Fora do grupo de risco, quase 900 bebês morreram por causa da Covid-19 no Brasil em 2020

Especialistas veem falta de protocolos para atender grávidas e recém-nascidos e rede de saúde precária como explicações

Ao menos 899 bebês com menos de 1 ano morreram ano passado no País vítimas de Covid-19 – um dos maiores números do mundo nesta faixa etária.

O dado consta do Painel de Excesso de Mortalidade no Brasil e foi divulgado pela organização de saúde Vital Strategies.

Como bebês não são grupo de risco da doença, especialistas acreditam, portanto, que a falta de protocolos de atendimento para grávidas e recém- nascidos.

E também acreditam nas fragilidades do sistema de saúde explicam a elevada quantidade de óbitos.

“Não houve nenhum protocolo para atendimento de gestantes e recém-nascidos, não houve alerta para obstetras, pediatras, não se separou hospitais de referência para gestantes com covid-19, não houve nada para organizar e orientar os atendimentos”, afirma a epidemiologista e consultora da Vital Strategies, Fátima Marinho.

“Teve casos de parto em gestantes intubadas na UTI.” Assim como ocorre com a maior parte das vítimas adultas, o comprometimento dos pulmões causado pelo vírus leva os bebês à morte.

O número de bebês mortos no Brasil em decorrência do novo coronavírus é baixo quando comparado ao total de óbitos em outras faixas etárias.

Menos vulneráveis

Já está estabelecido pela ciência que crianças são menos vulneráveis à Covid-19, e os mais velhos estão entre os mais suscetíveis.

O dado, porém, se destaca quando comparado aos da mesma faixa etária em outros países, revelando mortes que seriam evitáveis.

O número brasileiro é quase dez vezes o registrado, por exemplo, para o grupo de zero a 18 anos nos Estados Unidos, país com mais mortes pela covid (com cerca de 544 mil vítimas, ante quase 318 mil no Brasil).

Dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC, na sigla em inglês), registram, assim, só 103 mortes pela doença naquela faixa etária (incluídos bebês) em 2020.

O Brasil também apresenta, então, por um excesso de internações de bebês (até 1 ano) pela Covid-19. No ano passado, foram 11.996.

Estudo de julho da International Journal of Gynecology and Obstetrics já tinha mostrado que o total de grávidas mortas no Brasil pelo coronavírus também era um dos mais altos do mundo.

Certamente, das 160 mortes de gestantes em todo o mundo entre o início da pandemia e junho, 124 foram no Brasil. O 2.º lugar era dos EUA, com 16 óbitos.

Estrutura precária

Especialistas dizem que uma série de variáveis contribui para o quadro.

A falta de pré-natal, a alta taxa de nascimentos de prematuros, a dificuldade de diagnóstico em crianças pequenas e vulnerabilidades socioeconômicas são algumas das causas apontadas.

“O número (de bebês mortos) é chocante. “Seria interessante saber o que aconteceu com as mães dessas crianças, porque já sabíamos que o número de grávidas infectadas no Brasil era alto.”, afirmou a demógrafa e coordenadora do Departamento de Saúde Global e População da Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard (EUA), Márcia Castro.

Para o infectologista pediátrico Flávio Cczernocha, não há, todavia, indício de que haja predisposição genética que pudesse levar à morte dos bebês.

A assistência precária à gestante, à parturiente e ao recém-nascido explicam os números, de acordo com ele. “O número não chega a ser tão surpreendente assim”, diz Cczernocha.

“Nossa assistência pré-natal é muito inadequada. A sífilis congênita é o que chamamos de sentinela da má assistência pré-natal. Porque é fácil de diagnosticar na grávida e de tratar.”

Portanto, a falta de pré-natal adequado leva também a mais partos de prematuros – bebês ainda mais vulneráveis a infecções em geral.

E os sintomas de coronavírus  em bebês são diferentes dos apresentados por adultos, o que leva a subdiagnóstico.

“Quanto mais novo o bebê, menos específicos os sintomas de qualquer doença. Vale para a covid também”, diz o especialista. “Manifestações respiratórias comuns nos adultos com a doença não são tão frequentes nos bebês. Lesões na pele e diarreia são os sintomas mais comuns.”

Vacinação de grávidas contra o coronavírus pode proteger bebês 

Fonte: Estadão

Foto: Shutterstock

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