Em 2014, o crescimento não veio, a inflação subiu e as contas públicas se deterioraram. “Foi um erro de diagnóstico do governo, que se afastou do tripé econômico − superávit fiscal, câmbio flutuante e centro da meta de inflação − e insistiu no estímulo ao consumo, não percebendo que o problema não era de insuficiência de demanda, mas de oferta”, revela o economista da GO Associados, Alexandre Seijas de Andrade.
No último ano, em particular, o País se viu envolvido em uma tempestade de dados negativos. O setor industrial é o que mais tem sofrido para retomar crescimento.
Na contramão do setor, a indústria farmacêutica mantém a média de crescimento de dois dígitos registrado nos cinco últimos anos. De acordo com a consultoria especializada em mercado farmacêutico IMS Health, entre outubro de 2013 e o mesmo mês de 2014, a indústria cresceu 14%, fechando com faturamento de R$ 64,4 bilhões, com mais de 3 bilhões de embalagens vendidas.
“É uma característica própria do setor farmacêutico um nível de elasticidade sobre as flutuações da economia”, revela o presidente da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Antônio Britto. “Por razões óbvias, a compra de medicamento não pode ser um item eletivo de cortes. No caso brasileiro, há ainda um segundo fator que é a enorme insuficiência do gasto com relação a medicamentos – a família brasileira tem um consumo absolutamente abaixo da sua necessidade, na média dos casos.”
O presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini, destaca que o setor conseguiu se adaptar à realidade nacional. “A inserção, na última década, de dezenas de milhões de consumidores das classes D e E ao mercado criou uma base sustentável ao segmento farmacêutico. Indústria, atacado e varejo souberam tirar proveito dessa situação para impulsionar os seus negócios. Enquanto o PIB brasileiro crescia a taxas de um dígito baixo, o setor registrou crescimento de dois.”
Apesar dos bons resultados, é preciso ficar atento à maior pressão nos custos de fabricação. Sobretudo com mão de obra, insumos e matérias-primas importadas, cujas cotações internacionais subiram no ano passado e ficaram mais elevadas por causa da desvalorização do real.
Mussolini pontua que a questão recorrente em 2014 foi a queda de rentabilidade das empresas, provocada pela regra de reajuste de preços que impede a correta reposição de custos e desconsidera os ganhos de produtividade. “Em 2014, o governo autorizou um reajuste médio de 3,52%, ante um aumento médio dos custos de produção das empresas de 13% a 18% no ano anterior, principalmente com pessoal, insumos (majoritariamente importados, que sofreram o impacto da variação cambial), material de embalagem (plástico, alumínio e papelão) e energia (elétrica e fóssil). No período de 2006 a 2013, enquanto a inflação geral acumulada foi de 49,13%, pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e os aumentos de salário concedidos pelo setor somaram 67,77%, o reajuste de preços dos medicamentos ficou muito abaixo destes patamares, somando 35,76%, na média. Portanto, a queda de rentabilidade é um fator preocupante, podendo impactar os investimentos”, sublinha o presidente do Sindusfarma.
Positividade recorrente
Apesar disso, as perspectivas para o setor farmacêutico no Brasil são, em princípio, favoráveis, destaca o executivo do Sindusfarma. “O ano de 2015 vai começar com certo grau de incerteza, tendo em vista a desaceleração da economia em 2014. Mas, mesmo assim, se a taxa de desemprego permanecer baixa e a inflação estiver sob controle, o Sindusfarma projeta para 2015 um crescimento de 12% a 13%”, afirma o executivo, lembrando que o panorama dos próximos anos vai depender do plano econômico do novo governo.
“Se a presidente Dilma Rousseff criar em seu segundo mandato as condições necessárias para a retomada dos investimentos, por meio de medidas, como controle de gastos públicos, redução da carga tributária e melhoria da infraestrutura, acreditamos que o País continuará por muito tempo a ser promissor para a indústria farmacêutica e os demais elos da cadeia.”
