Dor de cabeça: consequências do novo Coronavírus

Grande parte da população nunca havia enfrentado uma situação semelhante a uma pandemia. O novo cenário fez aumentar a exposição a alguns gatilhos da dor de cabeça, como estresse e ansiedade

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a enxaqueca atinge em torno de 15% da população mundial. No Brasil, estima-se que mais de 30 milhões de pessoas sofram com essa doença, mas a chegada da pandemia fez o número de queixas aumentar. Para aqueles não tinham dor de cabeça recorrente, registrou-se uma maior frequência de crises. Em pacientes que já conviviam com o quadro previamente, houve piora da intensidade das crises.

Na Clínica Personal da Central Nacional Unimed, as queixas de cefaleia de baixa e moderada intensidade são as causas mais frequentes de procura espontânea por atendimento. Com a quarentena, houve um aumento de aproximadamente 50% desse tipo de queixa.

De acordo com o médico da família, Dr. Ricardo Nishimori – que atua na clínica –, esse aumento de demanda é algo esperado e que comumente acontece durante epidemias e pandemias. “No entanto, essa proporção de aumento surpreendeu a todos, da mesma forma que a intensidade e amplitude (da situação do novo Coronavírus).”

O home office é um dos gatilhos para o problema, gerando crises de enxaqueca e cefaleia. A qualidade ergonômica do local de trabalho em casa também pode ser uma vilã da saúde e bem-estar. Cadeiras e mesas mal adaptadas provocam posturas viciosas, causando contraturas musculares no pescoço e nos ombros, sentidas como se fossem dores de cabeças.

Como proceder em casos de dor de cabeça na pandemia?

AUTOCUIDADO

Neste cenário, o autocuidado torna-se muito importante para evitar visitas a hospitais sem necessidade. O paciente sem histórico de doenças crônicas ou sequelas motoras prévias deve verificar se o padrão da cefaleia é similar às crises anteriores e recordar se houve a ocorrência de traumas nas últimas semanas.

CEFALEIA X COVID-19

Nem sempre cefaleia por Covid-19 vem acompanhada de outros sintomas, como febre, cansaço e problemas respiratórios. O que se observa na maioria dos casos é que a dor é de início súbito, bilateral, latejamento ou pressão que piora com movimentos e geralmente é resistente a analgésicos.

SINAIS DE ALERTA

Presença de diminuição de força em membros ou confusão mental são sinais que chamam atenção. Casos com essas alterações necessitam de avalição em pronto atendimento.

PAPEL DO FARMACÊUTICO

Esse profissional tem um papel relevante no cuidado com o paciente. Muitos quadros de cefaleia podem receber com segurança as primeiras orientações desse profissional. Em caso de shoppers recorrentes, o farmacêutico deve verificar com que frequência o cliente está necessitando de uso de medicamento analgésico. Se isso for mais do que duas vezes no mês, é válido indicar uma avaliação médica especializada em cefaleia.

Fontes: médico da família da Clínica Personal da Central Nacional Unimed, Dr. Ricardo Nishimori; neurologista e membro titular da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), Dra. Célia Roesler; e neurologista do Hospital Santa Paula, Dr. Alexandre Bossoni

“Outro fator importante são as demandas concorrentes. Se você está em casa trabalhando, possivelmente, está em contato com os filhos, com a rotina da casa e não consegue se isolar para se concentrar apenas no trabalho.

Acabamos sendo obrigados a resolver diversos assuntos ao mesmo tempo. Esse comportamento consome muita energia mental e nos deixa extenuados no fim do dia”, complementa o neurologista do Hospital Santa Paula, Dr. Alexandre Bossoni.

Os hábitos alimentares também mudaram. Por indulgência, houve aumento na ingestão de carboidratos e de bebidas alcoólicas – muitas vezes consumidos em horários desregrados. Junto a esse cenário, viu-se a queda na prática de exercícios físicos e a quase normalização do sedentarismo. Por fim e não menos importante, o isolamento, as restrições de circulação e o receio de contrair o novo Coronavírus trouxeram ansiedade, tristeza e estresse.

