O que querem os idosos

Consumidor sênior é criterioso, informado e qualifica o atendimento que recebe. Estabelecer um vínculo mais próximo com ele, premiando sua fidelidade, pode ser uma estratégia promissora na conquista de um cliente que só faz crescer   

Nos próximos dez anos, um em cada seis consumidores terá mais de 60 anos de idade no Brasil. Segundo previsões do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esse grupo representará um contingente de 35,4 milhões de pessoas – quase a população atual da Califórnia, o estado mais populoso e rico dos Estados Unidos da América (EUA), que soma 37,3 milhões de habitantes. E a tendência é de crescimento. Em 2050, a população mais velha representará pouco mais de um quarto (26%) do total de brasileiros. O perfil demográfico nacional segue tendência global de envelhecimento. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de dois bilhões de pessoas terão 60 anos ou mais nos próximos 35 anos, representando um quinto do total de habitantes do planeta. Vale dizer que nesse período haverá mais pessoas idosas do que menores de 15 anos. 

A população brasileira já está de cara nova, mais parecida com a distribuição de países desenvolvidos. Segundo pesquisa realizada pela Nielsen, lares com pessoas acima de 50 anos já representam 38% dos domicílios no Brasil e 40% dos gastos com Fast-Moving Consumer Goods (FMCG), ou melhor, produtos de giro rápido, em uma tradução livre. “É fato que as pessoas estão envelhecendo com mais saúde, mais renda, mais acesso à tecnologia, especialmente nas camadas mais abastadas da população”, salienta a professora do curso de Trade Marketing da Pós-Graduação da ESPM-SP, Tania Zahar Mine. Ao analisar a representatividade da renda dos mais velhos, constatou-se que, segundo o Data Popular, os rendimentos da população com 60 anos ou mais somaram R$ 446 bilhões em 2013, representando 21% do total da massa dos rendimentos. “Isso quer dizer que os idosos contribuem mais com os rendimentos do que com sua fatia na população, que é de 13%”, diz Tania. “Os idosos, como outras faixas etárias da população, possuem suas próprias necessidades de acordo com sua maturidade e experiência de vida.”

Mudanças estratégicas

Tal mudança de perfil demográfico provocará, segundo os especialistas, alteração importante nas ações de marketing das empresas. Uma vasta gama de setores – do marketing e propaganda das marcas, passando pelas vendas no varejo, finanças, transporte, moradia e chegando aos serviços mais diversos – será impactada pelas alterações do mercado consumidor. As empresas terão de entender o que quer esse público. A consultora especializada em varejo farmacêutico, Silvia Osso, dá uma pista. “Os clientes idosos experimentam o novo por razões diferentes dos consumidores mais jovens. Em vez de comprar para estar na moda, eles aprovam a novidade que atender a uma necessidade específica e real de consumo.” Outra característica do idoso, segundo a analista de mercado da Nielsen, Mariana Morais, é que seu ciclo de compra é mais rápido e ele vai mais vezes ao ponto de venda. Geralmente, durante a semana, no horário comercial. “Apesar de não gastar mais do que outros públicos, ele está aberto a novidades – 24% das donas de casa com mais de 50 anos, por exemplo, costumam se sentir tentadas a comprar novidades, outras 10% compram novidades quando recomendadas”, diz a analista. 

“Antigamente, os idosos ficavam revoltados com o espelho e iam se fechando em seu envelhecimento e se afastando da sociedade”, aponta a diretora do Instituto de Estudos em Varejo (IEV), Regina Blessa. “Hoje, há um inconformismo contra o inevitável, incentivado pelas propagandas que visam o consumo de produtos de retardamento do envelhecimento, e isso gerou um novo tipo de idoso, que se cuida e não se deixa acabar simplesmente.” Para a diretora, esse movimento é uma evolução natural de demanda e se assemelha a outros momentos de reformatação do mercado. “Anos atrás, a família toda usava o mesmo sabonete e creme dental. Hoje, separam cada um seus xampus, seus cremes, e há uma profusão de produtos nos banheiros e armários. A oferta cresceu tanto que já não sabemos se estamos atualizados com o que existe.” 

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Comportamento renovado

A população idosa está com a expectativa de aproveitar a vida de maneira saudável e produtiva, aponta o vice-presidente da Prati-Donaduzzi, Eder Maffissoni. “Como indústria, precisamos estar atentos a essa realidade que vem revelando um novo nicho de mercado consumidor, com comportamentos, estilos de vida e necessidades específicas. Temos como desafio desenvolver produtos e serviços que atendam aos anseios desse público”, conclui o executivo. Silvia Osso vê outra característica do consumidor sênior. “O idoso, sobretudo o das classes mais altas, muitas vezes consome de forma denominada consumo compensatório. Como se fosse uma autorrecompensa pelos sacrifícios e economias que teve de fazer durante a vida enquanto tinha que trabalhar duro e criar os filhos. Nesse tipo de consumo, as pessoas se importam menos com o fator preço em suas decisões e mais com a satisfação proporcionada.” De fato, segundo levantamento da A.T. Kearney, com o gasto mundial projetado para atingir US$ 15 trilhões ao ano até o final desta década, a crescente faixa de consumidores maduros terá dinheiro para gastar.

