comprometer o sistema genito-urinário feminino. “Desde doenças graves, como os cânceres e endometriose, até as mais simples, como infecções. Na prática clínica, observamos uma alta prevalência de infecções oportunistas do trato genital feminino, os famosos corrimentos genitais. Muito comuns e fáceis de tratar”, comenta.
As doenças mais comuns
Câncer de mama, depressão e câncer do colo de útero estão entre as doenças que mais acometem as mulheres no País, segundo a Dra. Paula. “Essas três condições estão associadas à obesidade e a um estilo de vida ruim”, alerta.
DICAs DO GUI:
Desmistifique secura vaginal
Estatísticas
A secura vaginal acomete cerca de 34% das mulheres ao longo da vida sexual reprodutiva, podendo chegar a 90% das mulheres no período pós-menopausa.
O que é?
Trata-se de uma condição muito comum nas mulheres na pós-menopausa, causada pela falta de lubrificação local, normalmente causada pela atrofia (enfraquecimento) da mucosa vaginal nesse período.
Causas
A mais comum é a menopausa. A remoção dos ovários para tratar ou prevenir cânceres; quimioterapia; radioterapia; pós-parto e amamentação; além do uso de alguns medicamentos (bloqueio hormonal) também podem dar origem ao quadro.
Sintomas
Em geral, as mulheres podem apresentar sensação de queimação/ardência ou desconforto vaginal, relações sexuais dolorosas, prurido vulvar, corrimentos não habituais, dispareunia, sangramento pós-coito, gerando a disfunção sexual, por diminuição da libido e do orgasmo (em frequência e intensidade).
Tratamento
Usa-se lubrificantes locais, caso a queixa seja apenas sexual. A terapia hormonal nas pacientes com indicação também auxilia no controle. Além disso, pode-se usar cremes de estrogênio e androgênios vaginais e laser.
Fontes: ginecologista do Centro de Medicina Sexual do Hospital Sírio-Libanês, Dra. Helga Marquesini; médica da família da DaVita Serviços Médicos, Dra. Ana Esther Marques Silva; e ginecologista da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, Dr. Rodolpho Kleine
Além disso, existem diversas patologias prevalentes nas mulheres, como endometriose, cistite, corrimentos vaginais, síndrome de ovários policísticos, candidíase, osteoporose e miomas uterinos.
“A mulher apresenta alguns riscos inerentes, cujos cuidados e prevenção podem ser mais detalhados e enfatizados. A mulher adolescente tem algumas preocupações que a mulher adulta não tem, e vice-versa”, destaca o Dr. Barison.
A médica da família da DaVita Serviços Médicos, Dra. Ana Esther Marques Silva, alerta para a incidência de doenças cardiovasculares. “Mulheres que em geral são hipertensas e acabam sofrendo infarto ou derrame. As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte das brasileiras, representando 1/3 dos óbitos de todas as faixas etárias, seguidas por neoplasias, como cânceres de mama, colorretal e colo do útero, além de agravos respiratórios, como a asma”, diz.
Para cada fase, um novo cuidado
Com o passar do tempo, o organismo sofre desgastes naturais e também comportamentais. Hábitos alimentares ruins, falta de atividade física regular, obesidade e tabagismo são algumas condições que podem afetar a saúde da mulher e de todos os indivíduos de forma geral. Mas o fato é que os maus hábitos comportamentais associados ao tempo e às doenças genéticas podem ter como resultado problemas de saúde e comprometimento da qualidade de vida.
“Todos nós precisamos ter um estilo de vida saudável: uma alimentação regular com ingestão de frutas, legumes e verduras de forma equilibrada, evitando alimentos industrializados e ultraprocessados; beber água; praticar atividade física; ter um tempo para relaxar e cuidar de si mesmo; e tomar sol diariamente. E cada fase da vida requer cuidados diferentes”, afirma a Dra. Ana Esther.
A seguir, o Dr. Gallo, a Dra. Ana Esther e a Dra. Paula listam os principais cuidados e exames necessários em diferentes fases e transformações que o organismo feminino passa ao longo da vida.
Dos 10 aos 15 anos de idade
Nessa fase, é importante observar o início da primeira menstruação (menarca). Aliás, esse é o momento para o início dos cuidados com os exames ginecológicos, que devem conter dosagens hormonais, observação do perfil metabólico, ultrassonografia de pelve e mamas. Além disso, é necessário acompanhamento médico de altura, peso, puberdade e desenvolvimento. É também a época da vacinação HPV (Subtipos 6,11,16 e 18) e aos 15 anos DT (tétano).
Dos 20 aos 30 anos de idade
Após o início da vida sexual, deve-se incluir na rotina de exames a colpocitologia oncótica (Papanicolau), que serve para rastreamento e prevenção de neoplasias do colo uterino ou infecções pelo vírus HPV. Deve-se, ainda, incluir a vacinação com o reforço tétano, aos 25 anos.
