Produtos de HPC ganham cada vez mais espaço nas farmácias

Produtos de perfumaria, higiene pessoal e cosméticos ganham cada vez mais espaço no tíquete médio das farmácias e tornam-se aliados de peso do varejista na hora de fechar as contas no azul 

Em tempos de preocupação com um possível desaquecimento do mercado brasileiro de farmácias em virtude da crise e do ajuste fiscal do governo, é possível observar, no varejo farmacêutico, o crescimento significativo da importância nas vendas de produtos fora da lista de medicamentos nas drogarias de todo o País. 

Itens de perfumaria, higiene pessoal e cosméticos, dermocosméticos e até produtos de conveniência têm sido importantíssimos para os empresários fecharem as contas ao fim de cada período.

Dados da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) apontam que, a cada novo ano, esses produtos avançam até mesmo nas contas das grandes bandeiras varejistas do setor. Segundo a entidade, em 2014, os chamados não medicamentos geraram, às grandes bandeiras, cerca de R$ 10,7 bilhões em receitas.

O número significou crescimento de 14,69% em relação ao ano de 2013, valor acima dos 11,91% registrados nos medicamentos como um todo e até dos genéricos – que são há vários anos a musa dos olhos do setor –, mas tiveram avanço de apenas 6,38% nas vendas do ano passado.

Nas contas da Abrafarma, hoje, os não medicamentos representam cerca de 30% do faturamento de R$ 32,3 bilhões registrados no ano passado. Essa importância têm se refletido também nos números da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), que, nos últimos cinco anos, praticamente dobrou o faturamento do setor. Em 2008, os números da entidade afirmavam que o segmento teve um faturamento de R$ 24,4 bilhões no País. Cinco anos depois, em 2013, esse valor somou R$ 38,2 bilhões.

“Os itens de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (HPC) têm a vantagem de não terem preços controlados pelo governo, como acontece com os medicamentos. Isso permite aos varejistas maior maleabilidade de precificação e pode gerar uma diferença significativa na hora de fechar as contas. Entretanto, os tempos são outros e não se pode compensar os descontos dados em medicação nos itens de perfumaria. O consumidor sabe o valor das coisas no mercado. O varejista que coloca 50% de lucro em cima de um item vai sofrer com o encalhe e a fama de careiro na vizinhança”, afirma o presidente da Associação dos Farmacêuticos Proprietários de Farmácia do Brasil (AFPFB) e também do Grupo Farma & Farma, Rinaldo Ferreira.

Segundo Ferreira, nas lojas da bandeira Farma & Farma, que hoje tem cerca de 170 lojas na região sul do País, os itens de HPC respondem em média por 25% do faturamento das lojas da rede. “Tudo depende do local, da cidade e do clima do ponto de venda (PDV). Para a média chegar a isso, há lojas em que os não medicamentos chegam a 40% do faturamento, enquanto outras vendem apenas 10%. O importante é observar que a curva vem evoluindo, impulsionada principalmente pela queda de competitividade da linha ética e da disputa feroz do mercado, que tenta segurar a clientela apenas na base dos descontos”, declara.

Portfólio aumentado

No último relatório conjuntural da Abihpec, a entidade que representa a indústria de HPC destaca que os produtos para cabelo, barbear e os itens de higiene oral são os mais vendidos e exportados do Brasil para outras nações, como Argentina, Chile e México – os três maiores destinos.

“Embora a venda de medicamentos não tenha registrado queda nesse período, parece que o mercado caminha para uma evolução natural de diversificação do mix. A competitividade e o controle de preços dos medicamentos pelo governo têm enforcado, sobretudo, os pequenos varejistas do setor. Entre os nossos associados, há um consenso já de investimentos graduais nos itens de perfumaria para tentar voltar a ganhar dinheiro”, afirma o gestor geral do Grupo Farma, rede mineira com mais de 64 lojas espalhadas pelo estado, Cleiton Blandin. 

O varejista conta que, em Minas Gerais, essa migração já vem crescendo consideravelmente desde 2010, quando passou a valer no estado a chamada “Lei das Drugstores”. Sancionada em 27 de dezembro de 2009 pelo então governador Aécio Neves (PSDB), a lei autoriza o funcionamento de serviços de conveniência e prestação de serviços dentro das farmácias. 

Com essa lei, as farmácias podem vender produtos de conveniência, tais como biscoitos, refrigerantes, salgadinhos, doces e balas, além de prestarem serviços de pagamento de contas e banco postal, por exemplo. 

A legislação, claro, ressuscitou o velho debate sobre a vocação das farmácias e drogarias para atendimento à saúde, obrigando até a Abrafarma a encomendar um parecer jurídico do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Velloso, sobre a legalidade ou não da lei mineira sancionada pelo tucano.

