Novo remédio controla açúcar no sangue de pessoas com diabetes

Resultado de teste clínico mostrou que a tirzepatida foi capaz de normalizar os níveis de açúcar no sangue em 51% dos pacientes

Um novo remédio pode revolucionar o tratamento do diabetes tipo 2, a forma mais comum da doença. Dados de uma série de estudos fase 3 apresentados recentemente no Congresso Brasileiro de Endocrinologia e Metabologia (CBEM) mostram que a tirzepatida normalizou os níveis de açúcar no sangue em 51% dos pacientes. Para efeito de comparação, a taxa foi de 20% nos pacientes que tomaram a semaglutida, considerado o principal tratamento para a doença atualmente.

Além disso, os pacientes que utilizaram tirzepatida perderam, em média, 12,4 quilos, o dobro de redução em comparação à semaglutida.

“A tirzepatida se mostrou um medicamento superior aos que existem no mercado tanto na melhora do controle glicêmico quanto na redução de peso. Realmente é um marco na história da diabetes” diz o endocrinologista e pesquisador do Departamento de Endocrinologia da Escola Médica de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC – Rio) e do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia (IEDE/RJ), Alexander Benchimol.

A redução de peso possibilitada pelo novo medicamento também foi saudado como um divisor de águas, mas na luta contra a obesidade.

Normalização dos níveis de açúcar no sangue

Um dos estudos, o SURPASS-2, comparou a eficácia e a segurança da tirzepatida com a semaglutida em adultos com diabetes tipo 2.

No total, 1.879 pessoas participaram da pesquisa, que teve duração de 40 semanas.

Os resultados mostraram que 51% dos pacientes que tomaram tirzepatida 15 mg alcançaram níveis de hemoglobina glicada inferior a 5,7%, contra apenas 20% daqueles que tomaram semaglutida.

Portanto, esse exame é usado como medida para diagnóstico de pré-diabetes e controle do diabetes pois traça uma espécie de histórico do nível de açúcar no organismo dos últimos meses.

Já para pessoas com a doença, a meta de controle é ter a hemoglobina glicada inferior a 7%, valor foi alcançado por 92% dos voluntários que usaram tirzepatida. Para fator de comparação, o valor de 5,7% é encontrado em pessoas sem diabetes.

“Esse dado é uma mudança de paradigma e vai fazer com que a gente tenha que rediscutir o controle do diabetes porque é um nível de controle que não estávamos habituados”, avalia Benchimol.

Outro ponto considerado importante pelos especialistas é que esse benefício foi obtido sem o risco de hipoglicemia.

“Um dos efeitos colaterais de alguns medicamentos para o diabetes é a hipoglicemia. Já esse medicamento é de alta potência na redução da glicose e mesmo assim não causa hipoglicemia” , diz o endocrinologista e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolgia (Sbem), Rodrigo Moreira.

Melhora em menos tempo

Novos resultados do mesmo estudo e de sua continuação, o SURPASS-3, foram apresentados na reunião anual da Associação Europeia para o Estudo do Diabetes, realizado este mês, na Suécia. Eles revelam que adultos tratados com tirzepatida atingiram mais rapidamente as metas de glicose no sangue e perda de peso.

Os ensaios SURPASS-2 e SURPASS-3 compararam diferentes doses de tirzepatida (5, 10 e 15 mg) com a semaglutida ou uma insulina de ação prolongada.

Em média, os participantes tratados com todas as doses de tirzepatida reduziram sua hemoglobina glicada a um nível inferior a 7% em cerca de 8 semanas, em comparação com 12 semanas para aqueles que tomaram semaglutida e insulina.

Portanto, para atingir uma hemoglobina glicada de 6,5% ou menos, o tempo necessário foi de 12 semanas para a tirzepatida versus cerca de 16 semanas para a semaglutida e 24 semanas para a insulina.

Análises adicionais do SURPASS-2 descobriram que o tempo médio para atingir 5% ou mais de perda de peso foi de cerca de 12 semanas com as duas doses mais altas de tirzepatida (10 e 15 mg), em comparação com 24 semanas para semaglutida. Pode parecer pouco, mas uma perda de peso modesta de 5% está associada a melhorias clinicamente significativas nos problemas de saúde, em especial para pacientes com diabetes tipo 2.

“A velocidade que estamos vendo na redução da glicose e na perda de peso está além de qualquer outra coisa que temos disponível no momento e pode colocar os adultos com diabetes tipo 2 em uma posição melhor para prevenir complicações a longo prazo. Mas é importante lembrar que esses medicamentos devem ser usados ​​além da dieta e do exercício”, disse o líder do estudo Adie Viljoen, consultor médico metabólico e patologista químico do East and North Hertfordshire NHS Trust, no Reino Unido.

Eventos adversos

Os principais eventos adversos relatados foram de intensidade leve a moderada e incluíram náusea, vômito e diarreia. Todos esses sintomas diminuíram ao longo do tempo.

“A tirzepatida é um medicamento muito bem tolerado, com uma baixíssima incidência de efeitos colaterais. O principal é o enjoo nas primeiras semanas de uso”, diz o ex-presidente da Sbem.

Mecanismo de ação do novo remédio contra diabetes

Moreira explica que a tirzepatida é o primeiro produto de uma nova classe de medicamentos. Ela atua no organismo imitando a ação de hormônios – GLP-1 e GIP – que estimulam a produção de insulina e promovem a sensação de saciedade. A semaglutida, por exemplo, imita apenas a ação do GLP-1.

“Toda vez que a gente come, em especial carboidrato, nosso intestino produz duas substâncias: GLP-1 e GIP. Essas substâncias têm um efeito no pâncreas, melhorando a supressão de insulina, e no cérebro, diminuindo a fome e aumentando a saciedade. O medicamento tua como se fosse essas duas substâncias juntas” explica Moreira.

Neste ano, a tirzepatida foi aprovada pela FDA, agência que regula medicamentos nos Estados Unidos, para o tratamento de diabetes tipo 2, sob o nome comercial Mounjaro.

Ela é aplicada por meio de uma injeção subcutânea semanal, em seis opções de dose (2,5 mg, 5 mg, 7,5 mg, 10 mg, 12,5 mg e 15 mg).

De acordo com a farmacêutica Eli Lilly, que desenvolveu a tirzepatida, o aval para uso da droga já foi solicitado à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, se aprovado, pode estar disponível “em meados de 2023”. A agência confirmou que a substância está sob análise “dentro do prazo legal”.

Diabetes

O diabetes é uma doença causada pela falta ou má absorção de insulina, hormônio que promove o aproveitamento da glicose.

A longo prazo, o aumento de açúcar no sangue pode causar sérios danos ao organismo. O tipo 2 da doença representa 90% dos casos de diabetes no Brasil e é mais frequente em adultos, mas também está aumentando entre crianças e adolescentes.

Seu desenvolvimento está atrelado ao sobrepeso, além de hábitos de vida pouco saudáveis relacionados à má alimentação.

Todavia, o número de pessoas com diabetes não para de crescer.
De acordo com dados do Atlas do Diabetes, nos últimos dez anos houve um aumento de 26,61% no número de pacientes com a doença no Brasil.
Atualmente, o país ocupa a sexta posição mundial e a primeiro na América Latina, com 15,7 milhões de pessoas adultas com esta condição.
Até 2045, a estimativa é que a doença alcance 23,2 milhões de adultos brasileiros. No mundo, a tendência é a mesma. Por isso, a medicina não para de buscar tratamentos mais eficazes para combater a doença.
Fonte:  O Globo
Foto: Shutterstock

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