Como funciona a vacina inalável contra Covid em análise pela Anvisa

Já em uso na China, imunizante produziu boa resposta imunológica, segundo resultados publicados na The Lancet

No fim do ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa ) recebeu o pedido de análise de uma nova vacina contra a Covid-19. Chamado de Convidecia Air, o fármaco traz uma diferença bastante importante em comparação aos demais disponíveis hoje no mercado: em vez de injetável, ele é inalável e indolor.

Embora seja uma novidade no país, o produto já está sendo usado na China como dose de reforço nos cidadãos vacinados com outros imunizantes.

Em vídeo publicado na internet, o governo chinês exemplifica a aplicação do produto, que é colocado em um copo de plástico com bico e deve ser aspirado pelo paciente. Toda ingestão leva menos de 30 segundos.

O imunizante foi desenvolvido pela chinesa CanSinoBIO, no entanto, no Brasil está sob a responsabilidade da biofarmacêutica nacional Biomm.

O presidente da companhia, Heraldo Marchezini, destaca que a possibilidade de uma vacina aplicada pelas vias orais já era discutida desde o início da pandemia, mas, em razão da emergência global, as injetáveis, que eram amplamentes conhecidas, foram as mais utilizadas.

“Essa é uma vacina que combina o adenovírus [mesma tecnologia usada em AstraZeneca e Janssen], que já tem a sua segurança comprovada e está em utilização na sua forma intramuscular, com uma tecnologia de aerossol de uma máquina já presente no mercado brasileiro. Essa combinação faz com que sua apresentação seja na versão inalável”, diz Marchezini.

Assim como as outras disponíveis no país, a Convidecia Air se destina a reduzir o risco de uma forma grave da doença, e não a evitar, dessa maneira, a contaminação pelo vírus.

A diferença é que ela age no mesmo caminho onde o vírus penetra, pela mucosa nasal ou oral, então funciona como uma primeira linha de defesa do corpo humano para que a infecção perca força logo no início. A tecnologia é muito parecida com a usada no produto em gota, como o de poliomielite.

“As vacinas de mucosa têm uma vantagem, que é defender o organismo da penetração de vírus respiratórios, agindo com os anticorpos de mucosa, que evitam a invasão”, explica a médica pediatra e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai.

“Esse tipo conduz a resposta imunológica de mucosa e anticorpos no sangue, com o objetivo de evitar tanto a infecção quanto a transmissão da doença”, define.

De acordo com a Biomm, a documentação da vacina inalável foi submetida à Anvisa em novembro do ano passado, complementando um dossiê com dados da Convidecia na versão injetável entregue em maio.

Em decisão publicada na última segunda-feira (9), sem explicar os motivos, o órgão de saúde indeferiu a solicitação de registro definitivo da versão injetável, mas ainda deve decidir sobre a versão inalável, que traz a mesma composição medicamentosa.

A Biomm afirmou que vai recorrer da decisão por meio de um recurso administrativo, visto que o imunizante já foi aprovado por agências reguladoras de outros países. A empresa informa ainda que, caso consiga o aval definitivo do órgão, inicialmente as vacinas serão importadas e, depois, fabricadas na planta biofarmacêutica própria, localizada em Nova Lima (MG).

A reportagem entrou em contato com a agência federal para saber o status de aprovação da Convidecia Air, mas, por questões legais de confiabilidades, a Anvisa disse não se manifestar sobre os medicamentos em análise.

Por que ainda é importante criar vacinas contra a Covid -19?

Se aprovada pela Anvisa, a Convidecia Air chega em um momento em que – pelo menos no Brasil – a maioria da população já está imunizada contra a Covid-19.

No entanto, conforme relatam os cientistas, a tendência é que a aplicação de vacinas contra o vírus entre para o calendário anual, como ocorre com a da gripe, por exemplo, que tem de ser aplicada sazonalmente.

“A ciência está evoluindo, e estamos vendo o que seria uma segunda onda de vacinas, criadas a partir de plataformas diferentes e que podem levar a resultados melhores”, explica Ballalai. “As que temos hoje impedem a complicação dos casos, mas não evitam a infecção pelo vírus”.

Nesse contexto, a vacina inalável surge como mais uma opção para a população, com uma eficácia comprovada por diversos cientistas. Em uma publicação na revista The Lancet, uma das principais revistas científicas do mundo, um grupo de pesquisadores avaliou o fármaco e atestou sua segurança e imunogenicidade, especialmente para aplicação como terceira dose e em reforço à CoronaVac, medicação mais aplicada no Brasil.

“Em conclusão, os nossos resultados mostraram que uma imunização de impulso heterólogo com um Ad5-nCoV aerossolizado em adultos previamente vacinados é segura e altamente imunogênica, e provocou concentrações de NAbs significativamente mais elevadas do que uma terceira dose homóloga de CoronaVac”, relatou o grupo.

Marchezini, da BioMM, pontua que esta versão é ainda mais significativa, porque usa apenas um quinto do material necessário para produzir uma vacina intramuscular. “É uma questão econômica importante, porque você reduz a dose. Todos os indícios mostram que ela conduz a ótimos resultados, inclusive contra a variante ômicron”, afirma.

A médica afirma, ainda, que o imunizante pode ser mantido em geladeira comum, entre 2º C e 8º C, o que dá maior facilidade para o transporte e o armazenamento nas regiões remotas do país.

“De uma forma já conhecida e adotada dentro da nossa estrutura, nós temos como transportar e armazenar essa vacina, sem que ela perca nenhuma das suas características, nem sua potência, que é o grande problema quando não está na temperatura ideal”, diz.

Fonte: Época Negócios

Foto: Shutterstock

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