O setor de saúde discute os impactos da medida conhecida como “data protection” ou Proteção Regulatória do Dossiê de Testes (PRDT), que tem como objetivo estipular um prazo para exclusividade de dados para além dos 20 anos previstos na Lei de Propriedade Industrial.
Entidades do setor farmacêutico e farmoquímico participaram de audiência pública na Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática do Senado Federal, no dia 15 de maio. Na ocasião, apresentaram estudos que avaliam os efeitos negativos da adoção do uso exclusivo de informações de testes para os medicamentos de uso humano.
Um deles, conduzido pela Ferres Economia, aponta o impacto sobre o acesso de medicamentos para a população, como a demora para a entrada de produtos concorrentes no mercado brasileiro, o que elevaria os gastos com saúde e atrasaria o desenvolvimento tecnológico da indústria farmacêutica nacional.
De acordo com o levantamento, mais de 350 milhões de doses deixarão de ser consumidas ao ano em função do atraso concorrencial e do preço.
Segundo a vice-presidente do Grupo FarmaBrasil (GFB) – entidade que representa 12 indústrias farmacêuticas nacionais -, Adriana Diaféria, o mecanismo, além de atrasar a entrada de produtos mais baratos no mercado, traz prejuízos para o consumidor e para o Sistema Único de Saúde (SUS). Isso porque o prazo de exclusividade da patente poderia se estender para além dos 20 anos.
Extensão do prazo
Estudo realizado pelo Instituto de Economia da UFRJ constatou que a extensão do prazo de exclusividade para venda de medicamentos de referência pode impactar o orçamento do SUS em até R$ 1,1 bilhão, e em R$ 7,6 bilhões para os consumidores brasileiros no mercado privado.
“Gera efeitos negativos para o Ministério da Saúde e para a população, uma vez que cria obstáculos à fabricação de genéricos e sua comercialização a custos mais baixos. Além disso, afronta decisão do Supremo Tribunal Federal (STF)”, avalia Diaféria.
Em 2021, o STF decidiu pela inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 40 da LPI, que permitia que as patentes durassem muito além dos prazos adotados nos outros países. A partir de então, o prazo de monopólio de uma patente não poderia ultrapassar 20 anos.
O estudo elaborado pela Diretora de Assunto Regulatórios da Inovatie Serviços em Saúde, Cláudia Cilento, também reforça que a adoção do “data protection” teria como consequência o atraso da entrada de novos competidores que são fundamentais para a diminuição dos preços e do acesso a medicamentos.
Já a advogada Laura Schertel Mendes mostra o impacto para a população mais vulnerável, com a possibilidade da exclusividade do uso de informações de testes para os medicamentos de uso humano.
De acordo com o estudo, os medicamentos novos têm preço, em média, 5 vezes maior que os genéricos e 3 vezes maior que os similares. O levantamento ainda aponta que os gastos com medicamentos totalizam cerca de 72% dos valores investidos pelas famílias, e representaram, em média, 8,3% do orçamento das famílias pobres.
Segundo Laura, a introdução do data protection encareceria os medicamentos e reduziria a disponibilidade, sendo incompatível com o direito fundamental à saúde e a política pública de ampliação do acesso a medicamentos.
A advogada lembra ainda que o assunto já foi superado pelo próprio Congresso Nacional quando se discutiu a Medida Provisória 69/2022, convertida na Lei 10.603/2022.
Riscos à pesquisa e inovação
Para a vice-presidente do GFB, o “data protection” coloca em risco a pesquisa e inovação nacionais. “A falta de previsibilidade de prazo para patentes gera insegurança jurídica para as empresas e dificulta o planejamento de investimentos em pesquisa e desenvolvimento”, diz Diaféria.
Durante a audiência, o senador Marcos Pontes (PL/SP) corroborou com os pareceres apresentados e afirmou que o país precisa investir em inovação para ter uma indústria farmacêutica mais robusta.
“Os genéricos são uma solução acertada para que tenhamos menor custo para a população, menor custo para o Sistema Único de Saúde. Além disso, as empresas do Brasil que produzem genéricos acabam desenvolvendo inovações, o que ajuda a fortalecer a indústria brasileira. Por isso, não vejo nenhuma vantagem de se ter essa proteção regulatória no país neste momento”, disse Pontes.
O presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática do Senado Federal, Izalci Lucas (PL/DF), sinalizou que os debates continuarão em mais duas audiências.
Fonte: Grupo FarmaBrasil
Foto: Shutterstock
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