Dos 30 aos 40 anos de idade
Fase de maior importância na rotina ginecológica. Além do básico, como ultrassonografias, exames de sangue e colpocitologia oncótica, deve-se estar muito atento às alterações relacionadas à fertilidade. A partir dos 35 anos, incluir exames de tireoide (TSH) a cada cinco anos e se, aumentado, pode-se dosar T4 livre de acordo com recomendação médica.
Dos 40 aos 50 anos de idade
A partir dos 40 anos, a mulher deverá iniciar o rastreamento do câncer de mama, realizando a mamografia anualmente. Além disso, monitorar a glicemia de jejum, medir a pressão arterial, perfil lipídico, TSH e demais exames de acordo com sintomas prevalentes ou doenças crônicas apresentadas.
A partir dos 50 anos de idade
Manter todos os exames de rotina, se preocupando com a chegada da menopausa. Para isso, é importante realizar avaliação hormonal e iniciar o rastreamento da perda de massa óssea advindo da menopausa. Vale lembrar que a coleta de Papanicolau deve ser mantida até os 64 anos, sendo contra indicada em mulheres acima de 65 anos ou que tenham realizado histerectomia total.
A mamografia deve ser feita até os 74 anos, com repetição a cada dois anos, com acompanhamento mais rigoroso para aquelas que possuem histórico familiar positivo para câncer de mama. A partir dos 75 anos, os rastreamentos cessam, explora-se a qualidade de vida, melhoria da autonomia, da inclusão na família e na comunidade.
Formas de contracepção
Foi na década de 60 que nasceu a pílula anticoncepcional. Um marco na liberdade sexual da mulher que poderia, então, não somente planejar uma gravidez, como também decidir não engravidar.
“Os métodos anticoncepcionais são ferramentas importantes que possibilitam o exercício da sexualidade da mulher de forma independente da preocupação com a reprodução. Até porque, apesar das responsabilidades serem do casal, é sabido que o peso de uma gestação cai mais sobre as mulheres. São elas que irão carregar o bebê por nove meses, irão se afastar do trabalho durante a licença e assim por diante”, comenta o ginecologista e secretário-geral da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (Sogesp), Dr. Luciano Pompei.
Ele destaca que, com o uso de contraceptivos, a mulher pode programar o melhor momento da vida para engravidar. “A contracepção permite a liberdade de escolha”, diz.
Existem várias formas de se classificar os métodos anticoncepcionais que podem ser hormonais, não hormonais, reversíveis e irreversíveis. “Entre os irreversíveis, está a laqueadura tubária”, explica.
Entre os métodos não hormonais, estão o Dispositivo Intrauterino (DIU) de cobre e o preservativo. “Entretanto, também existe o diafragma, a esponja, o capuz cervical e o espermicida, mas, de maneira geral, menos acessíveis que os supracitados”, comenta o médico da família da DaVita Serviços Médicos, Dr. Rodolfo.
Ele ainda comenta que existem os métodos comportamentais, como coito interrompido, tabelinha e abstinência, mas alerta, eles possuem eficácia reduzida e não devem ser usados como único método.
O Dr. Galeazzi esclarece que os DIUs não hormonais, comumente, são à base de cobre, apesar de alguns conterem também prata, e têm validade de 10 anos, dependendo do modelo. Porém, por não terem hormônio tendem a aumentar o fluxo menstrual e as cólicas.
“Eles também podem ser expelidos naturalmente pelo corpo e, por isso, deve-se fazer um controle regular, normalmente, com ultrassonografia transvaginal”, explica.
Quanto aos métodos hormonais, a oferta de opções é grande. O Dr. Pompei destaca os orais, como as pílulas anticoncepcionais, os injetáveis e outros como os adesivos transdérmicos.
“Os contraceptivos injetáveis podem ser encontrados com duração de três meses ou aplicação mensal. Além disso, há os anéis vaginais, que liberam hormônios na vagina, e também o implante transdérmico subcutâneo, um bastão que é inserido sob a pele e libera hormônios por três anos”, explica.
Em relação aos métodos hormonais, o mercado farmacêutico disponibiliza o DIU de Levonorgestrel (Mirena e Kyleena), as pílulas de diversas formas, implante subdérmico, adesivos, anel vaginal e injeção.
“Os DIUs hormonais apresentam levonorgestrel e sua ação hormonal tende a ser restrita ao local (útero). Sua inserção é parecida com a do DIU de cobre e possui validade de cinco anos (Mirena). O seu uso tende a reduzir os sangramentos e as cólicas, mas em algumas mulheres, da mesma forma que o de cobre, pode ocorrer a rejeição do método”, comenta.
Ele ressalta que quando se fala em pílulas, há diversas opções, desde métodos apenas com progesteronas (menos chance de trombose) ou pílulas combinadas com estrogênio.
“Existem diversos hormônios diferentes, alguns com benefícios antiandrogênicos (melhora pele e cabelo) e outros que podem piorar essas mesmas coisas. Alguns são de uso contínuo e outros com pausa e mantêm o ciclo menstrual”, explica o Dr. Galeazzi.
Não se pode esquecer dos métodos de barreira, ou seja, preservativos tanto masculinos quanto femininos, que além de atuarem contra uma possível gravidez, ainda protegem contra Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs).
Fonte: Guia da Farmácia
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