No parecer, Velloso compara o modelo norte-americano de farmácias para dar sinal verde ao funcionamento dessas novas drugstores em Minas Gerais. “Não existe impedimento legal ao funcionamento, num mesmo espaço físico, do comércio farmacêutico e das chamadas lojas de conveniência, sujeitando-se cada atividade à regulamentação e fiscalização da respectiva autoridade. Convém ressaltar que essas lojas prestam excelente serviço aos consumidores. Num mesmo local, encontram produtos de que necessitam, com economia de tempo. Em certas horas da noite, por exemplo, somente ali é que poderiam efetivar as suas compras. Nos Estados Unidos, as drugstores constituem a regra”, comenta o ex-presidente do STF.

Embora os conselhos regionais sejam contra a visão e o parecer de Velloso, a chamada “Lei das Drugstores” parece ter caído no gosto dos varejistas da região. “Muitos dos nossos associados estão mudando o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) e a razão social das empresas para poderem se adequar ao modelo estabelecido pela lei. Isso possibilitou maior aumento e oferta de produtos não medicamentosos nas lojas e é o que tem salvado alguns pequenos varejistas de fecharem as portas”, conta Blandin.

Ao contrário do que se imagina, contudo, as farmácias mineiras não estão apostando apenas nos alimentos, segundo conta Blandin. O empresário afirma que o maior investimento dos associados tem sido na expansão e ampliação dos itens de HPC e dermocosméticos. 

“Por mais que alimentos e bebidas elevem o tíquete médio das lojas e tragam clientes para a compra, toda dona de casa ou pai que administra o lar sabe quanto se paga nesses produtos nos supermercados ou padarias do País. Nesse ponto, os itens de perfumaria possibilitam a flutuação das margens de forma muito mais eficaz para o varejista que os demais itens”, revela Blandin.

Vale a pena?

O professor de marketing e gestão de pontos de venda do curso de MBA do Centro de Pesquisa, Desenvolvimento e Educação Continuada (Cpdec) – ligado à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) – e diretor da Federação Brasileira das Redes Associativistas e Independentes de Farmácias (Febrafar), o empresário Rogério Lopes Júnior, concorda com a tese de que é preciso ter cautela e estratégia ao apostar na ampliação dos itens de perfumaria das lojas. 

De acordo com ele, o ganho da venda em escala com a ampliação dos sortimentos oferecidos nas lojas é mais eficaz do que a simples precificação do que está ofertado desde sempre nas lojas. “Todo usuário de tintura de cabelo, fraldas, desodorante ou xampu sabe quanto custa o item que ele compra todos os meses. Ele é fiel à determinada marca e sabe o valor de cada item. A estratégia mais correta é estimular a compra por impulso, oferecendo sempre algo novo, que ele não costuma comprar todos os meses”, avalia. 

Para se chegar a resultados satisfatórios, o professor do Cpdec aconselha ao varejista a trabalhar muita a exposição dos itens, garantindo espaço de escolha, diversidade e destaque para os produtos de alto valor agregado e com preços atrativos. 

“As pesquisas já mostram que os itens de perfumaria diminuem o desconto médio e elevam o tíquete geral das lojas. Não há o que se discutir. Entretanto, com o aumento da diversificação, o ganho é por escala e volume, porque também é preciso manter preços minimamente competitivos. Por isso a importância da exposição bem definida dos itens e um leque amplo de sortimentos”, garante Lopes Júnior, que também é gestor da bandeira Farmafort, que administra 25 lojas na região do Sorocaba (SP). 

Sobre a polêmica de ampliação da venda de não medicamentos nas farmácias com a venda de produtos, como refrigerantes e alimentos, Lopes Júnior diz que se trata de um erro estratégico que nada acrescenta aos plano de negócio do varejista farmacêutico. 

“Dependendo em que local se está, existe uma padaria, um mercadinho, uma quitanda ou um posto de gasolina e bonbonnière onde o consumidor tem formado na cabeça que pode comprar esses produtos. São itens de baixíssimo valor agregado, que descaracterizam o PDV e pouco acrescentam no tíquete médio do comprador. Ampliar o leque para suplementos alimentares ou produtos alimentares da linha diet, light ou natural me parece uma decisão mais inteligente e eficaz para criar valor agregado ao PDV e valorizá-lo no longo e médio prazos”, avalia Lopes Júnior. 

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Autor: 
Rodrigo Rodrigues

Rastreabilidade

Edição 272 - 2015-07-01 Rastreabilidade

Essa matéria faz parte da Edição 272 da Revista Guia da Farmácia.

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