Banco de dados mostram que 57,2% dos 36.805 que morreram pela Covid-19 na Itália eram homens; no Equador, eles eram 66,4% dos 12.181 óbitos.
O número a mais de homens que são levados às mortes pela Covid-19 é um fato curioso para a ciências. Em 20 de janeiro de 2020, pouco se sabia sobre o Sars-Cov-2. Embora a falta de testes, de informações padronizadas e a preocupação com a subnotificação de mortes impeçam uma dimensão real sobre como o sexo está se saindo como um fator de risco para a Covid-19, informações coletadas até 2 de novembro pela plataforma Global Health 50/50, um banco de dados internacional voltado à igualdade de gênero na saúde, mostram que 57,2% dos 36.805 que morreram pela covid-19 na Itália eram do sexo masculino. No Equador, eles eram 66,4% dos 12.181 óbitos. No México, 64% dos 89.171 mortos.
E há países onde mais que o dobro de homens morreu em consequência da doença. É o caso do Peru, onde 69,4% dos 34.187 que morreram eram homens.
Mesmo onde os dados de gênero e sexo são parciais, como no Brasil, a incidência de morte em razão do vírus era maior em homens – 57,8%. Os dados também da Global Health 50/50, no entanto, sugerem taxas de infecção semelhantes em pessoas de ambos os sexos. Então por que uma proporção significativamente maior de homens não resiste à doença?
Maior taxa de sobrevivência
A partir do início da idade adulta, as mulheres começam a ser maioria na sociedade e passam a viver mais do que os homens em praticamente qualquer lugar do mundo. A expectativa de vida para elas é, em média, de seis a oito anos maior. Além disso, para cada homem com um século de vida, há quatro mulheres. E das pessoas que chegam aos 110 anos de idade, mais de 95% são do sexo feminino.
Os cientistas também constataram que as mulheres têm um sistema imunológico mais forte do que os homens, veem o mundo com maior variedade de cores e correm menos risco de desenvolver determinados tipos de câncer. E, caso tenham a doença, suas chances de responder positivamente ao tratamento são maiores.
Os alvos preferidos do Sars-Cov-2
Idosos, por exemplo, correm em média um risco cinco vezes maior de desenvolverem quadros graves e morrerem devido à Covid-19. Um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado em maio, mostrou que pessoas acima de 60 anos representaram 80% das mortes na China e 95% das que morreram na Europa. No Brasil, pessoas com mais de 60 anos representavam 69% dos óbitos.
Essas condições, porém, não afetam todos igualmente. Entre pobres e ricos com comorbidades, por exemplo, a balança da morte tende a pender para os desvalidos.
Presume-se que a disparidade se repita nas comunidades negras — no Brasil, três em cada quatro pessoas que constituem os 10% mais pobres são negros, de acordo com a pesquisa Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil, divulgada pelo IBGE em 2019.
E quanto à taxa de letalidade maior entre homens?
Isso provavelmente reflete uma combinação de diversos fatores.
Ganha força, contudo, a ideia de uma suposta fragilidade biológica do sexo masculino. Um dos principais defensores dessa teoria é o geneticista que previu o fenômeno em janeiro, Sharon Maolem.
A afirmação vem na esteira do lançamento de The Better Half: On the Genetic Superiority of Women (A melhor metade: sobre a superioridade genética das mulheres). Em geral, mulheres vão com mais regularidade ao médico, fumam menos e lavam as mãos com mais frequência.
Por que mais homens morrem de Covid-19?
Os homens tratam menos das comorbidades crônicas, têm um comportamento mais arriscado e são menos caprichosos. Observando assim, a conduta, de fato, torna o homem mais propenso a desenvolver uma síndrome respiratória. E a morrer mais cedo.
Em um artigo de opinião no The New York Times, intitulado “Por que tantos homens morrem de coronavírus?”, o geneticista admite que algumas explicações comportamentais “são quase certamente válidas”.
No entanto, também afirma que a maior taxa de mortes entre homens por Covid-19 “pode ser uma demonstração oportuna e de alto perfil” da genética feminina.
O sexo é fator de risco?
Desde que os primeiros casos surgiram, no fim do ano passado, a doença causada pelo novo coronavírus demonstrou ser bem mais do que respiratória.
Descobriu-se que a Covid-19 pode afetar não apenas os pulmões como também o sistema circulatório, o coração, os rins e até mesmo os sentidos, como o olfato e o paladar. A razão para boa parte desses efeitos é um enigma.
Artigos científicos
O que há são correlações e possibilidades.
Para determinar se o sexo é um fator de risco seria necessário um estudo amplo, começando, por exemplo, pelo sequenciamento do genoma de pessoas que desenvolveram quadro leve da doença e de indivíduos que tiveram quadro grave.
Fatores genéticos
Os cientistas, então, tentariam encontrar variantes genéticas que pudessem influenciar a gravidade da doença.
Além disso, seria preciso considerar outros fatores não-genéticos — variáveis como idade, condições de saúde pré-existentes, hábitos de vida, condição socioeconômica.
Os dados precisariam vir de fontes confiáveis e legítimas, como registros hospitalares ou do governo, e englobar um longo período de tempo e países diferentes. É um esforço tão árduo, custoso e demorado.
Mesmo que a hipótese genética fosse confirmada, seria impossível ignorar a teoria clássica — atrelada aos fatores comportamentais.
O demógrafo José Eustáquio Alves ressalta que os homens, em geral, seguem mais expostos aos riscos de contágio e tratam menos das comorbidades crônicas.
O que o leva a crer que as diferenças de reações ao vírus (e a outras mazelas) provavelmente refletem uma combinação de diversos fatores.
Fonte: G1
Foto: Shutterstock