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Cuidado farmacêutico na interação de plantas medicinais com medicamentos para dislipidemia

Plantas medicinais como o alho e a alcachofra são muito utilizadas como anti-hiperlipidêmicos e, quando associadas a outros medicamentos, poderá ocorrer interação medicamentosa

As dislipidemias são caracterizadas pela presença de níveis elevados de lipídios, ou seja, gorduras no sangue e aumentam a chance de entupimento das artérias (aterosclerose) e de ataques cardíacos, acidente vascular cerebral ou outros problemas circulatórios, especialmente em fumantes. Podem ser classificadas em primária e secundária dependendo dos fatores que a desencadeiam. Situações como o alcoolismo e uso de altas doses de anabolizantes também podem alterar o perfil lipídico.

Dislipidemia primária, que tem origem genética, mas pode ser desencadeada por fatores que englobam o estilo de vida, como sedentarismo, tabagismo e maus hábitos alimentares. Dislipidemia secundária, que pode surgir a partir de uma série de outras doenças, como diabetes, hipotireoidismo, obesidade, insuficiência renal, doenças das vias biliares, síndrome nefrótica, síndrome de Cushing, anorexia nervosa e bulimia. Além de também estar associada ao uso de fármacos, como diuréticos em elevadas doses, β-bloqueadores, medicamentos para tratamento de acne, anticoncepcionais e terapia hormonal.

Medicamentos para o tratamento da dislipidemia têm por objetivos a redução de risco cardiovascular relevante pelo desenvolvimento da aterosclerose, a redução de eventos cardiovasculares, incluindo mortalidade, bem como a prevenção de pancreatite aguda associada à hipertrigliceridemia grave.  Quando se faz a anamnese do paciente, é necessário verificar se ele utiliza plantas medicinais/medicamentos fitoterápicos associados a outros medicamentos industrializados/manipulados contendo o fármaco sintético.  Popularmente, plantas medicinais como o alho e a alcachofra são muito utilizadas como anti-hiperlipidêmicos e, quando associadas a outros medicamentos, poderá ocorrer interação medicamentosa.  A seguir, informações sobre o alho e a alcachofra em relação às possíveis interações medicamentosas.

Allium sativum L. (Alho)

Recomendação:

Adjuvante no tratamento de hiperlipidemia, hipertensão arterial leve a moderada, sintomas de gripe e resfriado e auxilia na prevenção da aterosclerose.

Mecanismo de ação:

Em ensaios não clínicos o mecanismo da hipocolesterolemia e da hipolipidemia produzida pelo extrato de A. Sativum envolve a inibição da enzima hepática hidroximetilglutaril-CoA redutase (HMG-CoA redutase) e o remodelamento das lipoproteínas plasmáticas e das membranas celulares.

Em ensaios clínicos promove redução significativa do colesterol total, na lipoproteína de baixa densidade (LDL) e dos triglicerídeos, além do aumento na lipoproteína de alta densidade (HDL).  Estudos clínicos evidenciaram que o alho ativa a fibrinólise endógena.

Interações medicamentosas:

Interação potencial com a varfarina. Não pode ser usado com anticoagulantes orais, heparina, trombolíticos, antiplaquetários e anti-inflamatórios não esteroides devido ao risco de sangramento. Além disso, sua associação com inibidores de protease pode reduzir as concentrações séricas dessa classe, aumentando o risco de resistência antirretroviral e falha do tratamento. Diminui a eficácia da clorzoxazona. Também poderá aumentar o efeito de fármacos hipoglicemiantes (insulina e glibenclamida). Fármacos metabolizados pelo sistema hepático enzimático P450  poderão ser afetadas pela administração de alho. Também, interage com anti-hipertensivos inibidores da ECA, tuberculostáticos (isoniazida), bloqueadores do canal de cálcio, antifúngicos, glicocorticóies, analgésico opióide, antiaaritmicos da classe I – subgrupo 1B, benzodiazepínicos e contraceptivos (estrogênio)

Cynara scolymus L. (alcachofra)

Recomendação:

Antidispéptico, antiflatulento, diurético, colerético e colagogo. Ajuda na prevenção da aterosclerose. Coadjuvante no tratamento da dislipidemia mista leve a moderada e como coadjuvante nos sintomas do intestino irritável.

Mecanismo de ação:

Estudo em cultura de células de hepatócitos de ratos o extrato aquoso seco de folhas inibiu a biossíntese de colesterol. O cinarosídeo e sua aglicona (luteolina) são os principais responsáveis por essa atividade. Em ensaios clínicos farmacológicos (Fase IV) evidenciou redução significativa dos sintomas de dor, desconforto abdominal, gases e náuseas e foi observado que a secreção intraduodenal biliar aumentou.

Interações medicamentosas:

Promove a redução da eficácia de medicamentos que interferem na coagulação sanguínea, como aspirina e anticoagulantes cumarínicos (varfarina). Pode diminuir as concentrações sanguíneas de fármacos metabolizadas por CYP3A4, CYP2B6 e CYP2D6 porque C. scolymus é indutora dessas enzimas.

Quando administrada com diuréticos (furosemida, clortalidona, droclorotiazida indapamida), estudo em animais resultou em queda de pressão arterial por redução de volume sanguíneo (aumento de diurese), além de aumentar a excreção de porássio podendo causar hipocalemia.

Observações Importantes

  • A formação da placa aterosclerótica inicia-se com a agressão ao endotélio vascular por diversos fatores de risco como dislipidemia, hipertensão arterial ou tabagismo.
  • A decisão quanto ao uso de terapia farmacológica para hiperlipidemia baseia-se no defeito metabólico específico e no seu potencial de causar aterosclerose ou pancreatite.
  • Ingestão de fibras solúveis deve fazer parte da rotina alimentar.
  • Controle de peso e redução de bebida alcoólica são essenciais para a qualidade de vida de todos.
  • Prática regular de atividade física é uma necessidade e tem impacto em várias morbidades e comorbidades.

Fontes consultadas:

  • Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Memento terapêutico. Farmacopeia Brasileira. 1. ed. Brasília: ANVISA, 2016.
  • Centro Paulista de Investigação Científica (CEPIC). Dislipidemias: conheça as causas, sintomas e tratamentos. https://www.cepic.com.br/blog/causas-e-tratamentos/dislipidemias/ 31 de outubro de 2022
  • Katsung BG, Masters SB, Trevor AJ.(orgs.) Farmacologia básica e clínica. 12ª ed., Porto Alegre: AMGH, 2014.)
  • Nicoletti MA. et al. Fitoterápicos. Principais interações medicamentosas. São Paulo: Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais – Brasil, 1.ed. (2012) 118p.
  • Nicoletti MA. et al. Principais interações no uso de medicamentos fitoterápicos. Infarma. 2007;19(1/2):32-40.
  • Sociedade Brasileira de Cardiologia. Falud AA et al. Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção da Aterosclerose. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 2017; 109(1).92p.
  • Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM). 10 coisas que você precisa saber sobre a dislipidemia. Disponível em: https://www.endocrino.org.br/10-coisas-que-voce-precisa-saber-sobre-dislipidemia/

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Fonte: Farmacêutica responsável pela Farmácia Universitária da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, Maria Aparecida Nicoletti, com exclusividade para o portal Guia da Farmácia.

Fotos: Shutterstock e Divulgação

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