A cobertura vacinal está em queda no Brasil

De acordo com o decreto nº 78.231, de 1976, é dever de todo cidadão submeter-se e os menores dos quais tenha a guarda ou responsabilidade, às vacinações obrigatórias definidas pelo calendário nacional de imunizações

Vamos falar sobre doenças preveníveis e porque as farmácias devem ser inseridas em um plano de ação amplo para melhorarmos os índices de cobertura vacinal.

Se temos, em um lado, o Brasil como referência mundial em vacinação com acesso gratuito a todas as vacinas recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), temos, do outro, considerável número de pessoas que têm deixado de comparecer aos postos de saúde para atualizar a carteira de vacinação, e de levar os filhos no tempo correto de aplicação das vacinas. De acordo com dados do Ministério da Saúde, a cobertura vacinal da população vem despencando, chegando ao final de 2021 com menos de 59% dos cidadãos imunizados. Em 2020, o índice era de 67% e em 2019, de 73%. O patamar preconizado como meta de cobertura satisfatória pelo Ministério da Saúde é de 95%.

Parte da nossa população desconhece diversas doenças visto que foram extintas pela ampla e bem-sucedida vacinação no Brasil e no mundo. Este é um dos principais motivos, aliado à desinformação vinda do movimento anti-vacina, que faz com que as pessoas tenham percepção enganosa de que não é preciso vacinar porque as doenças desapareceram.

A compreensão da importância da vacinação deve prevalecer. Aliada ao desenvolvimento científico e tecnológico amplamente crescente, ao trabalho realizado por gestores de saúde e ao senso de responsabilidade do cidadão, essa compreensão inevitavelmente leva a consciência de que vacinar crianças e adultos, significa não apenas protegê-los, mas sustentar uma condição de saúde coletiva alcançada com muito trabalho e esforço.

Inúmeras doenças graves podem ser controladas a nível populacional quando temos a vacinação como a principal arma. Até meados de 1980, a poliomielite causava paralisia em quase 100 crianças por dia no planeta, segundo dados da OMS. O Brasil chegou a registrar quase 27 mil casos da doença entre 1968 e 1989, quando a última notificação no país foi feita graças as campanhas anuais com alta adesão da população. No entanto, mesmo para a poliomielite já há muito erradicada no Brasil, foi emitido alerta pelo Ministério da Saúde e pela Organização Pan Americana de Saúde (OPAS) sobre possível retorno da doença oriundo dos baixos índices de vacinação. Em 2021, menos de 70% do público-alvo estava com as doses em dia, frente aos mais de 98% registrado em 2015.

História similar é vista com o sarampo. O Brasil registrava mais de 177 mil casos entre 1990 e 2000, mas conseguiu alcançar com esforço coletivo o certificado de eliminação da doença em 2016. Prevenível pela vacinação desde a década de 1930, a febre amarela fez milhares de vítimas no Brasil nos últimos anos e levou centenas a óbito. O país já havia contabilizado cerca de 1000 casos e 400 mortes em 55 anos (de 1960 a 2015), e chegou a alcançar a lamentável marca de mais de 2000 casos e 670 óbitos entre 2016 e 2018. Somado a isso e mesmo com campanhas anuais de vacinação bem conhecidas por nossa população, muitos não têm comparecido aos postos para receber a vacina de gripe. O resultado, mais uma vez, é o aumento de casos e mortes, com mais de 1.700 brasileiros mortos pelo vírus Influenza somente nos primeiros dois meses de 2022.

Essenciais na prevenção de adoecimentos e mortes, as vacinas têm a missão de proteger as pessoas pela geração de resposta imunológica ampla e duradoura que leva ao combate de vírus e bactérias que desafiam a saúde pública. Mas que são controláveis. Para chegarmos neste esforço coletivo, ora citado, ações complementares às campanhas de vacinação são necessárias e bem-vindas para que possamos resgatar os níveis de imunização que eram elevados do passado.

A população brasileira tem acesso gratuito as vacinas recomendadas pela OMS. Ao todo, são mais de 20 vacinas com orientações específicas para crianças, adolescentes, gestantes, adultos e idosos. Anualmente, mais de 300 milhões de doses de vacinas, soros e imunoglobulinas são distribuídas pelo Programa Nacional de Imunização (PNI) que recentemente incluiu em seu calendário a imunização contra a COVID-19. No entanto, mesmo para esta, apesar da grave crise social e de saúde enfrentada por todos desde início de 2020 até hoje, acompanhamos os baixos índices de adesão das famílias em especial na vacinação pediátrica.

Há quase três décadas, a Lei nº 8.069, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, torna obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. De acordo com o decreto nº 78.231, de 1976, é dever de todo cidadão submeter-se e os menores dos quais tenha a guarda ou responsabilidade, às vacinações obrigatórias definidas pelo calendário nacional de imunizações.

Em diferentes momentos a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio das falas públicas dos seus diretores, ressaltou a importância das vacinas como estratégia de saúde pública. Destaco a contribuição enviada para esse artigo, da servidora e diretora Meiruze Freitas, conforme se segue: “Aumentar a vacinação é uma questão de alta prioridade para a saúde nacional, uma vez que as estratégias de prevenção reduzem a pressão sobre os sistemas de saúde e favorece o crescimento econômico. Para melhorar a cobertura vacinal, o Brasil precisa de projetos estruturados e integrados, promovendo uma abordagem que seja capaz de considerar a vacinação ao longo da vida dos indivíduos. Segundo Freitas, as barreiras precisam ser superadas e de diferentes maneiras, por exemplo, com a adoção de novos modelos de prestação de serviços capazes de estender os cuidados preventivos de saúde, sem deixar de lado as ações educacionais capazes de transmitir conhecimentos sobre as vacinas e as doenças imunopreveníveis. Na mesma esteira, é urgente a necessidade de intensificar o combate as “fake news” e de ampliar o acesso as vacinas e a diferentes locais de vacinação.

Neste momento, vivenciamos a possibilidade de mais uma onda de Covid-19 em um cenário de baixa cobertura vacinal para as doses de reforço, momento em que novas sublinhagens da variante Omicron, a BQ.1 e a BE.9 recentemente identificada no Amazonas, tornam-se crescentes no Brasil. É imperativo que toda a sociedade e profissionais de saúde, e aqui em especial os profissionais farmacêuticos e os estabelecimentos farmacêuticos façam o papel de orientar a população em relação a esta importante ação de saúde coletiva. A farmácia é o estabelecimento de saúde mais próximo da população, aquele que o cidadão visita com a maior frequência. Devemos de forma muito urgente, usar este gigantesco potencial para voltarmos a ser um dos países referência em vacinação.

O futuro e o presente dos serviços de saúde no varejo farmacêutico brasileiro 

Fonte e foto: PhD em Ciências da Saúde, Pesquisadora do, Fiocruz/Instituto René Rachou e Professora na UGA- Universidade da Georgia (USA), Drª Rafaella Fortini Grenfell, com exclusividade para o Guia da Farmácia.

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