Dores: Presença constante

Incômodo nas costas, cabeça e em outros músculos é crônico em grande parte da população. Conheça as dores mais sentidas pelos brasileiros

As dores estão presentes no cotidiano de quase toda a população ao menos uma vez na vida. A correria do dia a dia, o estresse, os maus costumes – como a falta de atividades físicas, má postura, noites de sono insuficientes, entre outros – são os principais impulsionadores daqueles dias em que sair da cama é quase um martírio.

Grande parte da população (76%) afirma ter tido dor de cabeça pelo menos uma vez nos últimos três meses; 65% dizem ter tido dor nas costas; e 63% relatam ter tido dores musculares em outras partes do corpo, segundo a pesquisa A Dor no Cotidiano, realizada por Advil com o apoio do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) Conecta.

Em um menor período de tempo, as dores lombares são ainda mais frequentes que as dores de cabeça. Dos entrevistados, 65% sentem incômodos nas costas ao menos uma vez por semana. Já as dores musculares gerais são sentidas por 57% das pessoas.

“A dor mais comum no mundo é a nas costas, especialmente lombalgia, e a segunda mais comum é a dor de cabeça. Ninguém sabe exatamente o porquê. Existem algumas teorias que dizem que, com a evolução do macaco, o homem passou a estar em dois apoios, forçando essa região. Outros dizem que a vida do homem moderno, com menor atividade física e sobrepeso são fatores de risco”, revela o médico do Núcleo Avançado de Dor e Distúrbios do Movimento do Hospital Sírio-Libanês, Dr. Daniel Ciampi de Andrade.

Grande parte da população (76%) afirma ter tido dor de cabeça pelo menos uma vez nos últimos três meses; 65% dizem ter tido dor nas costas; e 63% relatam ter tido dores musculares em outras partes do corpo.

As principais causas apontadas na pesquisa para as dores musculares são má postura (58%) e excesso de exercício (56%). Na sequência, os motivos citados são gripes ou resfriados e excesso de trabalho ou estudo, com 48% e 42%, respectivamente. Se divididos por faixa etária, são mais comuns as reclamações de gripes e excesso de exercício entre os mais jovens.

“As dores recorrentes dos exercícios físicos podem ser causadas por seu excesso, mesmo quando a pessoa está condicionada, ou pela prática de movimentos a que o corpo não está acostumado, ainda que sejam atividades cotidianas, como varrer a casa ou subir escadas”, explica o presidente da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED), Irimar de Paula Posso.

Para o médico do Hospital Sírio-Libanês, ter algumas dores é normal, se não sentíssemos dor, poderíamos ter lesões muito graves ou até morrer. Porém, a dor crônica acontece em uma porcentagem muito grande da população. Somente no estado de São Paulo, 28% da população geral apresentou dores nos últimos três meses, de várias intensidades.

As dores podem ser avaliadas de diferentes maneiras. “Por escalas de intensidade de zero a dez, sendo zero sem dor e dez à de maior intensidade. A dor pode ser avaliada por escalas comportamentais e por descritores, de dor leve, moderada, forte e muito forte”, comenta o anestesista do Hospital Israelita Albert Einstein, Dr. George Freire.

CONTRA A DOR

  • Analgésicos: reduzem a condução do impulso ao longo das fibras nervosas e, assim, a sensação da dor.
  • Antitérmicos: diminuem a temperatura corporal ao inibir a ação de enzimas e a síntese eicosanoides.
  • Anti-inflamatórios: amenizam e resolvem o quadro clínico da inflamação, caracterizado pela presença dos sinais cardinais: rubor (vermelhidão), tumor (edema), calor, dor e perda da função.
  • Relaxantes musculares: restringem os espasmos causados pela dor aguda, aliviando-a ao diminuir o tônus muscular, facilitando os movimentos corporais.
  • Aerossóis: as partículas são tão pequenas que ficam suspensas no ar e formam um nevoeiro não “molhante” ao ser pressionado o botão de liberação.
  • Emplastros: fazem com que o princípio ativo lá contido fique em contato por mais tempo na pele. Assim como os aerossóis, possuem fármacos lipofílicos, com capacidade de atravessarem as camadas da pele e agirem localmente em determinada região do músculo.

Fonte: doutora em farmacologia de produtos naturais pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e professora pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Dra. Camila de Albuquerque Montenegro

O problema começa a piorar quando o paciente deixa de ter perda de função, deixando de ir ao trabalho ou fazer coisas de seu lazer. O estudo revelou que deixar de trabalhar é a primeira perda para 56%, ainda que os compromissos com família e amigos ou lazer não sejam tão impactados pela dor.

Além de todos os fatores externos, como sono, estresse e alimentação, há ainda pessoas que são mais predispostas a sentir dor. “Depende do tipo de dor. Existem, por exemplo, mais casos de lombalgias em profissões como motoristas; dores articulares em idosos; e fibromialgia em mulheres de meia idade”, exemplifica o Dr. Freire.

Novo conceito

O “conceito de dor mista” foi sugerido pela primeira vez há mais de dez anos, se referindo à dor na lombar, onde a dor era causada por uma combinação entre os mecanismos patofisiológicos nociceptivos e neuropáticos. Enquanto isso, o número de estudos comprovando a presença da dor mista em outras condições de dor está aumentando significativamente. Além da dor lombar, várias outras condições foram classificadas como dor mista, incluindo a dor cervicobraquial, síndrome da cirurgia lombar falhada, dor associada à espondilite anquilosante, osteoartrite, dor após cirurgia ou trauma e, principalmente, dor oncológica.