“Os fatores emocionais estão diretamente ligados com o metabolismo do organismo, como a ativação intensa do sistema nervoso autônomo simpático que, entre outras funções, promove a maior liberação de glicose pelo fígado, e o aumento da frequência cardíaca. Essas duas alterações metabólicas, isoladas ou somadas, podem se tornar gatilhos para uma crise de cefaleia”, detalha o Dr. Nishimori.

Com tantos impactos nocivos em diferentes esferas da vida cotidiana, a pandemia acabou por formar o cenário perfeito para a aumento nas queixas de cefaleia. “As doenças caracterizadas por crises recorrentes de dor de cabeça têm uma alta correlação com o meio ambiente físico e psíquico das pessoas. Todo estresse, mudança de rotina, sedentarismo, mudança de alimentação, alteração de rotina de sono, isolamento social, aparecimentos de sintomas depressivos e ansiosos geram mudanças no cérebro que facilitam o aparecimento de dores de cabeça”, afirma o Dr. Nishimori.


É possível prevenir?

O ideal é que as orientações sejam individualizadas a cada paciente, de acordo com o diagnóstico do tipo de cefaleia e, principalmente, dos gatilhos para as crises de dor de cabeça. No entanto, a adoção de alguns hábitos específicos é benéfica para qualquer indivíduo.

“Sempre sugerimos aos pacientes que tentem manter uma rotina no horário do sono e que pratiquem exercícios físicos pelo menos três vezes na semana. Deve-se também fazer uma dieta equilibrada, ingerir menos bebida alcoólica, tomar pelo menos 15 minutos de sol por dia e, se possível, praticar meditação”, orienta a neurologista e membro titular da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), Dra. Célia Roesler.

DICAS DO GUI

Dores de cabeça: enxaqueca ou cefaleia, entenda as diferenças

Cefaleia é o termo médico para designar dor de cabeça. A medicina reconhece vários tipos de cefaleias, que se dividem em primárias e secundárias

PRIMÁRIAS

Enxaqueca: doença multifatorial, tem influência da genética, dos hormônios e de substâncias que se encontram alteradas no cérebro. Existe uma predisposição interna e as crises podem aparecer do nada, mas, geralmente, ocorrem desencadeantes externos por excessos alimentares, sobrecargas físicas, metabólicas, emocionais, psicológicas e ambientais.

Cefaleia tensional: em geral, é mais leve que a enxaqueca e não apresenta sintomas mais intensos, como incômodo com luz, barulho e cheiros. A dor é apresentada em peso ou aperto, nos dois lados da cabeça ou na cabeça toda, não lateja, não provoca enjoo ou vômitos e não piora com esforço físico.

Cefaleia em salvas: é definida como uma doença neurológica e conhecida como uma das piores dores de cabeça existentes. Ao contrário da enxaqueca, afeta mais homens que mulheres, acomete apenas um lado da cabeça, mais na região da fronte e dos olhos, acompanhada de lacrimejamento, vermelhidão nos olhos, entupimento nasal, coriza, suor no rosto e queda da pálpebra.

SECUNDÁRIAS

São aquelas em que a dor de cabeça é gerada devido a um problema extra, como tumor cerebral, sinusite, batidas na cabeça, aneurisma, uso de substâncias ou a abstinência delas.

Fonte: Associação Brasileira de Cefaleia em Salvas e Enxaqueca

Também é indicada a ingestão de pelos menos dois litros de líquidos ao dia, baixo consumo de produtos industrializados e a adequação do ambiente de trabalho para o home office, tanto o ambiente familiar, quanto a estrutura física da casa. Outro ponto importante é fazer as mudanças aos poucos para que sejam incorporadas à vida cotidiana de maneira saudável.

“Não adianta querer mudar a vida inteira do dia para noite. Isso geralmente dá errado, causa frustração e sentimento de impotência. O importante é caminhar e perceber quais os acontecimentos e fatores da vida que o estão fazendo falhar na mudança de alguns hábitos. Reconhecendo essas falhas, é mais fácil corrigi-las e melhorar a qualidade de vida”, aconselha.

De olho no futuro

Edição 336 - 2020-11-11 De olho no futuro

Essa matéria faz parte da Edição 336 da Revista Guia da Farmácia.