Como os idosos encaram essas mudanças? 

A Nielsen foi atrás, buscando entender os anseios desse público, e realizou a Pesquisa Global Sobre Envelhecimento, que entrevistou mais de 30.000 internautas em 60 países (Brasil incluso). Para a maioria dos entrevistados ao redor do mundo, não ter a autossuficiência necessária para cuidar das necessidades básicas na velhice (58%), a perda da agilidade física (57%) ou da capacidade mental (51%) são alguns dos receios mais frequentes. Entre outras constatações, a principal delas revela que as indústrias estão muito despreparadas para satisfazer as necessidades dos consumidores mais velhos. Faltam produtos para atender às demandas nutricionais específicas. Mais de quatro em cada dez entrevistados não conseguem encontrar alimentos que satisfaçam necessidades especiais de alimentação (45%). Segundo os idosos, embalagens que contenham porções menores de alimentos (44%) ou que tragam informações nutricionais claras nas embalagens (43%) também são pontos não atendidos.

Metade dos entrevistados ao redor do mundo critica as embalagens, entre outros motivos, porque é difícil encontrar rótulos de produtos que sejam fáceis de ler, e 43% têm dificuldade para encontrar aquelas que sejam fáceis de abrir. Também a comunicação tem sido falha com eles. Quarenta e seis por cento dos entrevistados acham a propaganda essencial para conhecer as marcas, outros 23% para ter mais informações, mas eles não se sentem representados na publicidade. Mais da metade (51%) dos que falaram à Nielsen diz que a propaganda não reflete consumidores mais velhos. Outros citam a falta de conveniência nas lojas como dificuldade para as compras. 

Público de representatividade

De acordo com o vice-presidente sênior de Consumer da Nielsen, Todd Hale, as constatações da pesquisa servem de alerta para fabricantes, varejistas e marqueteiros de que é preciso empreender esforços para alcançar e atender melhor às necessidades dos idosos. “À medida que a população idosa global está aumentando em número, seu poder aquisitivo também está crescendo, pois muitos idosos têm mais tempo para fazer compras e gastar que os consumidores mais jovens”, sustenta Hale, destacando, contudo, que há ainda muito a ser feito para atender bem os idosos. “É um mercado que as empresas estão começando a olhar com outros olhos”, completa a gerente de marketing de Plenitud, da Kimberly-Clark, Carolina Gormezano. “Os idosos possuem necessidades diferentes que precisam ser compreendidas. Nos últimos dois anos, diversas categorias foram criadas pensando em pessoas com mais de 50 anos, principalmente quando se trata das mulheres”, diz a executiva.

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Qualidade de vida e liberdade para consumir

Quase metade dos entrevistados da Nielsen (45%) declara que uma alimentação saudável é a maior preocupação após a aposentadoria. Outras prioridades incluem se manter em forma, física e mental (78%), passar mais tempo com a família (58%) e ter uma vida social ativa (37%). “Cuidar da saúde em todas as idades é uma característica de nossa época. É o ideal sintetizado na expressão ‘qualidade de vida’”, resume o presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini. “Essa preocupação naturalmente aumenta quando as pessoas envelhecem.” 

Na lista das categorias que mais vendem e crescem em domicílios com pessoas de 65 anos de idade ou mais, estão medicamentos e vitaminas para o envelhecimento do corpo, constata o estudo da Nielsen. Entretanto, os idosos também querem consumir produtos diversos, como vinhos, alimentação individualizada, cosméticos, e outros itens afins. “O uso de tecnologia pode facilitar muito o aprimoramento do relacionamento entre varejo e consumidor”, acredita Tania, da ESPM-SP. “E-commerce amigável, atendimento diferenciado para televendas e lojas físicas, serviço especializado ao consumidor, entregas mais ágeis, presença em redes sociais, tudo isso pode contribuir para atender melhor o consumidor mais velho. Vale a pena investir nos programas de relacionamento, a fim de estabelecer um vínculo mais próximo com esse público, premiando sua fidelidade.”

Atendimento diferenciado

Há uma grande faixa entre os 60 e 85 anos de idade que não são dependentes de ninguém e que vem crescendo a passos largos. É preciso preparar os marqueteiros e designers para eles, e treinar os lojistas para atendê-los da melhor forma possível. Isso mudará o mercado.

 Para fidelizar o idoso, o importante é caprichar no atendimento personalizado, com atenção e cuidados especiais, ensina Silvia Osso. “Atendimento com mais simpatia, gentileza e paciência são correspondidos em vendas”, sustenta a consultora, destacando que os idosos costumam ir, em média, duas vezes por semana à farmácia e apresentam um tíquete médio de R$ 60. “O idoso é o melhor cliente da farmácia. É o que mais faz visitas e o que mais vai consumir a cada ano”, acrescenta Regina. “Isso é uma característica do idoso em vários países”, vai além Mariana, da Nilsen. “De fato, as drogarias sempre estiveram preparadas para atender os idosos, pois tradicionalmente esse público é frequentador da farmácia”, comenta o presidente da Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar), Edison Tamascia. Da base de 3,5 milhões de clientes das farmácias associadas à entidade, 870 mil (25%) já passaram dos 60 anos.

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