No entanto, o conceito de dor mista ainda não é muito conhecido. Conscientizar sobre a dor mista, seu diagnóstico e tratamento traria enormes benefícios ao paciente, especialmente nos postos de pronto atendimento, locais onde se lida muito com dor crônica.

Para isso, a Merck realizou um estudo para medir o valor do conceito de dor mista, avaliando sua aceitação e interpretação por profissionais de saúde. Trata-se de um estudo transversal realizado com pacientes adultos buscando assistência médica para dor em 551 locais (pronto atendimentos e centros de ortopedia) na Espanha. Os pesquisadores categorizaram cada paciente em algum dos três tipos de dor: nociceptiva, neuropática ou mista, de acordo com certos critérios. Dados referentes à intensidade da dor, frequência, qualidade de vida, etc., foram coletados.

No total, 5.024 pacientes foram analisados: 2.798 em postos de pronto atendimento e 2.661 em centros de ortopedia. Dor mista foi o tipo de dor registrado mais frequentemente no estudo (59,3%), seguido pela dor nociceptiva (31,8%) e neuropática (8,9%). As proporções de pacientes cuja dor foi considerada mista ou neuropática foram maiores nos postos de pronto atendimento do que nos centros ortopédicos (61,2% vs. 57,3% e 10,5% vs. 7,2%, respectivamente), enquanto a dor nociceptiva foi mais frequente nos centros de ortopedia (35,5% vs. 28,3%).

O tempo entre o início da dor e o diagnóstico de sua causa foi significantemente menor em pacientes com dor mista, como consequência, a dor crônica era mais comum entre esses pacientes. Níveis máximos e médios na escala de dor foram consideravelmente menores em pacientes com dor nociceptiva do que naqueles com dor mista ou neuropática. Pacientes com dor mista foram mais afetados nos aspectos psicossociais de suas vidas, tinham mais limitações funcionais, mais comorbidades, como depressão, distúrbios de sono e reportaram uma menor qualidade de vida.

Apenas um terço dos pacientes estava recebendo tratamento adequado à sua dor antes da visita do estudo, enquanto mais da metade dos pacientes foi subtratada. A proporção de pacientes subtratados e sobretratados foi significantemente maior no grupo que apresentava dor mista, enquanto a proporção de pacientes que não receberam nenhum tipo de tratamento para sua dor foi maior nos grupos com dor neuropática (15,5%) e nociceptiva (10,9%).

Confira, abaixo, os dados de prevalência de dor mista nas principais condições identificadas no estudo:

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Adaptado de: Ibor Vidal PJ, et al. J Drug Assess. SEMERGEN. 2015; 41 (Espec Congr): Resumo publicado do cartaz congresso.

Os pesquisadores do estudo perceberam dificuldades no manejo dos pacientes (comunicação, exame, diagnóstico, intervenção, etc.) em 59,5% dos pacientes.

As condições que causam a dor mista são variadas. A maior prevalência de dor mista foi quando se tratava do conglomerado de condições na espinha dorsal, seguido pela osteoartrite.

Os resultados do estudo mostram um pior estado de saúde e uma maior complexidade clínica nos pacientes que sofrem de dor mista, comparado aos pacientes com outros tipos de dor, com mais comorbidades e adversidades psicossociais, maior utilização de recursos de saúde, menor percepção de eficácia dos tratamentos e menor qualidade de vida. Esses pacientes costumam ser subtratados ou sobretratados e de difícil manejo por parte dos profissionais de saúde.

Uma categoria independente na classificação patofisiológica da dor é justificada com base nas características diferenciadoras de pacientes com dor mista, apesar da conceitualização da dor mista precisar ser melhorada. Pacientes com dor mista precisam receber uma consideração especial.

O tratamento

Cuidar das dores vai muito além de somente tomar medicamentos. Segundo o médico do Hospital Sírio-Libanês, as dores lombares necessitam de reabilitação, melhorando a postura e os hábitos diários. O mesmo pode acontecer com as dores que surgem por fatores que possam ser mudados, como o estresse e sono.

Os relaxantes musculares, por exemplo, podem ser usados em situações de tensão, dor e nas contraturas musculares, torcicolos ou lombalgias. “Sobretudo, a sua utilização deve ser associada à prática de exercício físico regular e alongamentos diários que ajudam a estender os músculos do corpo”, comenta a doutora em farmacologia de produtos naturais pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e professora pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Dra. Camila de Albuquerque Montenegro.

Já os medicamentos anti-inflamatórios não esteroidais apresentam as propriedades analgésica, antitérmica e anti-inflamatória. O que difere entre esses fármacos é o potencial dessas propriedades, quando alguns terão maior poder analgésico ou anti-inflamatório que antitérmico e vice-versa.

Entre os medicamentos mais usados, o Dr. Andrade frisa que parte dos anti-inflamatórios (como ibuprofeno e aspirina) podem causar problemas graves em alguns pacientes. Já o paracetamol pode ser usado, mas não com consumo excessivo. O fármaco com menos riscos é a dipirona.

Foto: Shutterstock

Passagem obrigatória

Edição 299 - 2017-10-23 Passagem obrigatória

Essa matéria faz parte da Edição 299 da Revista Guia da Farmácia.