Melatonina: os prós e contras da liberação do hormônio

Dados do CFM indicam que 77% dos brasileiros fazem o uso de substâncias sem qualquer orientação médica

Com a liberação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) do uso da melatonina para a formulação de suplemento alimentar, o hormônio ganhou destaque, mas gerou preocupação, já que a venda sem receita médica pode resultar em uma série de problemas.

O lado bom da melatonina

De acordo com a pós doutora em endocrinologia e metabologia pela USP e Membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Dra. Claudia Chang, a melatonina é um hormônio produzido pela glândula pineal (uma pequena estrutura do sistema nervoso central) e responsável pelo nosso ritmo circadiano que, além de regular o estado de vigília e sono, controla temperatura corporal, equilíbrio das células, níveis hormonais, entre outras funções.

“Quando não há luz, por exemplo, a retina envia informações para uma região do cérebro, o hipotálamo, que manda uma mensagem até o epitálamo, fazendo com que a glândula pineal libere melatonina, promovendo o sono na ausência de luz. Daí a relação da melatonina com o sono”.

Já de acordo com pesquisas da National Sleep Foundation (NSF), pelo menos 40 milhões de pessoas sofrem com mais de 70 tipos de distúrbios do sono, e 60% dos adultos relatam ter problemas de sono algumas noites por semana ou mais. A maioria das pessoas não é diagnosticada e tratada.

Além disso, mais de 40% dos adultos experimentam sonolência diurna severa o suficiente para interferir em suas atividades diárias.

 Sono

“A privação do sono afeta a produção de novas células neuronais, gerando uma série de déficits cognitivos, como fadiga, diminuição dos reflexos, sonolência, envelhecimento precoce, queda da imunidade, dificuldade de concentração, problemas de memória e até transtornos psiquiátricos. Por isso, dormir é uma necessidade tão natural quanto comer. O momento do descanso é essencial para repor as energias, ajudar o organismo a se recompor do estresse do dia, além de auxiliar no sistema imunológico”, pontua o Dr. Adiel Rios, Mestre em Psiquiatria pela UNIFESP, pesquisador no Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP e Membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

Onde mora o perigo

Ainda de acordo com endocrinologista Claudia Chang, ainda que haja critérios no uso da melatonina como suplementação (ter mais de 19 anos, consumir até 0,21 mg por dia, não ser gestante ou lactante e ter acompanhamento médico em casos de doenças), a liberação do hormônio pode ser perigosa.

Contraindicações

De acordo com a própria Anvisa apesar de necessária ao organismo, a substância tem contraindicações – “há riscos associados à utilização da melatonina que não podem ser ignorados: o consumo de medicamentos contendo a substância pode causar inchaço da pele, boca ou língua, perda de consciência, depressão, irritabilidade, nervosismo, ansiedade, aumento da pressão arterial e função anormal do fígado, entre outros problemas”.   

“Embora não haja consenso científico sobre seus supostos benefícios, a melatonina se popularizou, por meio das farmácias de manipulação, como uma substância milagrosa não só para o sono, mas com promessas para tratar emagrecimento, diabetes, enxaqueca e até mesmo câncer e doença de Alzheimer”, conta Claudia Chang.

O dermatologista Dr. Renato Pazzini, Membro do Corpo Clínico dos Hospitais Albert Einstein e Oswaldo Cruz, reitera.

“Muitas pessoas acreditam que a melatonina soluciona problemas decorrentes do envelhecimento, como a flacidez da pele. De fato, o hormônio facilita o transporte de aminoácidos para o interior das células, proporcionando melhores condições para que sintetizem diferentes proteínas, entre elas, o colágeno. No entanto, sua atuação é indireta. O uso da melatonina, por si só, não tem efeito rejuvenescedor se não houver outros tratamentos concomitantes e, principalmente, acompanhamento médico”, frisa Pazzini.

A maior preocupação dos especialistas é a liberação do hormônio no Brasil sem necessidade de receita médica, motivando a “automedicação” (ainda que se trate de uma suplementação).

Dados do Conselho Federal de Medicina (CFM) indicam que 77% dos brasileiros fazem o uso de substâncias sem qualquer orientação médica.

Intoxicação

Entre os riscos da automedicação, a intoxicação é a mais perigosa.

De acordo com o Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas, cerca de 30 mil casos de internação são registrados por ano no Brasil por decorrência de intoxicação.

Outro risco da automedicação é o fato de que, se uma substância é ministrada na quantidade inapropriada, ou ainda, se combinada a outra, ela pode mascarar sintomas de uma doença mais grave.

“Mesmo que a melatonina tenha baixa incidência de efeitos colaterais (dor de cabeça, sono fragmentado, aumento da incidência de pesadelo, tontura, náuseas, sensação de estar dopado, sonolência durante o dia e elevação dos níveis do hormônio prolactina), quando estes ocorrem, a causa habitualmente é a utilização de doses elevadas (acima de 3 mg) ou pela presença de substâncias ocultas na fórmula. Por isso, mesmo sem a obrigatoriedade de receita médica, é fundamental buscar orientação especializada antes de fazer uso de suplementação da melatonina”, finaliza o psiquiatra Adiel Rios.

Fonte: CFM

Foto: Divulgação

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