O executivo destaca que, em 2014, enquanto os principais mercados farmacêuticos cresceram 1% ou 2%, o faturamento da indústria farmacêutica no Brasil aumentou cerca de 15%. Além disso, as compras governamentais diretas e programas de acesso, como o Aqui Tem Farmácia Popular, vêm crescendo ano a ano. Sendo assim, na visão de Mussolini, o Brasil deverá continuar a atrair empresas e investidores internacionais interessados em explorar as potencialidades do setor. “Ainda mais se a esperada estabilização econômica nos Estados Unidos e na Europa se confirmar, o que poderá canalizar mais recursos para o País”, diz.
Desempenho real
Para o gerente de pesquisa e desenvolvimento da Natulab, Olavo S. Rodrigues, o mercado farmacêutico poderia ter tido resultados ainda melhores em 2014, mas está confiante. “Esperamos para 2015 um ano desafiador e deveremos estar atentos à inflação e às variações do câmbio. A empresa pretende ampliar seus investimentos no parque fabril, na aquisição de novas tecnologias e, principalmente, no desenvolvimento de novos produtos. O momento da Natulab é de manter o crescimento”, revela o executivo.
Já a Pfizer se mostra ainda mais otimista. “Estamos confiantes de que, em 2015, conseguiremos avançar no mercado brasileiro”, afirma o diretor de desenvolvimento de negócios da Pfizer, Mario Levada. “Temos a expectativa de lançar novos medicamentos no País, contemplando necessidades médicas não atendidas e proporcionando tratamentos cada vez mais inovadores aos pacientes. Para isso, a companhia investe fortemente em pesquisa. Globalmente, são cerca de US$ 7 bilhões por ano na descoberta de novos produtos. Esse foco em pesquisa e inovação deve permanecer consistente em 2015.”
Fonte: IMS Health
Característica específica
No segmento de medicamentos fitoterápicos, a taxa de crescimento também foi positiva em 2014, contudo, com um percentual mais discreto do que no ano anterior: 3,65% em unidades e 9,32% em valores, segundo levantamento do IMS Health divulgado pela Associação Brasileira das Empresas do Setor Fitoterápico, Suplemento Alimentar e de Promoção da Saúde (Abifisa).
De acordo com a presidente do Conselho Diretivo da Abifisa, Anny Trentini, nos últimos quatro anos, o segmento cresceu aproximadamente 22% em unidades vendidas e 56% em valores, resultado muito positivo, considerando o cenário de instabilidade econômica mundial que desacelerou vários setores da economia.
“Mesmo com uma esperada instabilidade do mercado brasileiro devido a questões político-econômicas, esperamos para 2015 um melhor desempenho nas vendas de produtos fitoterápicos”, afirma. “A busca por terapêuticas menos agressivas e hábitos de vida mais saudáveis tende a ampliar o número de consumidores do segmento que, a cada ano, busca mais produtos inovadores e sustentáveis.”
Entre os de maior sucesso em 2014, a categoria de produtos vasoprotetores, como a castanha-da-índia, foi a que apresentou aumento significativo no ano, superior a 40 %, comparado com o mesmo período de 2013, revela Anny, lembrando que o ano foi bastante intenso em termos de regulação do setor.
“Após longos debates entre associações representativas setoriais e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), foi finalizado o novo marco regulatório de fitoterápicos. Em maio, foi publicada a RDC 26/14 estabelecendo as regras para registro do produto.” Segundo a executiva, foram definidas duas categorias: medicamento fitoterápico (MF), que são aqueles cuja segurança e eficácia estão baseadas em evidências clínicas, e a de produto tradicional fitoterápico (PTF), com segurança e efetividade fundamentadas na tradicionalidade de uso por período mínimo de 30 anos, concebidos para ser utilizados sem necessidade de supervisão médica, em condições clínicas brandas.
Outra novidade do regulamento é a possibilidade da notificação para os fitoterápicos previstos no Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira, desde que atendidas determinadas condições. “Todos são PTFs, sendo que a notificação já possibilita a imediata fabricação, importação ou comercialização do produto”, explica Anny Trentini.
Autor: Marcelo de Valécio